Através da reportagem de Gabriel Arruda de Castro, via Gazeta do Povo, saúdo a escola gaúcha que retoma os estudos clássicos. É uma luz no fim do túnel:
Enquanto
muitos educadores buscam novos métodos de ensino para se adequar às
mudanças constantes de um mundo conectado pela tecnologia, cada vez mais
pais e professores apostam no caminho oposto: um retorno à educação
clássica.
O
que se chama de educação clássica é simplesmente o que se chamava de
educação até cerca de dois séculos atrás. Baseadas nos currículos das
academias da Antiguidade (especialmente em Atenas e Roma) e da Europa
medieval, as escolas clássicas rejeitam a noção de que a aprovação no
vestibular é o critério mais importante de sucesso.
Os
defensores da educação clássica são pais e educadores insatisfeitos com
o modelo contemporâneo. Por um lado, eles se preocupam com a crescente
inclusão de bandeiras ideológicas de esquerda no currículo, como a
chamada "identidade de gênero". Por outro, acreditam que uma educação
voltada apenas para o mercado profissional não é capaz de ensinar o
aluno a enfrentar as questões mais profundas da existência humana. E há
sinais de que a procura por esse modelo de ensino tem crescido, dentro e
fora do Brasil.
O
termo “educação clássica” por vezes é usado para definir modelos
distintos. Mas, como regra, as instituições que adotam essa proposta
costumam incluir o estudo de sete disciplinas fundamentais: gramática,
lógica, retórica (Trivium), aritmética, geografia, astronomia e música
(Quadrivium). A ênfase é na formação de alunos virtuosos, moralmente
responsáveis - e não somente de profissionais capazes ou de pessoas que
vão “transformar o mundo”.
Embora
algumas escolas país afora já tenham adotado um modelo mais similar ao
da educação clássica, elas são uma exceção. A maior parte dos cursos
desse tipo ainda é oferecida de forma online. Por causa da falta de
instituições presenciais com currículos clássicos, muitos pais adeptos
desse estilo de educação acabam optando por ensinar os filhos em casa.
Mas
a oferta de escolas nesse modelo deve aumentar nos próximos anos. Em
Nova Santa Rita (RS), na região metropolitana de Porto Alegre, um
projeto ousado tenta colocar de pé uma escola clássica completa para 450
alunos. O Instituto Cultural Hugo de São Vitor, uma entidade que
atualmente oferece cursos online, já adquiriu um amplo terreno e planeja
erguer uma escola nos moldes clássicos: o Colégio São José.
O
projeto arquitetônico do prédio, com 12 mil metros quadrados de área
construída, já está pronto. A iniciativa tem metas de curto, médio, e
longo prazo. A previsão é de que a escola passe a funcionar em 2026 -
ainda com a estrutura física incompleta. Quando estiver totalmente
pronto (em 2031), o colégio terá uma torre de astronomia, ginásio, campo
de futebol, pista de atletismo e até residências para professores.
À
frente do projeto, o professor Clístenes Hafner Fernandes afirma que é
possível cumprir as exigências do Ministério da Educação e, ao mesmo
tempo, ampliar o currículo para abarcar uma formação mais completa dos
alunos. Para isso, as aulas serão em tempo integral. A escola oferecerá,
além das disciplinas básicas, aulas de astronomia, retórica, canto
Coral, marcenaria e latim. De acordo com Fernandes, a preparação dos
professores já teve início.
Atuando
na área educacional há vários anos, o professor tem percebido um
aumento na procura pela educação clássica. “Existe um interesse
crescente pela educação clássica por parte dos pais, justamente por
verem que, ao final da sua vida escolar, os seus filhos no máximo
estarão preparados para prestar um exame do Enem ou um vestibular, e que
isso não significa uma vida de cultura, uma formação integral em todas
as dimensões humanas", afirma Fernandes.
Atualmente,
o instituto está na fase de captação de recursos para tocar a obra. O
custo da primeira fase é estimado em R$ 8 milhões.
Crescimento nos EUA
Nos
Estados Unidos, as escolas clássicas têm se expandido rapidamente, e
ainda assim não conseguem dar conta da demanda. Vivendo em uma cidade da
Pensilvânia onde essa modalidade de ensino não estava disponível, o
assistente administrativo Bill Brownlee decidiu mudar de estado - e de
emprego. Agora, os seus cinco filhos frequentam a Hillsdale Academy, no
interior do Michigan. Ligada ao Hillsdale College, uma faculdade de
orientação conservadora, a escola é um exemplo de sucesso e passou a
exportar seu modelo. Já são 41 escolas ligadas à Hillsdale Academy país
afora, com 14.500 estudantes matriculados. Outros 8 mil alunos estão em
listas de espera, já que as vagas não dão conta da demanda.
Os
filhos de Brownlee aprendem latim, precisam decorar versos para recitar
diante dos colegas e utilizam um uniforme com traços sóbrios. A escola
também tem um campeonato de debates, orações diárias e eventos que
valorizam os símbolos nacionais americanos.
“O
que me atrai na educação clássica é o fato de que o foco é fazer o
aluno compreender ideias que são duradouras. Eles não são ensinados a
última moda filosófica ou pedagógica”, diz ele. Brownlee acredita que o
mau desempenho das escolas públicas americanas impulsionou a busca por
escolas de perfil clássico (que, na maioria dos casos, são
particulares). “A situação da educação nos Estados Unidos se tornou tão
desagradável que muitos pais estão procurando outras opções”, afirma
ele.
De
fato, a pandemia de coronavírus - que modificou a rotina nas escolas
públicas e interrompeu as aulas, em alguns casos, por mais de um ano -
levou um número maior de pais a repensar suas escolhas educacionais.
Muitos optaram pelo homeschooling (ensino domiciliar) - o número saltou
de 3,3% para 16% entre a população negra durante a pandemia, de acordo
com o órgão do governo americano responsável pelo Censo. Outros
procuraram as escolas de perfil clássico.
Diretor
de uma editora que produz livros para escolas clássicas, Christopher
Perrin afirmou que a procura pelo material aumentou 82% desde 2019. A
escola online mantida pela companhia, a Scholè Academy, teve um aumento
de 155% na procura no mesmo período.
A
pandemia pode ter acelerado a expansão das escolas clássicas, mas - a
julgar pelo nível de satisfação dos pais - há boas razões para crer que
essa tendência vai continuar no longo prazo. “As crianças adoram ir à
escola, amam aprender, e estão rodeadas por pessoas que também amam
aprender e ensinar. Eu não poderia pedir por nada melhor”, diz Bill
Brownlee.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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