J. Nêumanne acerta ao
dizer que o Brasil vive um sério problema de segurança nacional. A
questão, ressalta o articulista do Estadão, é que o presidente Temer e
seu secretário de Segurança, Alexandre Morais, "voam como baratas
tontas", enquanto os governadores, a Justiça e o Congresso não ajudam em
nada:
O Estado brasileiro
está sendo posto contra a parede: ou intervém e ocupa o sistema
presidiário ou abre mão de controle e poder sobre parte do território do
País. Não se trata mais de um caso de segurança pública, mas de defesa
nacional.
Documentos e
conversas interceptadas pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério
Público (MP) revelam a facilidade com que uma das 27 facções criminosas
em guerra nos presídios, o Primeiro Comando da Capital (PCC), vem
conseguindo celulares e ordenando crimes dentro de presídios em Roraima
desde 2014. Então, a Operação Weak Link, da PF, devassou-a no Estado.
Além disso, exige a saída de rivais da cadeia – o que teria motivado a
fuga de pelo menos 145 detentos. Investigadores do combate ao crime
organizado acompanham o crescimento do PCC em Roraima há pelo menos
cinco anos. Isso é pouco?
A notícia, publicada
no Estadão, revela que a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
Cármen Lúcia, tem toda a razão em pedir ajuda do Poder Executivo para
que se faça um censo carcerário urgente e indispensável, capaz de contar
quantos presos há de fato. Ela foi avisada pelo presidente do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Paulo Rabello de Castro,
de que os dados que têm sido citados não são confiáveis. De fato, urge
revelar quem está preso e por quê. Em seguida, reassumir o comando sobre
as celas. Para tanto, antes de construir novos presídios e bloquear
celulares nas cadeias, será necessário recriar um órgão de inteligência
decente, inexistente desde o desmonte do Serviço Nacional de Informações
(SNI) promovido por Collor. E com agentes infiltrados nos presídios.
Sem isso não dá para saber o que na realidade acontece nas prisões nem
como são planejadas e executadas tais carnificinas.
Dominadas pelo crime,
as penitenciárias estão fora da lei. O preso precisa voltar a ser
tratado como indivíduo, e não como membro de um bando ou quadrilha em
luta dentro do presídio. Se a lei não for imposta, o Estado perderá essa
guerra.
Infelizmente, o voo
de baratas tontas dos mandachuvas do Executivo sobre a barbárie reinante
nas penitenciárias Anísio Jobim, Monte Cristo, Pedrinhas e muitas
outras em territórios sob sua jurisdição impede que o governo federal
sequer pareça ter percebido o que, de fato, acontece. O presidente
Michel Temer levou quatro dias para falar da tragédia em Manaus e quando
falou cuspiu no bom senso anunciando “solidariedade governamental” para
evitar mais um “acidente pavoroso”. Diante de cabeças decepadas e
exibidas ao mundo estarrecido, reagiu como se estivesse comentando a
nuvem tóxica de Cubatão ou as tempestades de verão que desabaram no Rio
Grande do Sul na semana passada.
Em vez de acompanhar
Cármen Lúcia em Manaus, onde ela se reuniu com desembargadores, juízes e
procuradores, Temer recusou-se a deixar Brasília, como se tivesse medo
de enfrentar a dura realidade que o esperava nas celas do Compaj. A
menos de uma semana do primeiro massacre, Temer foi a Esteio (RS)
entregar ambulâncias e a Lisboa para o enterro de Mário Soares. Sem
antes repreender seu amigo ministro da Justiça, que deu seguidas provas
de incapacidade de exercer o cargo. Alexandre de Moraes foi ao Amazonas e
repetiu seu mantra de ex-secretário de Segurança de Alckmin, segundo
quem a imprensa exagera a importância e o poder de fogo das facções
criminosas.
A reação de Moraes ao
massacre na penitenciária agrícola de Roraima foi ainda mais patética.
Ele desmentiu a governadora Suely Campos, que disse ter-lhe pedido ajuda
para evitar a tragédia, em ofício de novembro. Exposto, o documento
desmentia seu desmentido e ele tergiversou, argumentando que ela não
teria especificado o sistema prisional. Diante da exibição pública de
seu novo engano, reconheceu o erro crasso e seguiu em frente. Não pediu
desculpas nem seu chefe o repreendeu pelas falhas.
Com seu plano
nacional de paliativos repetitivos, Moraes desafia o lugar-comum de que
tal tema é dever constitucional de Estados, e não da União. O
ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto e o constitucionalista Oscar
Vilhena argumentam que o problema deve ser encarado por governo federal e
Estados em conjunto. O relevante agora é construir um pacto federativo
que atenda ao interesse maior da sociedade: paz nas celas e nas ruas.
A Justiça também
teria de aderir a esse pacto, propondo-se a fazer muito mais até do que
Cármen Lúcia tem feito até agora. Desocupar prisões superlotadas com
condenados que não pagaram pensão alimentícia aos filhos – providência
tomada em Roraima, abrindo 161 vagas – devia ser uma espécie de ponto de
partida para a Justiça participar do mutirão nacional pela retomada do
poder nas cadeias.
Juízes e promotores
devem à sociedade a obrigação de fiscalizar os presídios. E, além disso,
perdem completamente a autoridade de exigir medidas contra a corrupção
por não apoiarem o Legislativo em mudanças do Estatuto da Magistratura,
mercê do qual a desembargadora Encarnação das Graças Salgado, acusada
pela PF de prestar serviços à Família do Norte, está recebendo R$ 65 mil
de proventos mensais. E não sofreu punição alguma. Urge combater a
corrupção de colarinho-branco. Mas promotores e juízes precisam
respeitar as mesmas leis, como os cidadãos que eles acusam e julgam.
O Congresso (em
recesso) deveria integrar esse mutirão para enfrentar este caos absurdo e
apavorante de degolas em cadeias e a omissão conivente dos juízes. Os
representantes do povo precisam cumprir o dever constitucional de
vistoriar presídios. E produzir leis para eliminar privilégios de juízes
e promotores que ganham acima do teto, além de punir quem vende
sentença ou presta serviços ao crime. Essa omissão é grave falha de
responsabilidade. O Congresso só se ocupa dos próprios interesses
corporativos e este é um imperdoável crime de lesa-pátria.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário