Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais desta quarta-feira:
Hoje é o Dia da Confraternização Universal – mas, verdade seja dita,
não muda nada. As coisas boas continuam boas, as coisas más continuam
más.
Comecemos com o criador de gado Salazar Barreiros Jr., de Cascavel,
no Paraná. Ele dá a receita de ganhar dinheiro com boi, agora que a
carne subiu. Compre uma vaquinha de oito meses e garanta seu sustento
até 24 meses – com pasto, vacinas e vermífugos, sal mineral, cuidado
diário. Então compre um bom touro ou pague inseminação artificial. Se
ela ficar grávida (o que nem sempre acontece), gaste por mais nove
meses, até que nasça o bezerro. Pague tudo, agora para os dois animais,
por mais oito meses. Se for fêmea, comece de novo. Se for macho, deve
engordar por 22 meses, até ficar no ponto para ser vendido. É seu
dinheiro saindo e nada entrando por 55 meses.
Quem compra? Um problema: com o seu, o meu, o nosso dinheiro, o BNDES
financiou grandes frigoríficos, que compraram e fecharam concorrentes
em todo o país e que hoje dominam o mercado e fazem o preço. O boi é que
está à venda, mas é o seu couro, caro produtor novato, que vão querer
tirar.
E por que a carne no varejo subiu tanto? Bom, há o lucro do varejista
– os grandes supermercados, como os grandes frigoríficos, mandam no
preço. Há o lucro dos frigoríficos – que precisam fazer caixa porque
talvez, um dia, chegue a hora de pagar os empréstimos do Governo. Tudo
pode acontecer.
Enfim, caro leitor, ainda pensa em ganhar dinheiro fácil criando boi?
Não ganha, mas paga
Crise? Que crise? Embora o país esteja ensaiando apenas agora a volta
ao crescimento econômico, os impostos que pagamos vão bem, obrigado, e
até subiram muito. O Impostômetro da Associação Comercial de São Paulo
mostra que, até as 8h35 da manhã de ontem, pagamos no total R$ 2,5
trilhões em impostos, taxas e contribuições. Taparam a boca dos
pessimistas que, em 2018, diziam que pior do que estava não poderia
ficar. Poderia, sim: o total de 2018 foi fartamente superado.
Nenhum salário subiu tanto quanto o volume dos impostos. E ainda garantem que é preciso criar impostos novos.
Onde é fácil ganhar
Há um setor da economia (e da política) onde o dinheiro é abundante e
fácil. Crie um partido político e, com um pouco de jogo de cintura, vai
viver dele por muitos e muitos anos. Muita gente já descobriu a
profissão de líder partidário: o Brasil tem hoje 110 partidos, dos quais
33 registrados. Outros 77 já foram fundados e estão com tudo pronto
para obter registro no TSE – e não está na lista, porque ainda não
preencheu todos os requisitos, a Aliança que vem sendo organizada pela
família do presidente Bolsonaro.
É um mar de dinheiro: o Fundo Partidário, em 2019, abasteceu os
partidos com R$ 888,4 milhões. Em 2020, fora o Fundo Partidário, os
partidos terão direito a R$ 2 bilhões para gastar na campanha eleitoral
para prefeitos e vereadores. E lamba os beiços: os partidos queriam
tirar dinheiro da Educação e da Saúde para destiná-lo às suas campanhas –
seriam R$ 3,8 bilhões. Houve tantos protestos que Suas Excelências se
contentaram com R$ 2 bilhões, como se fossem uma ninharia. É tanto
dinheiro que o presidente da República, que se elegeu pelo PSL, preferiu
sair do partido e organizar outro, cujo caixa esteja em mãos que
considera mais confiáveis.
Há alguns anos, quando as verbas, embora já excessivas, não eram tão
fartas, este colunista ouviu um dirigente partidário se queixar “da
merreca” que recebia para cuidar da legenda: eram só R$ 100 mil por mês.
A legenda jamais cresceu, mas o dirigente vive bem.
Amigos de fé
Há muitos anos, na época daquela ditadura militar que hoje dizem que
não existiu (mas como doeu!), corria uma piada: quem denunciasse um
comunista ganharia um Fusca, quem denunciasse dois comunistas ganharia
um Fusca e um apartamento, quem denunciasse três comunistas seria preso,
por conhecer comunistas demais. As críticas que se fazem ao presidente
Bolsonaro e a seus três filhos por ligação com milicianos não mostraram,
até agora, sinais de conluio criminoso – mas não há dúvida de que
conhecem grande quantidade de milicianos.
De acordo com a revista Piauí, Flávio Bolsonaro, como deputado
estadual, prestou homenagem a 23 policiais, réus ou condenados por
diversos crimes (homenageou também outros policiais sem envolvimento com
milícias). Um deles é apontado como participante do assassínio da
vereadora Marielle Franco. É provável que Flávio não soubesse de nenhum
envolvimento estranho de seus amigos – mas a quantidade de milicianos
que ele e seus parentes conhecem não deixa de impressionar.
Descongraçamento
Hoje, Dia do Congraçamento Universal, é uma boa data para apostar com
quem o presidente e seus filhos vão brigar de agora em diante. Só
brigam com grandes amigos: Gustavo Bebbiano, coordenador da campanha,
Paulo Marinho, articulador da campanha pela Internet, Alexandre Frota,
Joice, Major Olímpio. Quem será o próximo a brigar com os zeros à
esquerda?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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