Com cooperação, combate à burocracia e revisão de leis antiquadas e ineficientes, o único prefeito eleito do Partido Novo pretende conduzir uma grande transformação na maior cidade de Santa Catarina. Oeste entrevista o prefeito Adriano Bornschein Silva:
Uma
campanha feita 100% por voluntários que, sem receber nada por isso, vão
para as ruas divulgar o projeto do candidato. Filiados comprometidos
com os ideais da legenda que, por livre e espontânea vontade, colaboram
financeiramente todos os meses com o partido. Uma gestão em que a
totalidade dos cargos comissionados é preenchida por meio de processo
seletivo, sem levar em conta padrinhos políticos, coligações ou qualquer
forma de toma lá dá cá. Entre as propostas, mutirões para vencer a
burocracia, doações em caso de calamidade pública e conversas, muitas
horas de conversa para tentar, coletivamente, descobrir o melhor caminho
para solucionar os problemas da cidade.
Parece
teoria de algum partido de esquerda? Pois é assim que Adriano Silva, o
único prefeito eleito pelo Novo nas eleições deste ano, descreve sua
campanha e seu governo de transição para assumir a prefeitura de
Joinville, a maior cidade de Santa Catarina, com quase 500 mil
habitantes. Nenhuma outra legenda brasileira tem entre suas principais
bandeiras a defesa do liberalismo econômico, da meritocracia e a
desestatização completa, além de outros conceitos considerados opostos
aos defendidos por siglas como PT, PCdoB e Psol.
Aos
42 anos, Silva é empresário, vice-diretor da Associação Comercial e
Industrial de Joinville, bombeiro voluntário e — mesmo sem nunca ter
disputado uma eleição antes — político. É com essa última palavra que
ele se identifica em entrevistas e conversas com jornalistas — o oposto
do que passaram a fazer centenas de políticos profissionais, depois de
descobrirem que essa negação poderia render votos. “Considero a política
uma das coisas mais bonitas e genuínas do ser humano”, explicou Silva.
“O que me deixa enojado é a politicagem. Fico espantado com quem utiliza
a política em benefício próprio.”
Confira os principais trechos da entrevista.
Esta foi a primeira vez que o senhor disputou uma eleição. Nunca havia concorrido a nenhum cargo?
Na
verdade, já havia concorrido para síndico. Mas foi uma eleição mais
fácil, porque eu era o único candidato. Acabei assumindo por falta de
quórum. Esta foi a primeira vez que disputei um processo político.
Comecei a trabalhar cedo, com 19 anos, na empresa da minha família.
Temos uma indústria farmacêutica, o Laboratório Catarinense. Como sou
formado em administração pelo Mackenzie, entrei como assistente de
marketing. Com o tempo, fui galgando postos: primeiro de coordenador de
produtos, depois assumi duas gerências, em seguida, duas diretorias, a
vice-presidência e a presidência, em 2003.
Além de ser bombeiro voluntário.
Sim.
Sempre comento isso, porque aqui em Joinville é diferente de outras
cidades. O Corpo de Bombeiros não é militar, é formado por voluntários.
Há 17 anos, eu me encantei com a corporação, fiz o curso e me formei
bombeiro socorrista. Trabalho nas ambulâncias e faço plantão às
quintas-feiras. Isso me fez ver uma realidade completamente diferente da
minha. Passei a frequentar a casa das pessoas em todos os bairros, vi
como era a emergência em hospitais públicos, no SUS, nos
prontos-socorros. Isso gerou em mim uma revolta muito grande com a
política brasileira. Num primeiro momento, fiz o que a grande maioria
dos bons brasileiros faz: virei as costas para a política.
Quando isso mudou?
Em
2017, senti na pele que é possível ignorar a política, mas não suas
consequências. Em 2015, a empresa sofreu muito com a crise econômica
provocada pelo governo Dilma. Dois anos depois, quando começávamos a nos
reerguer, o presidente Michel Temer foi flagrado naquela gravação com o
Joesley Batista. A crise política gerada por aquele fato jogou o Brasil
novamente numa crise econômica. Foi a gota d’água. Eu disse: “Chega!
Nós estamos sendo vítimas o tempo todo dessa política. O Brasil tem tudo
para dar certo, mas, se outras pessoas não se envolverem, ficarão
sempre os mesmos”. Comecei a dar mais atenção ao tema quando um amigo me
convidou para assistir a uma palestra do Novo. Estudei o partido por
três meses antes de me filiar e achei que isso fosse suficiente. Como o
filiado paga por mês, imaginei que seria uma forma indireta de
participar.
Como essa participação indireta culminou na disputa pela prefeitura?
Um
ano depois da filiação, em 2019, recebi com surpresa o convite do
diretório para ser pré-candidato. Num primeiro momento, não aceitei. Não
me achava preparado nem queria ser exposto publicamente. Mas, numa
conversa com minha mulher, chegamos à conclusão de que era uma boa hora
de contribuir para a sociedade. Em seguida, passei nas provas seletivas
do partido, que precisam ser feitas mesmo por aqueles que são convidados
pelo diretório municipal. Depois disso, já comecei a me dedicar à
campanha.
Isso foi em 2019?
Sim,
muito mais cedo que todos os outros candidatos. Naquela época, juntamos
um time de voluntários com mais de 70 pessoas para fazer o plano de
governo. Esse espírito de voluntariado fez grande diferença. Nos fins de
semana que antecederam a eleição, eram mais de 200 voluntários fazendo
bandeiraços e panfletagens, vestindo camisetas do partido, compradas na
loja do Novo, sem ganhar R$ 1.
Muitos
políticos profissionais procuram fugir dessa categorização. Por que o
senhor, que nunca havia disputado cargo público, parece fazer questão de
se apresentar como político?
