Dado o momento conturbado em que vivemos, algumas notícias simplesmente têm passado despercebidas.
Algumas são irrelevantes, mas outras são importantes e deveriam nos preocupar.
Por exemplo, na madrugada do dia 14 de maio (2020) o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, unanimemente em sessão virtual, que são inconstitucionais “ações contra a livre manifestação de ideias nas universidades”.
Em seu site de notícias lemos: “Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão virtual, julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 548, para declarar nulas decisões da Justiça Eleitoral em cinco estados que impuseram a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos em ambiente virtual ou físico de universidades às vésperas do segundo turno da eleição de 2018.
As decisões envolviam busca e apreensão de materiais de campanha eleitoral em universidades e associações de docentes e proibição de aulas com temática eleitoral e de reuniões e assembleias de natureza política”.
Com efeito, para compreendermos tal decisão precisamos contextualiza-la. Assim, voltemos a 2018 e vejamos, então, o que motivou a ADPF 548.
À época estávamos em período eleitoral, sendo que a eleição para a presidência da república transcorria de forma acirrada.
Nesse contexto, e diante do fato de as universidades terem se tornado mecanismos de promoção do candidato à presidência Fernando Haddad (PT), surgiram diversas “decisões de juízes eleitorais que determinaram a busca e a apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas dependências das sedes de associações de docentes”; não apenas isso, tais decisões “proibiram aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política, impondo a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018 em universidades federais e estaduais. As medidas teriam como embasamento jurídico a legislação eleitoral, no ponto em que veda a veiculação de propaganda de qualquer natureza em prédios e outros bens públicos (artigo 37 da Lei 9.504/1997)”.
Diante dessas decisões a então procuradora-geral da república ajuizou a ADPF 548, na qual ela se manifestava contrária às decisões dos juízes eleitorais. Ou seja, verdade seja dita, ela defendia que as atividades político partidárias (especialmente pró-PT e Psol) não fossem impedidas nas universidades públicas, de tal forma que as mesmas pudessem seguir, factualmente, como “palanques” para propaganda política em favor do candidato do PT e contra a candidatura do hoje presidente Jair Bolsonaro.
Sim, na prática isso era o que estávamos testemunhando. Afinal, o que realmente víamos em nossos campi eram faixas em defesa do candidato do PT e diversas pichações denegrindo a imagem do seu principal adversário.
Foi diante desses fatos, amplamente divulgados na época, que veio a acertada decisão dos juízes eleitorais.
Assim, observem: em momento algum eles (juízes eleitorais) proibiram o “debate político” (tampouco a “multiplicidade de pensamento e de ideias”). Eles determinaram 1. “a busca e a apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral”, proibiram 2. “aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política”, bem como demandaram 3. “a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018”.
Agora, pergunto: estavam eles realmente determinando o fim do “debate político”? Claramente, o que os juízes eleitorais estavam protegendo era a probidade do processo eleitoral, bem como assegurando que as universidades não seriam vilipendiadas, reduzidas a mero instrumento de proselitismo político abjeto, o que, infelizmente, era e permanece sendo nossa realidade.
Em suma, as decisões dos juízes eleitorais apenas pretendiam assegurar, concretamente, os artigos 24 e 37 da lei eleitoral 9504 (de 1997).
Dito de outra forma, eles estavam justamente endossando o verdadeiro “debate político”, algo raro na universidade desde que ela se tornou instrumento da esquerda.
Para que se tenha uma ideia da gravidade da situação, citarei apenas um exemplo oriundo do mesmo contexto em que tal decisão foi tomada. Com efeito, no meio da disputa pela presidência da república nosso sindicato (Adufpel) convocou toda a comunidade acadêmica para um ato contra o então candidato à presidência, Jair Messias Bolsonaro.
A chamada dizia: “movimentos sociais, entidades e coletivos unem-se contra Bolsonaro no próximo sábado”.
Tal ato ocorreu no dia 29 de setembro de 2018 e estava alinhado com uma orientação do ANDES (sindicato nacional dos docentes das instituições de ensino superior), o qual indicou o seguinte: “que as seções sindicais e secretarias regionais construam e participem dos atos”.
