MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 22 de dezembro de 2013

Na Arábia Saudita, mulheres só podem estudar se um parente permitir


Governo saudita investiu no ensino de mulheres, mas leis ainda atrapalham.
Permissão para estudar e trabalhar ainda depende dos parentes homens.

Da Associated Press

Entrada da Universidade Princesa Nora, em Riyadh: liberdade de vestimentas só do lado de dentro (Foto: AP Photo)Na Universidade Princesa Nora, em Riad, a liberdade de vestimenta é só do lado de dentro (Foto: AP Photo)
Em seus campi só para mulheres, as estudantes de universidades da Arábia Saudita se libertam. Tênis da moda, blusas coloridas, uma infinidade de penteados. Algumas experimentam com luzes nos cabelos ou até tintura azul. As mais aventureiras também deixam o cabelo curto. Em suas bolsas, os livros didáticos são variados, mas um item é obrigatório: um vestido preto que vai até o chão no estilo abava, de que cada uma delas precisa para se cobrir na hora de sair dos portões da universidade e voltar ao mundo externo.

A Arábia Saudita gasta bilhões de dólares para melhorar a educação de mulheres, como parte de um incentivo maior para melhor preparar os jovens sauditas para o mercado de trabalho. Isso quer dizer campi reformados, melhores estruturas e programas de pesquisa e uma pequena expansão no currículo para mulheres.
Fora da universidade, mulheres devem usar roupa que cobre todo o corpo (Foto: Aya Batrawy/AP)Fora da universidade, mulheres devem usar roupa
que cobre todo o corpo (Foto: Aya Batrawy/AP)
Durante anos, o Rei Abdullah tem tomado ações estarrecedoras para reduzir as restrições que afetam mulheres no reino, onde a palavra dos clérigos Wahhabi, rígidos e ultraconservadores, é praticamente lei. Mas um olhar dentro das universidades femininas que surgiram nas últimas décadas ilustra como a mudança só aconteceu até certo ponto.

Dentro do campus –um mundo estritamente de alunas, professoras e funcionárias– as mulheres têm algumas liberdades maiores. Mas fora deles, elas permanecem atadas a uma rede de costumes e rigidez religiosa. As mulheres são mantidas segregadas dos homens, barradas de direitos simples como dirigir e obrigadas a aderir um código de vestimenta estrito que geralmente requer que elas cubram os cabelos e o rosto com um véu negro. Elas são controladas pelas vontades de seus parentes homens, e precisam da permissão deles para trabalhar, ir à escola e viajar dentro das “leis de guarda”.

Por causa dessas restrições, segundo as ativistas dos direitos das mulheres, a tentativa do rei de modernizar a nação rica em petróleo sempre fracassará.

"Não importa o que aconteça, as mulheres ainda estão presas pelas leis de guarda dos homens e normas culturais rígidas”, afirmou Aziza Yousef, professora da Universidade Rei Saud, para mulheres. “Se você tiver sorte e seu guardião for bom, você poderá avançar na vida sem problemas. Se você está em uma família onde o guardião for rígido, sua vida será paralisada."
Professoras são maioria
As mulheres também sofrem com oportunidades de trabalho limitadas depois de se formarem na universidade. A participação feminina no mercado de trabalho é mínima, parcialmente por causa dos requisitos e tradições de segregação que incentiva as mulheres a focarem em casar e ter filhos.
Apesar de as meninas representarem 58% do total de estudantes de graduação, ou cerca de 474 mil alunas, as mulheres ocupam apenas um terço dos empregos no setor público, e no privado a porcentagem de funcionárias mulheres não passa de dois dígitos.
Na Grande Mesquita, em Mecca, uma barreira separa mulheres e homens (Foto: AP Photo/Aya Batrawy)Na Grande Mesquita, em Mecca, uma barreira
separa mulheres e homens
(Foto: AP Photo/Aya Batrawy)
O incentivo educacional alimenta as ambições das jovens sauditas, mas ainda lutam para navegar em possibilidades limitadas.

"Quero ser independente e trabalhar antes de casar", disse Shaden el-Hamdan, uma estudante de graduação em inglês de 22 anos da Universidade Islâmica Imam Mohammed bin Saud, de Riyadh. Ela tem sorte porque sua família não a pressiona a se casar –seu pai a diz para esperar outros seis anos antes de pensar nisso.

Mas ela diz saber que conseguir um emprego é difícil. Ela não quer ser professora, profissional de cerca de 78% das mulheres que trabalham. Então ela fala sobre tentar um cargo em alguma corporação multinacional operando no reino. Se não conseguir, ela permanecerá na universidade, fazendo um mestrado.

A inspeção no ensino de mulheres na última década tem sido significante. Antigamente, as faculdades para mulheres eram supervisionadas pelo Departamento de Direcionamento Religioso, o que colocava as mulheres sob o poder direto dos clérigos. Em 2002, elas foram transferidas para o Ministério da Educação, que supervisiona o ensino masculino. Cinco anos depois, a primeira universidade apenas para mulheres foi criada: a Universidade Pricesa Nora, em Riad.

