Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais desta quarta-feira:
O coronavírus, por enquanto, está ganhando a guerra. Já que é guerra,
o Governo, oras, pôs na Saúde um general. O general se cercou de nove
outros militares. Há as investigações sobre denúncias do ex-ministro
Sergio Moro, há investigações sobre a organização de atos contrários à
Constituição, em que se prega o fechamento do Congresso e do Supremo, há
30 pedidos de impeachment na Câmara. As denúncias do antigo aliado
Paulo Marinho, que se afastou de Bolsonaro, têm pontos que podem ser
verificados. O cerco ao presidente se apertou tanto que, para manter a
estabilidade, mergulhou de cabeça no que chama de Velha Política: trocar
cargos por votos do Centrão.
Contra Bolsonaro propriamente dito, há as denúncias de Moro e os 30
pedidos de impeachment. Paulo Marinho atinge Flávio, o filho mais velho.
As investigações sobre os atos antidemocráticos podem alcançar Eduardo e
Carlos, outros dois filhos. Há ainda as notícias falsas, investigadas
pelo STF.
O vídeo de uma reunião ministerial grosseira, com insultos a
ministros do Supremo e a governadores, confirmou as denúncias de Moro e
desmentiu Bolsonaro: sim, ele disse o que tinha dito que não disse. A
maior denúncia de Paulo Marinho, de que Flávio Bolsonaro lhe contou que
haveria operação da PF envolvendo pessoas próximas, cita reunião num
lugar em que havia câmeras de segurança. É algo que pode ser investigado
– e está sendo.
Não se trata de uma gripezinha: é algo que arrisca a sobrevivência do Governo.
O vírus chapa-branca
Todos esses problemas estariam parados se Bolsonaro se ocupasse com o
combate ao coronavírus. Ao contrário: pôs na cabeça que fora da
cloroquina não há salvação e se comporta não como líder dos esforços
para conter a doença, mas como desmoralizador dos planos que vêm sendo
aplicados. Vai às ruas, faz comícios com gente aglomerada, leva sua
própria filha pequena para perto da aglomeração, já cansou de negar a
importância do coronavírus e, confrontado com o número de mortos, diz
que não é coveiro.
Deu um tiro em cada pé em quatro ocasiões: negando a pandemia,
impondo um remédio que pode até, eventualmente, ser o correto, mas que
ele não tem condições de julgar, demitindo ministros e brigando com
governadores e prefeitos. O peso político do presidente é muito menor do
que já foi, embora grande o suficiente para evitar o impeachment. Mas
já não tem excesso para queimar.
Preocupação dos traficantes
Os traficantes da Comunidade Camarista Outeiro, no Rio, determinaram
que a partir de hoje o comércio só poderá abrir meia porta: “entrar,
comprar e ir embora para casa”, com exceção de mercadinho, farmácia e
hortifruti. “Todos moradores da comunidade terão de usar suas máscaras.
Toque de recolher às 21h, todos em suas casas, exceto moradores que
estão chegando ou saindo para o trabalho”. Mais: “Abraça o papo para o
papo não te abraçar. A ronda vai passar e é sem simpatia”. Assinado, A
Firma.
Traduzindo, os traficantes estão mais preocupados com a saúde de seu povo do que os milicianos.
Boas notícias
São boas notícias, simultâneas: o laboratório americano Moderna já
entrou na segunda fase de testes de um remédio que pode curar,
destruindo o vírus, e prevenir, criando em quem o toma os anticorpos
adequados. Outro teste é o brasileiro: segundo Marcos “Astronauta”
Pontes, ministro da Ciência e Tecnologia, a nitazoxanida, Anitta, um
vermífugo muito usado no país, mostrou-se eficiente no tubo de ensaio, e
entra em nova fase de testes, em seres humanos. Israel anuncia também
uma vacina, para entrar logo em fase de fabricação. E faz poucos meses
que o genoma do vírus foi decupado!
Mas calma: se tudo correr bem, haverá remédios só no último trimestre.
Más notícias
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, bem que resistiu: em vez
de gente do Centrão, preferia nomear mais discípulos do escritor Olavo
de Carvalho. Mas teve de ceder – e ainda informar à chefe do Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação, Karine Silva dos Santos, que
seria trocada por Gharigam Pinto, indicação de Valdemar “Boy” da Costa
Neto. Boy sabe: o FNDE dispõe de 20% das verbas do Ministério da
Educação e de inúmeros cargos. Outros nomes já escolhidos: Carlos Marum,
PMDB, e José Carlos Aleluia, DEM, ilustres membros do Centrão, estão no
Conselho de Itaipu – seis reuniões por ano, e R$ 27 mil mensais de
salários.
Verdade é mentira
O presidente Bolsonaro acusou a revista Crusoé de publicar três
frases completamente soltas, “nada têm a ver com a verdade, nada”.
Seguiu: “É uma vergonha o que a imprensa brasileira faz”. A Crusoé
divulgou três frases na capa. As três foram ditas na reunião ministerial
cujo vídeo foi exibido por ordem do ministro Celso de Mello. As três
foram retiradas da transcrição divulgada pela AGU, Advocacia Geral da
União.
Mais oficial, impossível.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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