BLOG ORLANDO TAMBOSI
O tirano venezuelano responde com agressividade a notas cautelosíssimas de “preocupação” - é para valer ou foi tudo combinado? Vilma Gryzinski:
Nicolás
Maduro quer briga. Ou quer parecer que está brigando contra
“intervencionistas” vizinhos – justamente os mais amáveis e gentis
diante dos abusos que precedem a farsa eleitoral de 28 de julho.
“Quem
vier opinar e se imiscuir nos assuntos internos da Venezuela receberá
sua pancada. Chame-se União Europeia, da direita, a esquerda covarde,
pancada pura”.
Ele
também reclamou que ninguém condenou o que apresenta como conspirações e
terrorismo da oposição, sua mais recente encenação. “Calam-se os
governos de direita, e a esquerda covarde. Não são capazes de condenar
os golpes contra a paz e a revolução”.
Brasil
e Colômbia, através de seus serviços diplomáticos, haviam manifestado
“preocupação” depois da proibição da substituta de última hora e xará de
María Corina Machado, Corina Yoris, uma professora de filosofia de 80
anos que, obviamente, não tem o carisma da líder oposicionista cassada.
Mesmo assim, sua candidatura tampão pela Plataforma Unitária Democrática
não pode ser protocolada no sistema.
Perseguir,
proscrever e prender potenciais oposicionistas é uma prática consagrada
pelo madurismo, mas até pelos padrões absurdamente tolerantes dos
governos amigos de Lula da Silva e Gustavo Petro parece que foi demais.
As
declarações de ambos os países, tão cheias de dedos, foram igualmente
taxadas de atos de ingerência que parecem “ter sido ditados pelo
Departamento de Estado”. Uma acusação ridícula, mas Maduro evidentemente
não tem a menor preocupação em evitar esse tipo de característica.
Militar assassinado
As
investidas contra aliados de esquerda repetem, embora em tom não tão
exacerbado, a saraivada de ataques que a Venezuela normalmente faz
contra Gabriel Boric, o presidente chileno também proveniente da extrema
esquerda, mas pioneiro nas críticas aos abusos de Maduro e companhia.
Quando dois colaboradores de María Corina foram presos, o governo Boric
manteve a mesma linha e manifestou “firme condenação diante da detenção
arbitrária de representantes de partidos políticos de oposição”.
Em
tom muito mais categórico do que o dos diplomatas brasileiros e
colombianos, a nota chilena dizia o óbvio: a prisão de oposicionistas
“afeta seriamente a realização de eleições presidenciais democráticas,
transparentes e livres, com participação plena de todos os candidatos e
candidatas, contrariando os Acordos de Barbados endossados pela
comunidade internacional”.
Maduro
obviamente rasga todos os dias os acordos assinados em outubro do ano
passado, com suspensão de sanções dos Estados Unidos em troca de
compromissos como a realização de eleições legítimas.
O
Chile tem um problema adicional: lidar com o sequestro, assassinato por
asfixia e ocultação do corpo numa mala enterrada sob laje de concreto
de Ronald Ojeda, um ex-militar venezuelano que conseguiu fugir da cadeia
e pedir asilo político no país. O sequestro foi filmado por câmeras de
segurança e atribuído a delinquentes do Trem de Arágua (ou bonde, como
se diria no Brasil), uma grande organização criminosa da Venezuela. O
crime espalhou medo entre asilados venezuelanos, inclusive no Brasil.
‘Jogo dos americanos’
As
esquerdas tradicionalmente têm enorme dificuldade para fazer
autocrítica e, na América Latina, são contaminadas pelo antiamericanismo
infantil. Acham, no caso dos que são dominados pela doutrina e não
pelos princípios, que criticar a Venezuela é fazer o “jogo dos
americanos”.
Na
verdade, é o oposto: a existência de um regime como o venezuelano, que
multiplicou a miséria e a imigração em massa, é a melhor propaganda
contra a esquerda que existe. Até as pessoas menos interessadas em
acontecimentos políticos sabem que a Venezuela é um desastre e não
querem ter nada a ver com ele.
Manual do autoritarismo
Quem
acreditou nos Acordos de Barbados passou vexame. Maduro vai ganhar a
eleição sem concorrentes reais e dar risada da cara dos aliados a quem
chama hoje de capachos dos Estados Unidos. É um show que ele sabe
protagonizar muito bem e já está montando outra encenação: mandou
arrancar fusíveis e cortar a energia elétrica da embaixada argentina em
Caracas, onde seis oposicionistas pediram asilo.
Criar
inimigos externos é uma das jogadas mais consagradas do manual político
do autoritarismo. Ele já tentou fazer isso ameaçando engolir mais da
metade do território da Guiana, o chamado Essequibo e pode fazer de
novo.
Escreveu
Héctor Schamis no Infobae: “Maduro tem diante de si a ‘opção Daniel
Ortega’, com isolamento total e completa irracionalidade. Ou regressar a
2018, com uma eleição fraudulenta, sem reconhecimento internacional e
seguida de uma usurpação do poder, poder que não pode abandonar. Em
qualquer um dos dois casos, condenado a viver entre a solidão e o
delírio”.
Exceto,
naturalmente, se os amigos resolverem, como já fizeram tantas vezes,
fechar os olhos de novo e continuar tratando Maduro como “um dos
nossos”, em vez de se descontaminar de sua proximidade tóxica.
Postado há 3 days ago por Orlando Tambosi
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