Até novembro deste ano, 257.033 candidatos fizeram a prova prática. Deles, 95 mil foram eliminados
Em vez de ficar na sala de espera,
junto com os demais candidatos que assistiam televisão, a professora
municipal Jaqueline Góes Moreira, 30 anos, estava em pé, andando de uma
ponta a outra em frente à entrada de um galpão na Ribeira, onde é
realizado o exame prático de direção do Departamento Estadual de
Trânsito (Detran-BA).
Ela estalava os dedos e mordia os lábios, enquanto
aguardava o chamado do instrutor para fazer a baliza. A tensão tinha
justificativa: no último dia 7, era a quarta vez este ano que ela se
submetia à avaliação. Segundo o órgão, 1/3 dos candidatos são reprovados
no teste prático para a primeira carteira de motorista na categoria B.
![]() |
---|
Catiucha Melina: quatro reprovações e tudo de novo após o Carnaval
(Foto: Almiro Lopes/CORREIO) |
Até
novembro deste ano, 257.033 candidatos fizeram a prova prática, dos
quais 95.633 foram considerados inaptos. Já no mesmo período do ano
passado, de 236.757 que também fizeram a prova, 75.887 não passaram.
Jaqueline, infelizmente, foi reprovada.
“Estou pensando seriamente em desistir”,
declarou. Para o coordenador de Segurança e Educação para o Trânsito do
Detran-BA, Eliezer Cruz, o fator psicológico é a maior causa para a
reprovação no exame prático. “O candidato sabe bem a teoria, vai bem nas
aulas práticas, mas chega ansioso para o exame prático e acaba
cometendo erros que normalmente não cometeria”, disse o Cruz.
Dentre os elementos da reprovação, a baliza (momento
em que o candidato estaciona entre dois protótipos) é responsável pela a
maioria das reprovações. “Primeiro pelo grau de dificuldade, mais do
que a condução que exige a troca de marchas e a meia embreagem”,
argumentou. Cruz afirmou que o órgão não tem números que mostrem onde os
candidatos mais erram.
Há
mais de 17 anos trabalhando como instrutor de trânsito, Washigton
Lázaro apontou os erros cometidos pelos candidatos por causa do
nervosismo. “Descontrolar e interromper o carro, não sinalizar
corretamente ou não fazer uso da sinalização, ultrapassar a faixa de
retenção, na parada obrigatória”, enumerou Lázaro.
Os motivos apontados por Cruz e por Lázaro são
confirmados por quem já tentou por mais de uma vez a Carteira Nacional
de Habilitação (CNH). “Fiz as três vezes e perdi. As três neste ano.
Minha questão é o psicológica. Mas algo diferente em relação a outras
provas. Daquele galpão sai muita gente chorando e a gente fica
impactada”, disse a estudante de Direito Temille Batista de Souza, 28.
Na primeira vez, ela não fez muito bem a baliza, mas
chegou a fazer o exame de rua – foi quando freou bruscamente após uma
pessoa atravessar. “E o examinador do Detran assumiu o volante”, contou
Temille. As duas outras tentativas, ela bateu no protótipo na baliza.
“Mas não desistirei, pois pretendo fazer o concurso da Polícia Militar e
a habilitação é obrigatória”, disse.
“Já fiz quatro vezes. Na primeira, perdi na baliza,
na segunda, perdi no exame de rua, na terceira e quarta perdi novamente
na baliza. Fiquei muito nervosa, não me sentia segura em nenhum
momento”, relatou a também estudante de Direito Catiucha Melina Peixoto,
34.
“Em vários momentos vi o examinador pisar no freio
dele. Eu, no lugar dele, não me passava”, lembrou bem-humorada. Catiucha
disse que, após o Carnaval, fará tudo de novo. A jornalista Acássia
Filgueiras, 36, foi vencida quatro vezes pelo nervosismo.
“Numa das situações, o instrutor pôs um copo de
café em cima do painel e fiquei com medo de derramar o café nele. Fiquei
tensa demais. Aí ele me reprovou porque estava com a velocidade abaixo
da permitida. Em outra situação, não tinha controle nas reduções e
passava muito rápido pelo quebra-molas”, contou.