Além disso, líamos no texto que “a mobilização tem como objetivo mostrar a força e a união contra o discurso de ódio, a misoginia, o fascismo, o racismo e a homofobia, promovidos pelo candidato, e dizer não à política que ameaça o estado democrático de direito”.
Atentem para a gravidade da nota, repleta de acusações gravíssimas (e ela vem de um sindicato de professores de ensino supostamente “superior”).
Embora não tenha sido um evento isolado, ele serve de paradigma para que reconheçamos o que estava ocorrendo em nossas universidades durante a corrida eleitoral de 2018, algo, a propósito, desgraçadamente rotineiro em nossas cada vez mais aviltadas universidades.
Tais associações não estavam exigindo “debate político”. Elas estavam a serviço de uma agenda partidária em particular. Simples assim.
E isso não parou após o término da corrida eleitoral. De nossas universidades (de gestores, sindicatos, professres, estudantes, etc) adveio, desde a posse de Bolsonaro, um discurso que se coloca como “resistência” em exortação à “luta” (contra a atual administração e tudo aquilo que ela representa – seu suposto conservadorismo e liberalismo).
Aliás, alguns meses após sua vitória, Bolsonaro veio à região sul para inaugurar uma obra de duplicação da BR 116 (agosto/2019). Nessa ocasião, em um grupo no Facebook chamado “UFPEL” (do qual são excluídos aqueles que mostram qualquer indício de serem ou “liberais” ou “conservadores” – vejam como eles prezam o “debate político” e a “livre manifestação do pensamento e das ideias”), no qual encontramos, além de estudantes, diversos gestores, professores, servidores, etc, houve uma acalorada discussão sobre como atentar contra a vida do presidente, o que levou a uma denúncia junto ao MP, motivada pela preocupação de parte da comunidade acadêmica, bem como de cidadãos da sociedade civil, seja com a segurança do presidente seja com a democracia e com a segurança pública.
Embora tal grupo leve o nome da universidade, não houve qualquer nota de rejeição da instituição quanto ao ocorrido.
Aliás, já presenciamos, aqui dentro da UFPEL, situações hediondas e, mesmo, criminosas (promovidas por “coletivos” de esquerda), sendo que perante essas situações as recentes gestões simplesmente não emitiram qualquer nota de repúdio. Tampouco acionaram a força policial para pôr fim aos acontecimentos que nada tinham de democráticos. Pior: quando a polícia intervém para interromper ilicitudes, a gestão divulga notas de repúdio às ações da força policial, assumindo a defesa dos desordeiros que aviltam a universidade.
Descrevo algumas dessas situações em diversos textos publicados no JCO, dos quais destaco:
Aqui eu gostaria de fazer uma revelação pessoal. Ela ilustra, em parte, o que tenho comentado sobre o atual estado de nossas universidades.
Em 2018, tão logo comecei a expor minhas opiniões sobre o estado abjeto de nossas universidades, eis que participei de uma reunião com uma pauta bem específica, a qual foi ignorada para que eu fosse objeto de retaliação por parte de vários de meus “pares”.
A reunião começou com a coordenadora afirmando que queria manifestar seu “repúdio” às convicções que expressei em um de meus artigos de opinião.
Ela foi seguida por vários de meus “colegas”, os quais usaram do tempo, que seria para discutir a importante pauta da reunião, para aviltar minhas opiniões (por destoarem do mainstream acadêmico) e, consequentemente, a mim mesmo. Alguns inclusive afirmaram que eu não poderia publicar minhas opiniões as subscrevendo como professor da UFPEL. Sim: segundo eles eu deveria ocultar que sou professor da UFPEL ao manifestar minhas opiniões.
Agora, volto a perguntar: onde está o “debate” político aqui? Onde jaz a “livre manifestação do pensamento e das ideias”? E quanto à “diversidade”? Não me surpreende que, sob a máscara das ‘fake news’, estejam criminalizando opiniões divergentes e os “indignos” que as professam publicamente.
Aliás, um aspecto importante dessa situação absurda é que sempre expus minhas opiniões em veículos externos à universidade.
Nunca abordei minhas opiniões em sala de aula, na qual sempre me restringi aos planos das disciplinas por mim ministradas.