Em 2009 foi aberta a primeira universidade mista do país, a Universidade Rei Abdullah de Ciência e Tecnologia. Foi uma mostra de desafio do rei contra os ultraconservadores do país, apesar de seu poder ter apoio parcial neles. Quando um clérigo proeminente do governo criticou a universidade, o rei o demitiu. Ainda assim, ela ainda é a única instituição onde homens e mulheres assistem às aulas juntos.

A Universidade Princesa Nora representa o foco do reino em manter o ensino de mulheres separado –e mostra o contraste mais visível entre o campus e a vida nas ruas.

Em 2011, um novo campus foi inaugurado para acomodar até 50 mil alunas. Com um novíssimo hospital e uma biblioteca de arquitetura estonteante, ele se gaba de um complexo de esportes moderno, com piscina, academia, pista de atletismo indoor e campos de futebol, uma grande mudança para um país onde o atletismo de mulheres sempre foi visto com maus olhos.
Cartaz mostra vestimenta permitida às mulheres sauditas (Foto: AP Photo)Cartaz mostra vestimenta permitida às mulheres
sauditas (Foto: AP Photo)
'Gaiola dourada'
Um tipo de decoração arabesca em vidro, chamado de mashrabiyas, dá privacidade às janelas, e passarelas de pedestres fechadas e quatro linhas de metrô transportam as meninas pelo campus de 8 mil hectares, fazendo com que elas nunca sejam vistas por motoristas homens e pela polícia do campus fora dos prédios.

Muitas jovens alunos silenciosamente descrevem a construção como uma 'gaiola dourada'.
"O campus em si e os prédios são ótimos, mas as professores não são muito fortes", diz a aluna Nada el-Agmy, de 20 anos. "Sinto como se estivesse aprendendo coisas que já sei."
Apesar de oferecer alguns cursos de ciências e negócios, são os diplomas de licenciatura e economia doméstica que são incentivados como profissões consideradas femininas. Na livraria do campus, um texto sobre o Islã descansa ao lado de um livro que fala sobre "como pensar como um homem de negócios".

O currículo para as mulheres segue limitado. Nenhuma universidade oferece diplomas de engenharia para elas, e muitos cursos são voltados a campos tradicionais como enfermagem e pedagogia. Como os clérigos se opõem a ver mulheres nas profissões de apresentadoras de telejornais, diplomas de jornalismo e comunicações são raros –a Universidade Rei Saud, em Riad, por exemplo, só começou a oferecer um curso nessa área para mulheres neste ano.

Educação voltada ao trabalho
No fim, dar mais direitos às mulheres não é o objetivo: a prioridade para a supervisão ambiciosa da qualidade da educação para homens e mulheres é para reduzir o número de sauditas dependentes da generosa ajuda previdenciária financiada pelas riquezas de petróleo do país e empurrá-los ao mercado de trabalho, especialmente fora do setor petrolífera.

Quase um terço da população do reino tem menos de 15 anos, e mais da metade ainda não chegou aos 25. O Fundo Monetário Internacional (FMI) afirma que, em toda a região do Golfo Árabe, estima-se que um milhão de novos trabalhadores na força de trabalho poderão ficar sem emprego até 2018 se o setor privado não se expandir.

O desemprego na Arábia Saudita está estimado em 12%. Mas os trabalhadores estrangeiros dominam os empregos no setor privado, onde só 10% dos empregados são cidadãos sauditas. Os sauditas preferem trabalhar no setor público, onde benefícios lucrativos são garantidos.

Os gastos com educação somam mais de um quarto do orçamento do governo, de US$ 45 milhões em 2012 (cerca de R$ 104 milhões), segundo o Grupo de Negócios Oxford. O dinheiro foi alocado nos últimos dois anos em 1.300 novas escolas, incluindo universidades e faculdades.

Mas o ensino é estritamente ligado ao mercado de trabalho. Há poucos cursos políticos. "Existe uma grande diferença entre força de trabalho e direitos. Eles precisam de professores e preencher cargos, não precisam de cientistas políticos e tomadores de decisão", disse Aziza Yousef, da Universidade Rei Saud.

E, para as mulheres, "a educação em si não vai mudar as coisas", disse ela, afirmando que as mulheres precisam ser educadas em uma cultura garantidora de direitos. "Elas podem ter um PhD, mas não saber quais são seus direitos."
Na Universidade Princesa Nora, em Riyadh, alunas precisam usar uma passarela para andar pelo campus sem ser vistas por motoristas (Foto: AP Photo)Na Universidade Princesa Nora, em Riyadh, alunas precisam usar uma passarela para andar pelo campus sem ser vistas por motoristas (Foto: AP Photo)

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