Mario Vargas Llosa explica, em seu livro O Chamado da Tribo, sua jornada política graças à leitura de sete mestres, dentre eles Karl Popper, Friedrich von Hayek, Isaiah Berlin e Ortega y Gasset:
Mario Vargas Llosa
(Arequipa, Peru, 1936) talvez seja o escritor mais vilipendiado entre
os autores vivos da língua espanhola. Por ter feito uma viagem do marxismo ao liberalismo
que detalha em seu novo ensaio, La Llamada de la Tribu (O chamado da
tribo, em tradução livre), cuja publicação está prevista para 1 de
março.
Ao
longo de sua vida lhe disseram de tudo, também quando era um rapaz que
queria chegar a Paris para se tornar escritor. E quando já era um tanto
mais popular o insultaram também, porque não era mais o sartrezinho
corajoso” (como o chamaram seus contemporâneos, pela paixão que
demonstrava por Jean Paul Sartre), mas um agente anticubano.
Nessas épocas mais juvenis levava muito a sério os insultos e as zombarias. Em um dia de 1990, depois de ser derrotado por Fujimori em sua tentativa de ser presidente (liberal) do Peru, contou a um jornalista da Paris Review algo que lhe havia acontecido com Pablo Neruda quando festejavam em Londres o aniversário do gigante chileno.
Estavam
no convés de um barco, e Vargas Llosa havia tido um desgosto: “um
artigo havia me deixado alterado e irritado porque nele eu era insultado
e diziam mentiras sobre mim”. Neruda profetizou: “Você está se tornando
famoso. Quero que saiba o que te espera: quanto mais famoso você for,
mais será atacado. Para cada elogio você receberá dois ou três insultos.
Eu tenho um caixote cheio de todos os insultos, vilezas e maldades que
um homem é capaz de suportar. Não me pouparam nenhum: ladrão,
pervertido, traidor, delinquente, chifrudo... Tudo! Se você se torna
famoso, tem de passar por isso”.
Passaram-se décadas. Vargas Llosa passou do comunismo e do marxismo ao liberalismo, e no final dessa transição, desde meados dos anos 70 do século passado, quando em Cuba se deu o caso Padilla e o escritor peruano rompeu com a revolução, abandonou as posições tradicionais na esquerda e se voltou mais para Albert Camus do que Sartre, cumpriu-se a profecia de Pablo Neruda. Não o chamaram de pervertido. Chamaram-no de liberal.
La
Llamada de la Tribu é uma resposta ao epíteto e, sobretudo, é uma
espécie de ceia com sete dos mestres que o converteram à fé liberal da
qual agora se sente tão orgulhoso como de ter abraçado a fé em Faulkner, Borges e Flaubert.
Vargas Llosa explica, como um recém-saído de jornadas intensivas com
tais mestres liberais (sua tribo), o que fizeram pela salvação de sua
alma Adam Smith, José Ortega y Gasset, Friedrich August von Hayek, sir Karl Popper, Raymond Aron, sir Isaiah Berlin e Jean François Revel.
Desses
liberais que se sentam a sua mesa, deve mais a três deles,
“politicamente falando”: Popper, Berlin e Hayek. Com todos estabelece no
livro um debate afetivo. Smith, pai da economia moderna, ele situa nos
prados escoceses, falando sozinho; de Ortega não poupa nenhum traço de
seu caráter; Hayek ele encontra quando já transita no campo liberal, mas
o mestre o surpreende falando-lhe, de brincadeira, de Bakunin...
“Não
parece”, diz no começo do volume, “mas é um livro autobiográfico”.
Porque não está escrito em virtude das ideias ou teorias de seus sete
comensais, mas os incorpora e os situa como parte agora imprescindível
de sua própria vida pessoal e política.
Como
se falasse de amigos com os quais brigou no passado, ele tampouco
economiza reprimendas. Por exemplo, a Hayek, por ter caído nas redes da
propaganda pinochetista,
ou a outros liberais por terem deixado que a palavra liberalismo
ficasse em mãos estritamente economicistas. Para citar o mais próximo,
de Ortega y Gasset revela grandezas e dúvidas, mas lembra aos espanhóis
que se ele tivesse sido inglês ou francês ou alemão hoje aqui lhe
estenderiam tapetes para a passagem de sua memória e de seus
ensinamentos.
Estufar o peito
Não
é, por assim dizer, um jantar tranquilo com nenhum deles. Discute com
todos. Ninguém mais pode insultá-lo como liberal. Pois é isso o que ele
é. Aqui o vilipendiado liberal estufa o peito: “Liberal? E daí?”, parece
dizer.
Em Peixe na Água
(1993), sobre sua fracassada experiência política para disputar a
Presidência do Peru, conta uma história que ocorreu durante a campanha. O
Serviço de Inteligência dos Estados Unidos divulgou que sua candidatura
inquietava o país. Parecia mentira, mas o embaixador norte-americano
lhe disse que essa informação de fato saíra da CIA. “Comentei”, diz
Vargas em Peixe na Água, “que o bom disso era que os comunistas já não
poderiam acusar-me de se um agente da célebre organização”.
Agora
os que o insultam por ser liberal têm 311 páginas de explicação do
próprio Vargas Llosa sobre as razões que o levaram ao liberalismo. (Juan
Cruz, El País).
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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