Embora abordando teorias abjuradas pelo establishment acadêmico, como aquelas ligadas ao liberalismo e ao conservadorismo, sempre o fiz à luz de filósofos e suas obras.
A meu ver esse é o real sentido de um debate acadêmico, de uma “livre manifestação do pensamento e das ideias”, algo muito distinto do proselitismo político desdenhável que tenho testemunhado por anos em um crescente processo de homogeneização da universidade, no decorrer do qual aqueles que sustentam posições consideradas heréticas são declarados párias, sendo transformados em objetos de escárnio, chamados de “fascistas”, “nazistas”, “homofóbicos”, “racistas”, “neoliberais” “misóginos” e tantos outros adjetivos infames.
Esse é apenas um exemplo, mas fui objeto de diversos ataques desde que comecei a expor minhas opiniões sobre diversos temas.
Não apenas minhas opiniões, mas mesmo minhas posições acadêmicas embasadas na literatura filosófica, em dados, fatos, etc, as quais destoam daquilo que hoje constitui o establishment acadêmico.
Assim, já escrevi, palestrei, ministrei aulas, etc, argumentando contra o aborto, defendendo princípios conservadores e liberais, criticando o multiculturalismo, dentre outros tópicos rejeitados e abominados pela intelligentsia. Mas isso não atraiu argumentos para um “debate”. Atraiu, lamentavelmente, adjetivos insultuosos cujo propósito sempre foi o de “assassinar” minha reputação.
Já fui inclusive objeto de nota de repúdio aqui na UFPEL (por defender os argumentos acima referidos). Embora eu tenha sempre sido respeitoso e civilizado, mesmo com aqueles dos quais discordo, isso nunca constituiu uma via de mão dupla.
E eu não estou sozinho. Recentemente, por exemplo, completou um ano o movimento ‘Docentes pela Liberdade’ (DPL), do qual sou, hoje, diretor aqui no Rio Grande do Sul.
Nosso movimento surgiu justamente porque não temos, nas universidades, “debate”.
Em virtude das perseguições sofridas por milhares de professores, o DPL surgiu para agregá-los, para que eles possam adotar ações em conjunto visando assegurar justamente o “debate”, o “pluralismo”, a “diversidade”, a “inclusão”, categorias tão amplamente proferidas em nossas universidades, mas que são apenas mantras usados pela esquerda universitária, os quais ela, na prática, rejeita.
Ao começar a participar do DPL eu fui colocado a par de situações ainda mais terríveis do que aquela pela qual passei.
Nunca imaginei que professores no ensino superior poderiam passar por situações tão aterrorizantes, causadas sobretudo por seus pares. Tudo por não serem correligionários de partidos de esquerda.
Assim, o que temos, em nosso hoje combalido corpus universitarium (especialmente nas ‘Humanidades’ e a partir delas), é uma homogeneidade nas aulas, nos cursos, nas palestras, nos eventos, nas dissertações, teses, etc. Ao longo dos últimos anos muitos eventos considerados “de direita” foram simplesmente interditados violentamente por ativistas de esquerda aninhados em nossas universidades.
Por essa razão, uma vez que considero inerente à ideia mesma de universidade o dissenso (contra o dogmatismo), é com comiseração e desesperança que vejo essa decisão do STF quanto à ADPF 548. Afinal, durante o pleito de 2018 ficou escancarado que nossas universidades têm, sim, partido.
É irônico, mas os mesmos que defendem a universidade “pública” agem como se fossem seus proprietários, escorraçando aqueles que destoam do mainstream, notória e amplamente de esquerda.
Assim, para aqueles que ainda acreditam que existe “multiplicidade de ideias” e “debate” na universidade, sugiro um experimento perigosíssimo. Independentemente de se essas são realmente suas posições, ingressem na universidade e defendam, publicamente, as seguintes posições: que são favoráveis a uma economia de mercado, ao empreendedorismo e à meritocracia; que há boas razões para um estado menor, o que inclui universidades menores (menos caras) e eficientes; atrevam-se a dizer que são contra o aborto e que, como disse Rui Barbosa, “a família é a célula máter da sociedade”; aventurem-se a afirmar que existem, sim, culturas melhores do que outras e que o multiculturalismo é uma ideia danosa; argumentem que existem “morais absolutos”, bem como uma concepção superior de beleza, que o relativismo é insustentável e que há, sim, verdades; para fechar, declarem que apoiam o governo Bolsonaro e que se opõem ao ‘isolamento social’ nos moldes vigentes e que é importante o uso precoce da hidrocloroquina em pacientes com COVID-19.
