Cabe pensar o que seria um eventual governo petista (toc-toc-toc) no presente contexto. Artigo do professor Denis Rosenfield para o Estadão:
Lula
posiciona-se cada vez mais como um candidato eleitoralmente viável
dentro da polarização vigente. Diferentes pesquisas de opinião o colocam
numa posição vencedora num embate com o presidente Jair Bolsonaro,
embora o tempo seja senhor da razão, sem que se possa ainda predizer se o
atual mandatário terá condições de se recuperar de seu desgaste ou se
uma candidatura alternativa de centro, fora da atual radicalização,
poderá se afirmar. Em todo caso, cabe pensar o que seria um eventual
governo petista no presente contexto.
Observemos,
preliminarmente, que o ex-presidente voltou a gozar de amplo prestígio,
contando para isso com os erros de seus adversários reais ou potenciais
e a benevolência do Supremo Tribunal Federal (STF). Em linguagem
futebolística, tenderia a dizer que ele joga parado, não precisando
fazer grandes jogadas, salvo as articulações partidárias de bastidores
que estão sendo realizadas. Até agora, não aparece o Lula da demagogia e
dos discursos recorrentes, sempre baseados no antagonismo do “nós
contra eles”, dos “conservadores contra os progressistas”. Aliás,
expõe-se publicamente com companheiros de esquerda, porém negocia com a
direita tradicional.
Ocorre
que essa estratégia está produzindo bons resultados, salvo quando se
põe a falar, que é o momento em que todos os disparates e ambiguidades
surgem. Tenderia a afirmar, seguindo o dizer de um amigo, que ele é, no
silêncio, um admirável poeta!
Primeiro.
Seus elogios frequentes aos regimes ditatoriais de Cuba, Venezuela e
Nicarágua revelam a sua parca convicção democrática. Quem pode
acreditar, quando critica o atual presidente, que procura salvar o País
do autoritarismo? O que pensa fazer, seguir os passos dos Castros, dos
Chávez/Maduros e dos Ortegas? Será isso o que almeja para o Brasil? Não
podemos esquecer, sobretudo no que diz respeito a estes dois últimos
governantes, que se aproveitaram de eleições e de um respeito aparente
pela Constituição para miná-la, estabelecendo regimes autoritários. Foi a
subversão da democracia por meios democráticos, por mais paradoxal que
possa ser essa expressão. Enfim, qual seria a credibilidade democrática
de Lula e do PT com tal tipo de posição?
Segundo.
Diante da profunda crise político-econômica do País, diante de graves
problemas fiscais se refletindo na dívida pública e em sua imagem
internacional, com reflexos em investimentos, ratings e assim por
diante, Lula, quando emite suas opiniões, lembra não o seu primeiro
mandato, responsável fiscalmente graças à herança bendita do
ex-presidente Fernando Henrique e à sua competente dupla
Palocci/Meirelles. Ao contrário, traz-nos de volta a recordação de sua
equipe do final do segundo mandato e, sobretudo, a irresponsabilidade
fiscal e econômica da ex-presidente Dilma. Em seu primeiro mandato, Lula
foi um liberal, enquanto Dilma foi petista. Qual a sua escolha? Com
seus discursos contra o teto de gastos, pelo descontrole fiscal e pela
intervenção governamental na Petrobrás, pretende reeditar uma crise que
chegou a resultar em impeachment?
Terceiro.
O PT privatizou partidariamente o Estado, utilizando-se para isso do
discurso da justiça social. Na verdade, fez todo um trabalho de
aparelhamento político-administrativo, colocando pessoas-chave em
diferentes cargos. Vimos, graças à Lava Jato, todas as monstruosidades
produzidas, resultando numa corrupção generalizada e no aproveitamento
de verbas públicas para os seus objetivos políticos específicos. Ainda
vimos, nos últimos dias, resquícios deste aparelhamento no Banco do
Nordeste, em sua carteira de microcrédito, por intermédio de uma ONG
que, graças ao novo presidente, será novamente licitada. Não convém
tampouco esquecer o aparelhamento estatal por sindicatos e movimentos
sociais que orbitavam em torno do partido. Tiveram eles grande apoio
financeiro e tolerância governamental em invasões de terras, que
desestabilizaram o campo brasileiro e lhe trouxeram enorme insegurança
jurídica. Em caso de vitória petista, seria esta velha realidade que
voltaria, com as bandeiras vermelhas tomando conta das empresas rurais e
das estradas? Seriam novamente a violência das invasões e o desrespeito
à propriedade privada?
São
questões não apenas pertinentes, mas que dizem respeito ao futuro do
País e ao Brasil que almejamos para nossos filhos e netos. Não há pessoa
que não sinta agruras e desencanto com a pandemia, a inflação, o
desemprego e, para muitos, a ausência de comida. A situação chega a ser
dramática, com a miséria escancarada nas sinaleiras, nas ruas e favelas.
A injustiça social brasileira, existente de há muito, se mostra de
forma alarmante. Uma candidatura que se preze deve dizer claramente o
que pretende fazer no que diz respeito à corrupção, à eficiência do
Estado, à luta contra a pandemia, à liberdade de mercado, ao
aparelhamento estatal e à busca incessante de igualdade de
oportunidades.
O silêncio não pode ser, aqui, a resposta.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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