BLOG ORLANDO TAMBOSI
Para as pessoas sãs, o que aconteceu a 10 de Março não tem história. Foi a decorrência normal de se viver numa democracia normal. Para os radicais, foi o início do apocalipse. Pobrezinhos. Por que motivo não ajustam a medicação e consultam os estudos científicos disponíveis? João Pereira Coutinho para a revista Sábado:
A
AD VENCEU AS ELEIÇÕES e recusou entendimentos com o Chega. Suspiros de
alívio? Longe disso. As vozes mais extremadas da esquerda já só veem o
fascismo ao virar da esquina e apelam, palavra de honra, à
“resistência”. “Resistência” a quê? Ao bom senso e ao sentido do
ridículo, naturalmente: entrincheiradas nos seus casulos, permanecem
despertas e à escuta, não vá uma marcha sobre Lisboa apanhá-las
desprevenidas.
Qualquer
especialista vê aqui sintomas de stress pós-traumático: estado de
alerta angustiante; pânico desproporcional; choro fácil. Para as pessoas
sãs, o que aconteceu a 10 de Março não tem história. Foi a decorrência
normal de se viver numa democracia normal. Para os radicais, foi o
início do apocalipse. Pobrezinhos. Por que motivo não ajustam a
medicação e consultam os estudos científicos disponíveis?
Um
deles, coordenado por Conceição Pequito, Manuel Meirinhos Martins e
Pedro Fonseca, intitulado 50 anos de Democracia em Portugal: Mudanças e
Continuidades Geracionais, começa por traçar a opinião que os
portugueses têm do 25 de Abril. A julgar pela histeria da esquerda, o
País inteiro, ou uma parte significativa dele, deseja um regresso
imediato a 1973.
Espantosamente,
não deseja: a maioria prefere viver em democracia por entender que a
revolução trouxe consequências mais positivas do que negativas (69%; só
7% pensam o contrário).
Mas
é entre os jovens, sobre quem se despejaram os mais vis impropérios por
causa das suas preferências eleitorais à direita, que a preferência
pela democracia é ainda mais expressiva. As consequências de Abril foram
mais positivas do que negativas para 73% dos inquiridos entre os 16 e
os 34 anos.
Querem ver que os únicos nostálgicos por 1973 são aqueles que ainda se imaginam a viver e a combater em 1973?
Mas
a ciência não fica por aqui. Num outro estudo, dirigido por Tiago
Fernandes para a Fundação Friedrich Ebert e subordinado ao título
Populismo em Portugal? Democracia, Migrações e Estado Social aos Olhos
dos Portugueses, os simpatizantes do Chega começam a ter um rosto
definido.
A
julgar pelos histéricos, falamos de carantonhas demoníacas, que cospem
fogo e comem criancinhas ao almoço (ao pequeno-almoço já sabemos quem se
encarrega do assunto).
Novamente,
estamos no território da alucinação: os simpatizantes do Chega têm um
perfil que os aproxima do eleitorado do centro e revelam-se menos
radicais do que a liderança do partido (por exemplo, no trato com os
imigrantes).
Aliás,
um dos dados mais notáveis do estudo está no facto de revelar que os
apoiantes do Chega são os que menos se interessam por política (21% não
querem saber do assunto; 31% querem saber pouco). Ricos fascistas,
estes, que negam à partida os imperativos da “politique d’abord”.
Se
votam, e desta vez votaram em quantidade, é porque são também os mais
descontentes com o funcionamento da democracia (77%) – uma cifra que,
longe de os envergonhar, devia envergonhar o partido que mais tempo
esteve no poder nos últimos 24 anos: o PS.
Não
admira que, segundo a Universidade Católica, tenha sido o PS o partido
que mais eleitorado perdeu para o Chega. Um caso clássico de clientela
insatisfeita com o serviço.
E
POR FALAR EM CLIENTELAS: percebo a frustração do PS. Na primeira parte
da legislatura, era preciso comer o pão que o diabo amassou – na função
pública, nas forças de segurança, nas escolas, nos hospitais. Mas
chegaria um momento, algures em 2024, em que o excedente orçamental
permitiria montar o palco para a grande boda eleitoral de 2025-2026.
Pois
bem: o momento chegou. Mas, para horror das tropas, não é o PS que vai
chefiar a comissão de festas. É a AD. Isto, de facto, dá cabo de
qualquer socialista: andámos nós a passar fome durante longos anos para
que sejam eles a engordar agora?
Eu
não seria tão drástico: falar de “cofres cheios” quando a dívida
pública anda nos 99,1% do PIB é outra alucinação. No fundo, é como
festejar o euromilhões só porque o saldo da conta corrente é positivo,
apesar de termos um crédito à habitação no banco que nos leva couro e
cabelo.
Postado há Yesterday por Orlando Tambosi
Nenhum comentário:
Postar um comentário