Recado de Ruth de Aqui, em sua coluna na revista Época: "Renan Calheiros, avise à torre que o senhor não tem mais condições de pilotar nada". Pane total:
Se o combustível de
um presidente do Senado for a credibilidade. Se a autonomia de um
presidente do Senado depender de sua lisura. Se um presidente do Senado,
na linha sucessória da Presidência da República, se tornar réu do
Supremo Tribunal Federal por peculato (traduzindo: desvio de verba
pública para uso pessoal)... A emergência estará configurada.
Renan Calheiros,
avise à torre que o senhor não tem mais condições de pilotar nada, muito
menos votação contrabandeada no meio da noite sujeita a trovoadas. Não
finja ser pane elétrica, não culpe o Judiciário, diga logo que é pane
seca e que lhe falta o combustível da credibilidade. Ninguém acredita
quando o senhor elogia a Lava Jato e condena a corrupção.
Admita que calculou
mal os riscos e que, de tanto desafiar as regras e a sensatez, de tanto
se sentir protegido pela máquina do PMDB, acima das nuvens, de tanto
agir no limite da paciência da sociedade, acabou vitimado pelo
sentimento de onipotência, talvez herdado de seu padrinho José Sarney.
Faça como fez há nove
anos, quando renunciou à presidência da mesma Casa para não ser
cassado, ao ser acusado de pagar a pensão de sua filha extraconjugal com
dinheiro de empreiteira. Voltou depois, com a bênção de todos, Sarney e
Lula e seus companheiros. Sempre com aquele risinho. Renan responde a
mais 11 processos no STF, oito deles da Lava Jato. Ou Renan é culpado ou
é o político mais perseguido da história do Brasil.
O rabo preso
gigantesco de Brasília explica a cumplicidade, no Senado, de figuras
como Fernando Collor e Lindbergh Farias. Eles estavam entre os 14
senadores que apoiaram Renan na pressa de votar o projeto da Câmara, que
desfigurou as dez medidas anticorrupção de iniciativa popular. Renan
nem queria votação nominal, só voto simbólico. Sua manobra foi
desmascarada a tempo. A maioria no Senado percebeu que o plano de voo de
Renan era irresponsável. Renan descobriu que não tinha autonomia.
Na Câmara, o rabo
preso aliou Pedro Paulo a Jandira Feghali e Indio da Costa contra o
pacote original anticorrupção. O PT de Lula e Dilma e o PRB de Crivella
também se aliaram contra o pacote anticorrupção e a favor de enquadrar o
Judiciário. Jair Bolsonaro e Jean Wyllys – que sempre viveram aos
cuspes e berros – se uniram a favor das medidas anticorrupção mas foram
derrotados.
Há um claro conluio
político, liderado por investigados na Lava Jato, para melar
investigações de propina, caixa dois e corrupção. Sob o pretexto de
coibir abusos de autoridade – que devem mesmo ser refreados para evitar o
“espetáculo” e o desrespeito a direitos dos delatados –, o Congresso
ameaça uma operação que mudou o Brasil para sempre.
Antes do juiz Sergio
Moro e a equipe de Curitiba, sabíamos dos desvios de dinheiro público,
mas não se imaginava o grau, ou o valor. Não se imaginava a amplitude
das quadrilhas no Poder. Os métodos, os laranjas, os superfaturamentos,
as joias da Coroa e a total impunidade de quem dilapidava obras de
infraestrutura e serviços essenciais. Além dos roubos, terão de ser
atacados com urgência os privilégios, as mordomias, os supersalários na
casta política. Mas já é um começo de moralização do serviço público.
Renan, em evento da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), afirmou que o sistema político
brasileiro está “falido e fedido”. Não percebe que estão colando nele a
pecha de cinismo? Sua eloquência contra o presidencialismo não comoveu. O
presidente da OAB, Claudio Lamachia, defendeu o afastamento imediato de
Renan. Não como admissão de culpa, mas para não comprometer os
trabalhos do Senado, enquanto for réu no STF.
Por que esse
açodamento do Congresso, em dezembro, perto do Natal e de mais um
recesso de verão? Dá para entender o “timing”. Vem aí a mãe de todas as
delações. A maior empreiteira do país, a Odebrecht, envolvendo 75
executivos e ex-dirigentes, deve citar 200 políticos. Pai e filho,
Emilio e Marcelo Odebrecht assinaram a delação premiada, prometeram
pagar multa de R$ 6,8 bilhões e pediram desculpas por “práticas
impróprias”. É com esperança, não com ceticismo, que leio o comunicado
histórico da Odebrecht.
“Não importa se
cedemos a pressões externas. (...) Fomos coniventes com tais práticas.
(...) Foi um grande erro, uma violação dos nossos próprios princípios,
uma agressão a valores consagrados de honestidade e ética.” E por aí
vai. Leiam. As dez medidas de compromisso com o futuro da Odebrecht são
exemplares. No topo da lista: “Combater e não tolerar a corrupção em
quaisquer de suas formas, inclusive extorsão e suborno”.
Quando leremos
desculpas e compromissos de nossos políticos? Se o Brasil está em pane
seca, com milhões de pessoas devolvidas à pobreza, é por ganância e
incompetência de seus governantes.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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