Uma das disciplinas exige que os estudantes concordem em reconhecer que sua culpa pessoal é um ponto de partida útil para superar preconceitos inconscientes. Frank Furedi para a revista Oeste:
As
universidades costumavam reconhecer que sua missão era ensinar os
estudantes a pensar, em vez de instruí-los sobre o que pensar. Hoje em
dia, elas parecem ter esquecido essa distinção. Na verdade, as
universidades parecem considerar que seu papel é doutrinar os alunos com
ideias de culpa branca ou privilégio branco. Em vez de chamar isso de
ensino superior, vamos pensar em reeducação superior.
Em
muitos casos, os novos estudantes universitários têm pouca escolha além
de participar dos chamados treinamentos, que tentam modificar seus
comportamentos supostamente maus. Na Universidade de Kent, por exemplo, o
corpo discente teve de fazer um “curso de diversidade”, que argumenta
que usar roupas de segunda mão e falar palavrões podem ser exemplos de
“privilégio branco”. A disseminação de ideias tão frívolas está aliada
ao projeto de fazer os estudantes se sentirem culpados por ser brancos.
Um
dos exemplos mais insidiosos desse tipo de reforma das ideias pode ser
encontrado na Universidade de St. Andrews, que não permite que os
estudantes se matriculem se não “passarem” em diversos módulos
compulsórios sobre sustentabilidade, diversidade e consentimento — nos
quais eles precisam “concordar” com certas afirmações.
Um
módulo exige que os estudantes concordem em “reconhecer” que sua “culpa
pessoal é um ponto de partida útil para superar preconceitos
inconscientes”. Aqueles que não concordam recebem uma nota baixa. Se um
estudante dá muitas respostas erradas, ele ou ela são reprovados no
módulo e precisam refazê-lo.
Estudantes
sem dúvida aprendem bem rápido que os treinadores que oferecem esses
cursos não estão preparados para lidar com visões dissidentes, então
inevitavelmente acabam se censurando. Afinal, esses cursos são
elaborados para impor um conjunto de valores que não pode ser
questionado.
O
elemento de coerção nesses cursos obrigatórios viola o princípio da
liberdade acadêmica. A imposição de uma ideologia oficial pode ser
aceitável em um seminário católico ou uma madraça islâmica. Mas, se uma
instituição de ensino não permite que seus estudantes tirem suas
próprias conclusões sobre questões controversas, ela não pode, de
boa-fé, se considerar uma universidade livre.
Esses
cursos efetivamente funcionam como um instrumento de patrulhamento de
ideias. Ao se referir a eles como cursos de treinamento, a administração
tenta criar a impressão de que está oferecendo aos alunos fatos e
conhecimento objetivo. Mas não está. Boa parte do que é promovido sobre
questões de gênero, raça e assim por diante ainda está sendo fortemente
debatida. Esses cursos não são educativos — eles estão tentando forçar
os estudantes a se submeter a uma determinada política da casa.
Muitos
desses módulos existem há mais de uma década. Mas, se antes costumavam
ser voluntários, agora são tratados como obrigatórios.
Alguns
anos atrás, fiquei horrorizado ao descobrir que instituições de ensino
superior estavam forçando seus novos estudantes a fazer “aulas de
consentimento”. Em 2019, a Universities UK, o órgão que representa essas
instituições, relatou que algumas universidades estavam obrigando os
jovens a fazer aulas de consentimento on-line antes mesmo de se
matricularem em seus cursos. As universidades deixaram claro que, se os
alunos não cumprissem esse requisito, suas inscrições seriam canceladas.
Programas
de integração costumam se concentrar em questões práticas, como usar a
biblioteca e os laboratórios. Não é mais esse o caso. Hoje esses
programas têm como objetivo doutrinar os estudantes, fornecendo a eles a
visão de mundo oficial e aprovada pelos especialistas.
A
prática da reforma das ideias e da reeducação foi historicamente usada
pelo Partido Comunista Chinês para livrar a sociedade de sentimentos
reacionários e arcaicos. Um impulso semelhante motiva os defensores do
“treinamento” obrigatório nos campi hoje em dia. O objetivo é livrar os
jovens de perspectivas e atitudes “antiquadas” das comunidades em que
cresceram.
Claro,
essa reforma das ideias nas universidades britânicas prefere maneiras
sutis de coerção, em vez do terror e da força violenta da Revolução
Cultural. Portanto, ela pode ser combatida e desafiada sem colocar a
vida de ninguém em risco ou enfrentar uma reação violenta. O perigo, no
entanto, é que a reforma das ideias nos campi de hoje se torne mais
coercitiva no futuro. O momento de confrontar e expor esse projeto
insidioso é agora, antes que seja tarde demais.
Frank Furedi é professor emérito de Sociologia na Universidade de Kent, na Inglaterra.
100
Years of Identity Crisis: Culture War Over Socialisation, o mais
recente livro de Frank Furedi, foi publicado pela De Gruyter, em 2021
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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