O ano 2020 foi bastante parecido com 1968. Suas consequências para o futuro, contudo, ainda são motivo de debate entre historiadores. Victor David Hanson, em artigo publicado por Daily Signal e traduzido para a Gazeta:
O ano de 2020 foi chamado de “annus horribilis” —“o ano horrível". Os últimos dez meses certamente foram péssimos.
Mas
também foi assim em 1968, quanto Martin Luther King Jr. e Bobby Kennedy
foram assassinados. A Ofensiva Tet ganhou força na Guerra do Vietnã e
dividiu os Estados Unidos. Protestos raciais e pacifistas tomaram conta
das grandes cidades. Os manifestantes enfrentaram a polícia na Convenção
Nacional Democrata em Chicago. Um novo vírus, o H3N2 (a “gripe de Hong
Kong”) matou cerca de 100 mil norte-americanos.
Mas
um 2020 ainda pior testemunhou a epidemia de Covid-19 alcançar
proporções pandêmicas em março. Autoridades chinesas enganaram o mundo
quanto à origem da doença – sem pedi desculpas.
As
autoridades norte-americanas às vezes foram contraditórias ao declarar
as quarentenas com algo eficiente ou dispensável. O uso de máscaras foi
desestimulado e depois tornado obrigatório. Os pesquisadores não sabiam
como o vírus se espalhava, somente que ele podia ser mortal para pessoas
com mais de 65 anos e com comorbidades.
As
previsões iniciais de que de 1 a 2 milhões de norte-americanos
morreriam de Covid-19 levou pânico à população. Mas informações de que a
mortalidade não chegaria a 100 mil pessoas a deixou falsamente
tranquilizada.
Em
abril, uma economia historicamente próspera entrou abruptamente em
recessão. Boa parte do país entrou em quarentena com a teoria de se
“achatar a curva” de infecção por três ou quatro semanas.
Mas
em vez disso as semanas viraram meses. Em pouco tempo, muitas pessoas
passaram a acreditar que a destruição econômica e o dano emocional dos
lockdowns acabariam por se revelar piores do que o vírus.
Em
junho, protestos inicialmente pacíficos pela morte de George Floyd nas
mãos da política de Minneapolis se tornaram violentos em algumas
cidades. Durante parte do verão e outono, algumas importantes cidades
testemunhariam protestos, saques e incêndios diários, enquanto antifas e
manifestantes do grupo Black Lives Matter sequestravam a revolta
nacional contra a morte de Floyd.
O
medo de se infectar, a preocupação com a situação financeira, a
ansiedade quanto a sair de casa à noite, a frustação com as semanas de
isolamento forçado e o cansaço de uma campanha eleitoral pesada – tudo
isso fez com que os norte-americanos ficassem mal-humorados às vésperas
de uma eleição essencial.
A
eleição presidencial de 2020 provou ser tão revolucionária quanto as
quarentenas. A transição nacional para níveis inéditos de voto pelo
correio pôs em xeque a capacidade dos estados de contabilizar eficiente
os votos, que não mais se enquadrava nos padrões de verificação das
eleições anteriores.
A
votação em massa, motivada em parte pela quantidade de votos pelo
correio, entusiasmou os democratas, mas ajudou a convencer os
republicanos de que havia fraude.
Depois
de semanas de discussão, Donald Trump perdeu no Colégio Eleitoral. Mas
os republicanos desafiaram as previsões dos especialistas e venceram
disputas fundamentais na Câmara e Senado. Analistas políticas se
perguntam se a esquerda ganhou ao eleger Joe Biden ou perdeu com um
resultado decepcionante nas eleições legislativas.
A
imprensa, os institutos de pesquisa e as autoridades do governo
ficaram, em geral, felizes com a derrota de Trump, mesmo que seu
partidarismo e tendenciosidade arruinassem suas reputações.
Pela
primeira vez na história norte-americana, por causa dos lockdowns e da
ressurgência invernal do vírus, muitas pessoas ficaram sem as festas
tradicionais de Thanksgiving ou Natal.
Em meio à morte, destruição e brigas, a história mostrará que os Estados Unidos não foram arruinados.
De
uma forma notável, pesquisadores criaram uma vacina segura contra a
Covid-19 em menos de um ano – um feito antes considerado impossível por
especialistas.
O
país entrou em recessão, mas evitou uma depressão. Isso se deu, em
parte, porque os Estados Unidos do começo de 2020 estava próspero e em
parte porque a administração Trump e o Congresso injetaram US$4 trilhões
de liquidez na economia inerte.
Apesar
de todas as acusações e contra-acusações de fraude e apesar de Trump
ser um mau perdedor, o ex-vice-presidente Joe Biden acabará por assumir o
cargo. E Donald Trump o deixará.
Ninguém
discute que a campanha e as eleições de 2020 foram anormais. Se elas
foram justas e legítimas é algo que será provavelmente avaliado
novamente nas eleições legislativas de 2022 e nas eleições gerais de
2024.
Até
lá, as pessoas terão tempo de digerir os acontecimentos bizarros deste
annus horribilis — e fazer as compensações devidas por meio do voto.
Apesar
de todos os problemas nos Estados Unidos, o mundo como um todo esteve
em situação pior. A China se orgulha de dizer que reagiu da melhor forma
a seu próprio vírus – mesmo diante do efeito dela para a população
mundial. A Europa não conseguiu combater a pandemia e viu sua economia
piorar.
Mais importante, à medida que o ano termina, há um trecho de céu azul em meio às nuvens carregadas.
O
Oriente Médio está prestes a alcançar uma paz histórica. O mundo agora
se volta contra o mercantilismo chinês. A fronteira sul dos EUA está
mais segura. A entrada de imigrantes ilegais caiu para níveis
insignificantes. As estratégias que deram origem a um boom econômico de
três anos só precisam ser usadas novamente em 2021.
Em
meio à morte e destruição, talvez um dia os historiadores concluirão
que o que não matou os Estados Unidos em 2020 só os tornou mais fortes.
Victor Davis Hanson é classicista e historiador do Hoover Institution em Stanford.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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