Há, penso, uma considerável probabilidade de que vocês sejam agredidos, cuspidos, difamados e, em casos extremos, ameaçados de morte.
De uma forma ou de outra, o que quero dizer é que, nesses 29 anos desde que ingressei, inicialmente como estudante e hoje como professor, em uma universidade, acompanho uma crescente e sufocante hegemonia, a qual está se tornando cada vez mais hostil ao “debate” e à “livre manifestação do pensamento e das ideias”.
A liberdade, em todas as suas expressões, está sofrendo um ataque bestial e conjunto. Bárbaros, alojados intra muros em nossas universidades, judiciário, mídia e política, estão em uma guerra declarada contra a liberdade.
A decisão do STF quanto à ADPF 548, a perseguição e assédio legal a jornalistas, youtubers, etc, considerados “de direita”, bem como a votação da PL 1.358/20 (a qual será colocada em votação no Senado Federal na próxima terça-feira, dia 02 de maio de 2020 e pretende enrijecer a censura na mídia), são parte do vitupério premeditado de nossa combalida liberdade.
A esquerda odeia a liberdade e suas benesses (na verdade, a esquerda possui uma aversão doentia a todas as causas de nossa prosperidade).
Por tudo isso, creio que já não é o caso de sermos apenas vigilantes quanto à nossa liberdade: é necessário, talvez mais do que nunca em nossa história recente, que lutemos por ela.
Carlos Adriano Ferraz. Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com estágio doutoral na State University of New York (SUNY). Foi Professor Visitante na Universidade Harvard (2010). Atualmente é professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Filosofia, no qual orienta dissertações e teses com foco em ética, filosofia política e filosofia do direito. Também é membro do movimento Docentes pela Liberdade (DPL), sendo atualmente Diretor do DPL/RS.
Algumas são irrelevantes, mas outras são importantes e deveriam nos preocupar.
Por exemplo, na madrugada do dia 14 de maio (2020) o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, unanimemente em sessão virtual, que são inconstitucionais “ações contra a livre manifestação de ideias nas universidades”.
Em seu site de notícias lemos: “Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão virtual, julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 548, para declarar nulas decisões da Justiça Eleitoral em cinco estados que impuseram a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos em ambiente virtual ou físico de universidades às vésperas do segundo turno da eleição de 2018.
As decisões envolviam busca e apreensão de materiais de campanha eleitoral em universidades e associações de docentes e proibição de aulas com temática eleitoral e de reuniões e assembleias de natureza política”.
Com efeito, para compreendermos tal decisão precisamos contextualiza-la. Assim, voltemos a 2018 e vejamos, então, o que motivou a ADPF 548.
À época estávamos em período eleitoral, sendo que a eleição para a presidência da república transcorria de forma acirrada.
Nesse contexto, e diante do fato de as universidades terem se tornado mecanismos de promoção do candidato à presidência Fernando Haddad (PT), surgiram diversas “decisões de juízes eleitorais que determinaram a busca e a apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas dependências das sedes de associações de docentes”; não apenas isso, tais decisões “proibiram aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política, impondo a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018 em universidades federais e estaduais. As medidas teriam como embasamento jurídico a legislação eleitoral, no ponto em que veda a veiculação de propaganda de qualquer natureza em prédios e outros bens públicos (artigo 37 da Lei 9.504/1997)”.
Diante dessas decisões a então procuradora-geral da república ajuizou a ADPF 548, na qual ela se manifestava contrária às decisões dos juízes eleitorais. Ou seja, verdade seja dita, ela defendia que as atividades político partidárias (especialmente pró-PT e Psol) não fossem impedidas nas universidades públicas, de tal forma que as mesmas pudessem seguir, factualmente, como “palanques” para propaganda política em favor do candidato do PT e contra a candidatura do hoje presidente Jair Bolsonaro.