“Pensei em desistir. Aí, meu professor da auto da
escola me encorajou e fiz tudo de novo e passei”, contou
Acássia. Somente na quarta tentativa, a técnica em edificações Janaína
Teixeira Santos, 25, foi aprovada no teste de rua.
“Por mais que você passe com louvor na prova teórica
e nas aulas práticas de rua, você saber que está sendo avaliado muda
tudo. Só o examinador entrar no carro que as minhas pernas tremiam e
começava a transpirar sem parar”, contou. “Dessa vez, fiquei menos
nervosa que antes. Orei bastante e consegui completar a prova toda sem
errar nada”, emendou Janaína, aprovada no último dia 7.
Medo de fracassarPara
o psiquiatra e professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba),
Irismar Reis de Oliveira, o candidato perde por causa do medo de
fracassar.
“É o indivíduo que acha que vai ter dificuldades nas
relações sexuais, ou numa prova prática de trânsito, e acaba tendo. Ele
teme diante de uma performance. Então, esse temor faz com que a
performance seja prejudicada”, explicou.
De acordo com o psiquiatra, a psicoterapia cognitiva
pode ajudar o indivíduo a identificar comportamento catastrófico. Para
lidar com o nervosismo, o psiquiatra explica que a terapia ensina
técnicas para tal situação. “São técnicas para relaxar e corrigir os
pensamentos catastróficos”, disse. Nesse caso, são sessões de terapias
curtas.
Há casos em que as sessões são extensas — ocorre
quando a terapia aponta o medo patológico, nesse caso, a fobia. “O
indivíduo com fobia tem pensamentos distorcidos relacionados com o
objeto temido. Se tem uma fobia social, ele deixa de ir para uma festa
porque acha que vai gaguejar e pensa que as pessoas vão achá-lo
estranho, por exemplo”.
“Tem aquele que tem fobia de elevador, que acha que o
elevador vai cair ou vai ficar parado e ficar sem ar”, explicou o
psiquiatra, comparando as situações com quem tem medo patológico do
trânsito.
Investimento total para primeira CNH é de quase R$ 2 milQuase
R$ 2 mil. Este o valor que o candidato investe para ter a Carteira
Nacional de Habilitação (CNH). O primeiro passo é ir ao Serviço de
Atendimento ao Cidadão (SAC), onde há um posto do Detran, e comprar o
laudo, que custa R$ 143.
É necessário apresentar o CPF, RG e comprovante de
residência, originais e cópias. O segundo passo é pagar R$ 253 para o
exame médico e o psicoteste. No laudo, com validade de um ano, fornecido
pelo SAC, constam os telefones das clínicas conveniadas.
Em seguida, é a hora de escolher a autoescola. Em
média, o candidato terá que desembolsar entre R$ 1.350 e R$ 1.400, para
as aulas teóricas e práticas. Primeiro, são 45 horas de aulas teóricas.
Depois, o candidato faz a prova eletrônica na autoescola.
Para isso, paga mais R$ 80. São três tentativas. Em
seguida, faz a prova de legislação, primeiros-socorros, mecânica e meio
ambiente. Passando, retorna à autoescola e paga R$ 40 para fazer 25
aulas práticas. Só então o candidato faz a prova prática no centro de
avaliação do Detran, na Ribeira.
Obrigatoriedade de simulador vai aumentar custo a partir de janeiroA
partir de janeiro de 2016, cinco aulas serão obrigatórias no simulador
de direção, durante as aulas práticas, conforme exigência da resolução
do Conselho Nacional de Trânsito (Contran).
“Ainda não há uma definição dos custos do simulador.
Acho que teremos um reajuste de 15% a 30%”, declarou Antônio Oliveira,
coordenador da Autoescola Veja. Se o reajuste for 30% de R$ 1.350 –
mínimo cobrado pelas autoescolas –, o valor saltará para R$ 1.755.
As autoescolas irão locar o simulador — o custo
estimado é de R$ 50 mil. “Além disso, teremos um custo com professores
capacitados nas áreas de informática e de trânsito. Qualquer custo que
venha, seremos obrigado a repassar, mesmo correndo o risco de perder
clientes” disse Oliveira, para quem os simuladores não traduzem a
realidade de situações vividas pelos motoristas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário