Baile funk - Seu principal derivado, o estupro coletivo de garotas menores de idade, tornou-se símbolo de orgulho do “morro” |
A intervenção do
Exército no Rio de Janeiro, em mais uma tentativa de combater a ocupação
armada da cidade pelos criminosos, recebeu a aprovação de 80% da
população — é o que mostram os primeiros levantamentos feitos logo após a
chegada das tropas federais a esse pedaço do território brasileiro onde
o crime está em guerra aberta contra os cidadãos. Houve, naturalmente,
reações preocupadas por parte de muita gente — e não apenas da esquerda.
(Com aquele seu instinto que nunca falha na hora de ficar contra a
opinião da maioria, o PT e sua periferia, automaticamente,
escandalizaram-se com a intervenção. O que fizeram é o que sempre fazem
quando se trata de escolher entre a criminalidade, que a seu ver toma
parte nas “lutas populares”, e a ordem pública, que consideram coisa de
“direita”: ficaram, de olhos fechados, a favor do crime.) Junto com a
reação habitual dos nossos revolucionários, veio o espanto apreensivo de
uma parte do Brasil “civilizado”. O apoio maciço à intervenção no Rio,
segundo dizem, mostraria uma angustiante e apressada inclinação do
brasileiro a acreditar que os militares são “a solução” para tudo —
crime, corrupção, incompetência e todas as demais taras do Estado e da
sociedade no Brasil. Seria uma expectativa ruim, mesmo porque é
impossível de ser atendida.
Não dá para medir com
exatidão se os brasileiros acreditam mesmo em soluções militares. Mas,
com certeza, uma população que há muito tempo não tem o mínimo motivo
para levar a sério o governo, é insultada abertamente pelas decisões de
um Supremo Tribunal Federal que presta vassalagem a condenados por
corrupção e é tratada como débil mental pelo pior conjunto de deputados e
senadores hoje presentes sobre a face da Terra não poderia mesmo pensar
como se estivesse vivendo na Inglaterra. Que raio se pretende, então,
que as pessoas achem? Está cada vez mais difícil para o cidadão, e daqui
a pouco pode tornar-se impossível, ficar a sós — vendo em silêncio os
seus direitos mais básicos ser violados pelos criminosos, com a proteção
de leis feitas para atender aos interesses de bandidos e seus
defensores. Salvo os próprios criminosos à mão armada, as quadrilhas que
roubam o Erário e o resto dos marginais em circulação por aí, ninguém
pode permanecer calmo enquanto o sistema judiciário, a partir de seu
degrau mais alto, solta sistematicamente quem deveria estar preso ou
mantém fora da prisão quem foi condenado e deveria estar lá dentro. Para
a população brasileira, no fim das contas, a situação criada no país é
simplesmente incompreensível. “Volta dos militares” para consertar isso?
Todo mundo está no direito de achar que se trata da pior opção, mesmo
porque é o tipo da coisa que tem tudo para dar errado. Mas é inútil
esconder que todo mundo também está no direito de achar exatamente o
contrário. Na verdade, há um número cada vez maior de motivos concretos
para pensar assim.
O que querem,
sinceramente, que o cidadão pense quando vê uma assassina que ajudou a
matar o próprio pai a golpes de barra de ferro ser solta, com o apoio
enfurecido do Ministério Público, para passar fora da prisão o Dia dos
Pais — justamente o Dia dos Pais? É a lei, dizem advogados, promotores e
juízes — mas não lhes passa pela cabeça que uma coisa dessas está acima
do entendimento de qualquer ser humano deste planeta. O recado que dão é
o seguinte: se a lei é demente, problema seu. Obedeça e cale a boca.
Como condenar alguém por sonhar com “os militares”, quando uma promotora
de Justiça, que é paga (com todos os “adicionais”) para nos defender
dos criminosos, diz que “bandido bom é bandido vivo, e com direitos”?
Concorde com a promotora, se quiser — mas não estranhe que alguém
discorde e um dia passe a achar que “o único jeito é chamar o Exército”.
Mais: é razoável esperar que alguém concorde, ou entenda, que um
homicida tenha o direito de cumprir apenas um sexto da pena a que foi
condenado? De vinte anos de cadeia, por exemplo, só cumpre três. Faz
sentido um negócio desses? Para que serve um Código Penal se ele é
anulado pelas leis de “progressão da pena”, regime semiaberto, prisão
domiciliar ou tornozeleira para ladrão que rouba o Tesouro Nacional?
A população
brasileira, na verdade, vem sendo provocada, cada vez mais, pelo crime e
por seus protetores. No Rio de Janeiro, os policiais continuam sendo
assassinados na média de um a cada três dias, e 90% das autoridades
acham isso perfeitamente normal. Cerca de 40% dos moradores não recebem
mais o correio, pois a entrega foi suspensa por causa dos ataques da
bandidagem. As seguradoras não aceitam mais fazer seguros para cargas
destinadas ao Rio. Se isso não é desafiar as pessoas e abrir a porta
para o desespero, o que seria, então? Os cidadãos, ainda por cima, são
humilhados diariamente pelo apoio público que os seus opressores recebem
da elite “civilizada”, da mídia, da Igreja Católica, e por aí afora.
Dizem, esses todos, que o grande problema do Rio de Janeiro não são os
crimes praticados contra a população, mas a morte de criminosos em
confrontos com a polícia. (Quando morrem em brigas entre si próprios não
há maiores comentários.) Ficam indignados com os “excessos da legítima
defesa”, e exigem mais rigor contra quem usa a força para defender sua
propriedade e sua vida dos ataques de bandidos.
Que provocação maior
se poderia fazer às pessoas do que o estímulo aos bailes funk e a seu
principal derivado, o estupro coletivo de garotas menores de idade?
Tornou-se um símbolo de orgulho “do morro”, e de seus admiradores do
Leblon, a “tábua do sexo” — um banco de madeira onde os homens ficam
sentados nos bailes, enquanto meninas de até 12 anos de idade se
ajoelham sobre suas coxas para fazer sexo, em público, com o maior
número possível de machos. São chamadas de “preparadas”; as que já têm
“dono”, e por isso não participam, são as “cachorras”. Há garotas que
ficam grávidas — seus bebês são os “filhos da tábua”. A polícia,
obviamente, está proibida de entrar. Os formadores de opinião consideram
que isso seria um ato de repressão contra o “lazer popular”. Nenhuma
feminista, até hoje, abriu o bico para fazer alguma objeção à prática
desses crimes em massa contra a mulher — sexo com menores de 14 anos é
estupro, haja ou não consentimento da vítima. Os grandes astros do funk,
que animam os bailes da “tábua” e pregam a favor do crime nas letras de
sua música, têm circulação triunfal nos programas de variedades da Rede
Globo; dão entrevistas à imprensa e são bajulados pelas classes
intelectuais. A ideia-mãe é a seguinte: tudo isso forma hoje o que seria
uma nova manifestação cultural, a chamada “cultura da comunidade”. Ela é
sagrada. Não pode sofrer a mínima restrição. Qualquer crítica é
“preconceito” da “elite branca”.
O que há de estranho,
diante de tudo isso e muito mais, no fato de 80% da população aprovar a
intervenção militar no Rio? O mundo descrito acima não é normal, nem
desejável, para a imensa maioria, por mais que a “esquerda” insista em
dizer o contrário. Não é normal em nenhuma outra cidade do Brasil. Por
que seria aceitável no Rio? A chance de dar certo é zero.
Publicado em VEJA de 28 de fevereiro de 2018, edição nº 2571
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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