Os desafios para o Brasil serão enormes, não apenas pela mudança política adotada pelos americanos, mas pelos próprios erros de cálculo político do Palácio do Planalto. Marcio Coimbra para a Gazeta do Povo:
No
início de seu mandato, Bolsonaro anunciou que o Brasil passaria a ter
uma relação mais próxima com os Estados Unidos, retomando uma relação
tradicional de parceria. Apesar das críticas, o presidente brasileiro
seguiu firme em seu propósito, até esbarrar na derrota de Donald Trump
nas eleições presidenciais de 2020. Joe Biden, adversário do
republicano, havia sido eleito.
Perdido
diante do cenário político, Bolsonaro optou por não reconhecer a
vitória do democrata de pronto, esperando cerca de um mês até
cumprimentar o vencedor do pleito. Mais do que isso, Bolsonaro
corroborou a fantasiosa tese de Trump, vencida nos tribunais, de que as
eleições americanas haviam sido fraudadas. Movimentos que certamente
colocaram uma frutífera parceria em xeque.
O
presidente brasileiro mostrou que, na verdade, sua aliança estava muito
mais próxima da afinidade ideológica com Trump que com a nação
americana. Isto foi sentido em Washington, onde existe o receio de que o
Brasil se afaste dos Estados Unidos e procure países mais afinados com
os valores trumpistas. Da mesma forma, este governo que chega não
enxerga Bolsonaro com simpatia.
Americanos
são acima de tudo pragmáticos; entretanto, depois de perder sucessivas
oportunidades de posicionar-se ao lado dos Estados Unidos como nação, em
vez de Trump como líder populista, o Brasil agora precisa recompor sua
imagem. Fato é que Bolsonaro já declinou inúmeras ofertas de contatos
reservados abertos por interlocutores de Biden. Uma janela de
oportunidades que se fecha com a sua posse.
Diante
disso, Washington tende a trabalhar com seus aliados naturais na
região, países que ao longo de décadas mantiveram diálogo profícuo com
os Estados Unidos, independentemente de qualquer partido que ocupasse a
Casa Branca. A Colômbia sempre soube realizar este diálogo com
inteligência, assim como o Chile, acompanhado neste momento pelo
Uruguai. Na América do Sul, estes saem na frente como aliados
preferenciais.
Os
reflexos da política de Biden para a região também entram em conflito
direto com a agenda de Bolsonaro, uma vez que a questão ambiental entra
na pauta americana de forma determinante. Certamente, para avançar nesta
frente, Washington pedirá demonstrações claras de cooperação de
Brasília, um movimento que colide com a posição de confronto com as
políticas de preservação ambiental adotadas pelo governo brasileiro.
Biden
retornará com força para a política internacional multilateral,
reintroduzindo os americanos em uma agenda global de concertação.
Podemos esperar o retorno ao Acordo de Paris e maior participação em
organismos desprezados por Trump, como Unesco e OMS. Uma agenda que
também colide com a posição adotada por Bolsonaro, que inseriu a luta
contra o globalismo destas instituições como seu foco de enfrentamento.
Ao
fim e ao cabo, os desafios para o Brasil serão enormes, não apenas pela
mudança política adotada pelos americanos, mas pelos próprios erros de
cálculo político do Palácio do Planalto. Uma conta que pode sair muito
cara para os brasileiros.
Márcio
Coimbra, cientista político e mestre em Ação Política pela Universidad
Rey Juan Carlos, é coordenador da pós-graduação em Relações
Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie
Brasília, ex-diretor da Apex-Brasil e diretor-executivo do Interlegis no
Senado Federal.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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