Considero
a política uma das coisas mais bonitas e genuínas do ser humano. Nós
somos seres políticos. Esse senso de buscar o bem comum me satisfaz.
Escutar, ser o maestro, o equilibrista dos pratos, é fantástico. O que
me deixa enojado é a politicagem, o carreirismo político. Fico espantado
com aqueles que utilizam a política em benefício próprio.
Quais são suas prioridades na área da saúde, particularmente em relação à pandemia do novo coronavírus?
No
começo da pandemia eu era vice-presidente da Associação Comercial e
Industrial da cidade justamente na pasta da saúde. Para gerenciar o
Comitê de Gestão de Crise Sanitária, abandonei a campanha por 60 dias.
Pelo Corpo de Bombeiros, coordeno há doze anos a central solidária, que
arrecada e distribui mantimentos toda vez que Joinville entra em estado
de calamidade pública, o que não é raro, porque sofremos com enchentes.
Sou o braço direito da Defesa Civil na cidade. Na pandemia, minha
preocupação foi aumentar a capacidade hospitalar. Com um mutirão,
transformamos duas salas do hospital municipal em 83 novos leitos.
Também consegui dinheiro de empresários para comprar 17 respiradores e
150 mil máscaras. Outra preocupação foi com os empregos. No momento em
que se faz um lockdown, é gerado um grave problema social. Sentimos isso
quando o governo do Estado determinou o isolamento. Em maio, vários
famílias ficaram desempregadas e montamos uma central solidária para
arrecadar cestas básicas. Essa experiência provou que é preciso tomar
cuidado com a economia em paralelo.
O senhor concorda com a manutenção das escolas fechadas?
Deveríamos
ter reaberto as escolas faz tempo. Outros países já mostraram que é
possível e seguro. Temo pela educação dos jovens das escolas públicas,
porque esse modelo de aulas a distância é meramente para manter um
vínculo com a escola, mas com baixíssimo grau de aprendizagem.
Qual governador ou prefeito agiu de maneira correta com relação à pandemia de coronavírus?
Independentemente
de ser ou não do Novo, gostei do modelo adotado em Minas Gerais pelo
Romeu Zema, porque ele deixou para os prefeitos a decisão nos
municípios. Uma vez que o governo do Estado age de cima para baixo,
algumas ações podem ser precipitadas. Aqui em Joinville, o transporte
público e vários outros setores pararam de funcionar em março, quando
havia apenas um caso de covid na cidade.
O senhor pretende preencher os cargos comissionados por meio de processo seletivo. Isso já foi feito?
As
inscrições já terminaram e, supreendentemente, tivemos mais de 8.500
candidatos. Nessa primeira etapa, será feita a avaliação dos currículos
para ver se a formação e a experiência batem com a carreira desejada.
Não basta só querer, é preciso ter capacidade. Em seguida, os
selecionados responderão a um formulário para mostrar sua visão daquela
pasta e veremos se ela corresponde ao nosso plano de governo. Nessa
segunda etapa, existe uma pontuação e os três ou quatro que tiverem as
melhores notas seguem para a terceira e última fase, em que é aplicada
uma prova de recursos humanos. Depois, eu e a vice-prefeita
entrevistamos os candidatos.
Outra de suas bandeiras foi diminuir a burocracia. O que será feito na prática?
Em
Jaraguá do Sul, uma cidade vizinha, eles conseguiram combater isso com
um mutirão. É o que vamos fazer. O código de obras da cidade é de 1964; o
código fiscal, de 1973; o da vigilância sanitária, de 1995. Com essas
informações, já é possível entender o arcabouço do problema. O servidor
trabalha em meio a uma insegurança jurídica enorme. Ele precisa seguir o
que está escrito, mas o que está escrito não faz mais sentido e, por
lei, não é permitido usar o bom senso. Muitas vezes os processos são
morosos justamente por isso. Colocaremos técnicos dentro da Secretaria
do Meio Ambiente para diminuir a fila que lá existe. Em paralelo,
organizaremos esse mutirão para refazer códigos e leis. Pretendo
conduzi-lo em parceria com a Câmara de Vereadores, o Ministério Público,
outras secretarias e agências, como a de vigilância sanitária. É um
trabalho árduo, que terá efeito prático depois de seis meses.
A vice-prefeita eleita, Rejane Gambin, também é do Novo. Uma chapa puro-sangue foi exigência do partido?
O
estatuto do Novo permite coligações. Porém, não permite coligações com
partidos que usem dinheiro do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário. Ou
seja, ninguém.
O senhor foi o único prefeito eleito do partido. O que achou do desempenho do Novo nas eleições?
Achei
bom. Dos quase 5.600 municípios, disputamos apenas em 30. Umas das
regras do partido é que, para concorrer, ele precisa ter o diretório
consolidado na cidade. Ao comparar 2016 com 2020, tivemos um crescimento
de mais de 50% em todos os municípios em que disputamos, com exceção do
Rio de Janeiro, onde a votação foi semelhante. Atribuo a conquista de
apenas uma prefeitura ao mecanismo político que existe hoje no Brasil.
Ele dificulta muito a eleição de um candidato outsider, de um partido
completamente novo.
Uma das bandeiras do Novo é o liberalismo econômico. O brasileiro está mais receptivo a essas ideias?
Não.
No Brasil, existe a cultura de o Estado prover as coisas. Contudo, aqui
na região, essas ideias são bem-vistas. Joinville é uma cidade que
sempre promoveu o empreendedorismo e a autossuficiência. Um exemplo
emblemático é o próprio Corpo de Bombeiros. Algumas cidades dependem
basicamente da prefeitura. Aqui não temos isso.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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