Ninguém duvida que o planeta vem aquecendo, mas temos a necessidade de nos adaptarmos a um novo 'paradigma'. João Pereira Coutinho via FSP:
De repente, ninguém fala de outra coisa: será que a “ansiedade climática” está a matar a vontade de ter filhos?
Parece que sim. A revista “Spectator”, pela voz de um catastrofista,
oferece os cálculos: viajar de carro emite 2,4 toneladas de CO2 para a atmosfera por ano; ter um filho, 59 toneladas.
Conclusão: salvar o planeta significa usar o contraceptivo e esquecer a descendência. O que, no limite dos limites, levará à extinção da espécie –um pensamento suicidário que, sem dúvidas, deixará o planeta vazio de gente, mas intacto.
Não moralizo. Você não quer ter filhos? Eu até agradeço. O mundo está lotado e é quase impossível reservar uma boa mesa num sábado à noite.
Além
disso, a escolha pode ser legítima e até racional: filhos dão despesa.
Preocupações. Desilusões. E é impossível jogá-los no lixo como se fossem
um brinquedo descartável.
Em princípio, são um compromisso para a vida inteira. Como escreveu um dia o meu colega Luiz Felipe Pondé, é por isso que muitos preferem animais de companhia. Eles duram alguns anos –e pronto. E existe sempre o abrigo da prefeitura.
Filhos
são um sacrifício, eis o meu ponto. Você perde muito –seu conforto,
suas certezas, sua arrogância– e ganha uma terrível vulnerabilidade.
Essa vulnerabilidade vem com a contingência: o que farão eles? O que o
mundo fará com eles? O que eles farão comigo?
Por outro lado...
Sim, por outro lado, existe na paternidade um
momento epifânico: é aquele momento em que você percebe que não é a
pessoa mais importante do mundo. Existe alguém que ocupa esse lugar –e
você, bicho egoísta por definição, aplaude e aceita.
Mais:
até agradece, porque o seu universo se expandiu e, talvez pela primeira
vez, entende que essa história de “amor incondicional” não é lero-lero
de telenovela. É uma descoberta preciosa.
Pois
bem, meu bem: você pode recusar ter filhos por mil razões atendíveis.
Mas a “ansiedade climática” me parece desculpa esfarrapada para outros
problemas.
Que o planeta vem aquecendo, ninguém duvida. Que os seres humanos dão um contributo importante para essa miséria, também não.
Mas
o que está em causa, como sempre esteve, é a necessidade de nos
adaptarmos a um novo “paradigma”, para usar essa horrível palavra, e não
de nos extinguirmos por amor panteísta.
E,
sabendo que o futuro é ignoto por definição (só malucos acreditam que
conhecem o amanhã), talvez as novas gerações possam ver melhor, e mais
longe, do que a geração de seus pais. Isso, claro, se essas gerações
chegarem a nascer.
“Ansiedade climática”, vertida em suicídio demográfico,
não tem nada a ver com o clima. Mas tem tudo a ver com o clima moral do
nosso tempo, que transformou o risco em heresia e a segurança absoluta
em obsessão paranoica –e autodestrutiva.
Alguém
deveria explicar a essa gente que o planeta não é mais importante que
os seres humanos. Porque, se for, para que serve o planeta, afinal?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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