Sim, na prática isso era o que estávamos testemunhando. Afinal, o que realmente víamos em nossos campi eram faixas em defesa do candidato do PT e diversas pichações denegrindo a imagem do seu principal adversário.
Foi diante desses fatos, amplamente divulgados na época, que veio a acertada decisão dos juízes eleitorais.
Assim, observem: em momento algum eles (juízes eleitorais) proibiram o “debate político” (tampouco a “multiplicidade de pensamento e de ideias”). Eles determinaram 1. “a busca e a apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral”, proibiram 2. “aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política”, bem como demandaram 3. “a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018”.
Agora, pergunto: estavam eles realmente determinando o fim do “debate político”? Claramente, o que os juízes eleitorais estavam protegendo era a probidade do processo eleitoral, bem como assegurando que as universidades não seriam vilipendiadas, reduzidas a mero instrumento de proselitismo político abjeto, o que, infelizmente, era e permanece sendo nossa realidade.
Em suma, as decisões dos juízes eleitorais apenas pretendiam assegurar, concretamente, os artigos 24 e 37 da lei eleitoral 9504 (de 1997).
Dito de outra forma, eles estavam justamente endossando o verdadeiro “debate político”, algo raro na universidade desde que ela se tornou instrumento da esquerda.
Para que se tenha uma ideia da gravidade da situação, citarei apenas um exemplo oriundo do mesmo contexto em que tal decisão foi tomada. Com efeito, no meio da disputa pela presidência da república nosso sindicato (Adufpel) convocou toda a comunidade acadêmica para um ato contra o então candidato à presidência, Jair Messias Bolsonaro.
A chamada dizia: “movimentos sociais, entidades e coletivos unem-se contra Bolsonaro no próximo sábado”.
Tal ato ocorreu no dia 29 de setembro de 2018 e estava alinhado com uma orientação do ANDES (sindicato nacional dos docentes das instituições de ensino superior), o qual indicou o seguinte: “que as seções sindicais e secretarias regionais construam e participem dos atos”.
Além disso, líamos no texto que “a mobilização tem como objetivo mostrar a força e a união contra o discurso de ódio, a misoginia, o fascismo, o racismo e a homofobia, promovidos pelo candidato, e dizer não à política que ameaça o estado democrático de direito”.
Atentem para a gravidade da nota, repleta de acusações gravíssimas (e ela vem de um sindicato de professores de ensino supostamente “superior”).
Embora não tenha sido um evento isolado, ele serve de paradigma para que reconheçamos o que estava ocorrendo em nossas universidades durante a corrida eleitoral de 2018, algo, a propósito, desgraçadamente rotineiro em nossas cada vez mais aviltadas universidades.
Tais associações não estavam exigindo “debate político”. Elas estavam a serviço de uma agenda partidária em particular. Simples assim.
E isso não parou após o término da corrida eleitoral. De nossas universidades (de gestores, sindicatos, professres, estudantes, etc) adveio, desde a posse de Bolsonaro, um discurso que se coloca como “resistência” em exortação à “luta” (contra a atual administração e tudo aquilo que ela representa – seu suposto conservadorismo e liberalismo).
Aliás, alguns meses após sua vitória, Bolsonaro veio à região sul para inaugurar uma obra de duplicação da BR 116 (agosto/2019). Nessa ocasião, em um grupo no Facebook chamado “UFPEL” (do qual são excluídos aqueles que mostram qualquer indício de serem ou “liberais” ou “conservadores” – vejam como eles prezam o “debate político” e a “livre manifestação do pensamento e das ideias”), no qual encontramos, além de estudantes, diversos gestores, professores, servidores, etc, houve uma acalorada discussão sobre como atentar contra a vida do presidente, o que levou a uma denúncia junto ao MP, motivada pela preocupação de parte da comunidade acadêmica, bem como de cidadãos da sociedade civil, seja com a segurança do presidente seja com a democracia e com a segurança pública.
Embora tal grupo leve o nome da universidade, não houve qualquer nota de rejeição da instituição quanto ao ocorrido.
Aliás, já presenciamos, aqui dentro da UFPEL, situações hediondas e, mesmo, criminosas (promovidas por “coletivos” de esquerda), sendo que perante essas situações as recentes gestões simplesmente não emitiram qualquer nota de repúdio. Tampouco acionaram a força policial para pôr fim aos acontecimentos que nada tinham de democráticos. Pior: quando a polícia intervém para interromper ilicitudes, a gestão divulga notas de repúdio às ações da força policial, assumindo a defesa dos desordeiros que aviltam a universidade.
Descrevo algumas dessas situações em diversos textos publicados no JCO, dos quais destaco:
Aqui eu gostaria de fazer uma revelação pessoal. Ela ilustra, em parte, o que tenho comentado sobre o atual estado de nossas universidades.
Em 2018, tão logo comecei a expor minhas opiniões sobre o estado abjeto de nossas universidades, eis que participei de uma reunião com uma pauta bem específica, a qual foi ignorada para que eu fosse objeto de retaliação por parte de vários de meus “pares”.
A reunião começou com a coordenadora afirmando que queria manifestar seu “repúdio” às convicções que expressei em um de meus artigos de opinião.
Ela foi seguida por vários de meus “colegas”, os quais usaram do tempo, que seria para discutir a importante pauta da reunião, para aviltar minhas opiniões (por destoarem do mainstream acadêmico) e, consequentemente, a mim mesmo. Alguns inclusive afirmaram que eu não poderia publicar minhas opiniões as subscrevendo como professor da UFPEL. Sim: segundo eles eu deveria ocultar que sou professor da UFPEL ao manifestar minhas opiniões.
Agora, volto a perguntar: onde está o “debate” político aqui? Onde jaz a “livre manifestação do pensamento e das ideias”? E quanto à “diversidade”? Não me surpreende que, sob a máscara das ‘fake news’, estejam criminalizando opiniões divergentes e os “indignos” que as professam publicamente.
Aliás, um aspecto importante dessa situação absurda é que sempre expus minhas opiniões em veículos externos à universidade.
Nunca abordei minhas opiniões em sala de aula, na qual sempre me restringi aos planos das disciplinas por mim ministradas.
Embora abordando teorias abjuradas pelo establishment acadêmico, como aquelas ligadas ao liberalismo e ao conservadorismo, sempre o fiz à luz de filósofos e suas obras.
A meu ver esse é o real sentido de um debate acadêmico, de uma “livre manifestação do pensamento e das ideias”, algo muito distinto do proselitismo político desdenhável que tenho testemunhado por anos em um crescente processo de homogeneização da universidade, no decorrer do qual aqueles que sustentam posições consideradas heréticas são declarados párias, sendo transformados em objetos de escárnio, chamados de “fascistas”, “nazistas”, “homofóbicos”, “racistas”, “neoliberais” “misóginos” e tantos outros adjetivos infames.
Esse é apenas um exemplo, mas fui objeto de diversos ataques desde que comecei a expor minhas opiniões sobre diversos temas.
Não apenas minhas opiniões, mas mesmo minhas posições acadêmicas embasadas na literatura filosófica, em dados, fatos, etc, as quais destoam daquilo que hoje constitui o establishment acadêmico.
Assim, já escrevi, palestrei, ministrei aulas, etc, argumentando contra o aborto, defendendo princípios conservadores e liberais, criticando o multiculturalismo, dentre outros tópicos rejeitados e abominados pela intelligentsia. Mas isso não atraiu argumentos para um “debate”. Atraiu, lamentavelmente, adjetivos insultuosos cujo propósito sempre foi o de “assassinar” minha reputação.
Já fui inclusive objeto de nota de repúdio aqui na UFPEL (por defender os argumentos acima referidos). Embora eu tenha sempre sido respeitoso e civilizado, mesmo com aqueles dos quais discordo, isso nunca constituiu uma via de mão dupla.
E eu não estou sozinho. Recentemente, por exemplo, completou um ano o movimento ‘Docentes pela Liberdade’ (DPL), do qual sou, hoje, diretor aqui no Rio Grande do Sul.
Nosso movimento surgiu justamente porque não temos, nas universidades, “debate”.
Em virtude das perseguições sofridas por milhares de professores, o DPL surgiu para agregá-los, para que eles possam adotar ações em conjunto visando assegurar justamente o “debate”, o “pluralismo”, a “diversidade”, a “inclusão”, categorias tão amplamente proferidas em nossas universidades, mas que são apenas mantras usados pela esquerda universitária, os quais ela, na prática, rejeita.
Ao começar a participar do DPL eu fui colocado a par de situações ainda mais terríveis do que aquela pela qual passei.
Nunca imaginei que professores no ensino superior poderiam passar por situações tão aterrorizantes, causadas sobretudo por seus pares. Tudo por não serem correligionários de partidos de esquerda.
Assim, o que temos, em nosso hoje combalido corpus universitarium (especialmente nas ‘Humanidades’ e a partir delas), é uma homogeneidade nas aulas, nos cursos, nas palestras, nos eventos, nas dissertações, teses, etc. Ao longo dos últimos anos muitos eventos considerados “de direita” foram simplesmente interditados violentamente por ativistas de esquerda aninhados em nossas universidades.
Por essa razão, uma vez que considero inerente à ideia mesma de universidade o dissenso (contra o dogmatismo), é com comiseração e desesperança que vejo essa decisão do STF quanto à ADPF 548. Afinal, durante o pleito de 2018 ficou escancarado que nossas universidades têm, sim, partido.
É irônico, mas os mesmos que defendem a universidade “pública” agem como se fossem seus proprietários, escorraçando aqueles que destoam do mainstream, notória e amplamente de esquerda.
Assim, para aqueles que ainda acreditam que existe “multiplicidade de ideias” e “debate” na universidade, sugiro um experimento perigosíssimo. Independentemente de se essas são realmente suas posições, ingressem na universidade e defendam, publicamente, as seguintes posições: que são favoráveis a uma economia de mercado, ao empreendedorismo e à meritocracia; que há boas razões para um estado menor, o que inclui universidades menores (menos caras) e eficientes; atrevam-se a dizer que são contra o aborto e que, como disse Rui Barbosa, “a família é a célula máter da sociedade”; aventurem-se a afirmar que existem, sim, culturas melhores do que outras e que o multiculturalismo é uma ideia danosa; argumentem que existem “morais absolutos”, bem como uma concepção superior de beleza, que o relativismo é insustentável e que há, sim, verdades; para fechar, declarem que apoiam o governo Bolsonaro e que se opõem ao ‘isolamento social’ nos moldes vigentes e que é importante o uso precoce da hidrocloroquina em pacientes com COVID-19.
Há, penso, uma considerável probabilidade de que vocês sejam agredidos, cuspidos, difamados e, em casos extremos, ameaçados de morte.
De uma forma ou de outra, o que quero dizer é que, nesses 29 anos desde que ingressei, inicialmente como estudante e hoje como professor, em uma universidade, acompanho uma crescente e sufocante hegemonia, a qual está se tornando cada vez mais hostil ao “debate” e à “livre manifestação do pensamento e das ideias”.
A liberdade, em todas as suas expressões, está sofrendo um ataque bestial e conjunto. Bárbaros, alojados intra muros em nossas universidades, judiciário, mídia e política, estão em uma guerra declarada contra a liberdade.
A decisão do STF quanto à ADPF 548, a perseguição e assédio legal a jornalistas, youtubers, etc, considerados “de direita”, bem como a votação da PL 1.358/20 (a qual será colocada em votação no Senado Federal na próxima terça-feira, dia 02 de maio de 2020 e pretende enrijecer a censura na mídia), são parte do vitupério premeditado de nossa combalida liberdade.
A esquerda odeia a liberdade e suas benesses (na verdade, a esquerda possui uma aversão doentia a todas as causas de nossa prosperidade).
Por tudo isso, creio que já não é o caso de sermos apenas vigilantes quanto à nossa liberdade: é necessário, talvez mais do que nunca em nossa história recente, que lutemos por ela.
Carlos Adriano Ferraz. Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com estágio doutoral na State University of New York (SUNY). Foi Professor Visitante na Universidade Harvard (2010). Atualmente é professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Filosofia, no qual orienta dissertações e teses com foco em ética, filosofia política e filosofia do direito. Também é membro do movimento Docentes pela Liberdade (DPL), sendo atualmente Diretor do DPL/RS.
Nenhum comentário:
Postar um comentário