BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nada se diz de novo, mas pessoas que se mantém na moda em relação às ideias não sabem disso e zombam das ideias de meros dois anos atrás. A crônica de Alexandre Soares Silva para a Crusoé:
Já
foi, sem dúvida, uma profissão com a possibilidade do heróico – uma
profissão de homens de nervos de aço. Mas hoje os jornalistas são
historiadores do trivial. Devem crescer sonhando em cobrir revoluções e
acabam cobrindo aposentados defecando em prédios públicos.
No
momento, pelo menos, não há nada de grandioso acontecendo no Brasil, se
é que já houve; então são obrigados, com caras seriíssimas e vozes
impressionantemente solenes, a explicarem em detalhes que a Figura
Ridícula X importunou algum animal marinho desta maneira, note bem,
desta maneira e não daquela, ou que a Figura Ridícula Y correu pelas
matas segurando a mão direita de um famoso presidente francês nanico, e
não a esquerda.
“A
Figura Ridícula X saiu da Embaixada tal andando de moonwalking…
Atenção, segundo várias testemunhas ele saiu de moonwalking… As câmeras
de segurança não confirmam, mas segundo vários juristas, se isso for
verdade isso complica muito a sua situação…”
Isso
tudo para dizer que tenho pena dos jornalistas que vejo na tevê. Sempre
que vejo o jornal eles parecem exaustos, mal se segurando de pé ali no
meio da rua, com o microfoninho deles, olheiras fundas depois de várias
madrugadas seguindo meticulosamente os movimentos triviais de pessoas
triviais e pedindo a opinião de pessoas solenes e triviais sobre os
movimentos triviais, mas bem menos solenes, das pessoas triviais e nem
um pouco solenes que nos governam ou que nos governaram um dia. É,
agora, uma profissão triste.
*
Uma coisa que me irrita é a adoção, no campo das ideias, da mentalidade que se usa em relação a roupas.
Algumas
pessoas – sim, ALGUMAS PESSOAS (pigarreando) têm essa atitude de que
algumas ideias são cafonas, fora de moda, são ideias que só velhos têm,
como é o caso de praticamente todas as ideias de antes de outubro
passado.
Fulano
é contra identidade de gênero? Não está ao corrente, já eu sou bem
informado etc. As aceitáveis são as ideias desta estação, presumo. Saiba
como combinar as ideias deste outono com aquelas pecinhas que você já
tem na sua cabeça! Harry Styles vai a Cannes usando suas novas ideias de
outono!
Mas
isso é muito pior que usar as noções de moda e fora de moda falando
realmente de roupa e design, porque nessas áreas há revivals, você
estuda as modas de outras épocas, “faz releituras”, ou o que for, mas na
área das ideias essas pessoas só se permitem os revivals se não
souberem que é um revival.
Sim,
nada se diz de novo, todas as ideias cretinas que estamos vendo pulular
são reencarnações de heresias passadas – mas as pessoas que se mantém
na moda em relação às ideias não sabem disso e zombam das ideias de
meros dois anos atrás.
A
pior cafonice para alguns é soar como um velho. Mas soemos como velhos!
Sempre vou querer soar como um velho, inclusive velhos de outras
épocas. Idealmente eu sempre soaria como um velho de Bizâncio, ou no
máximo, no máximo, como um velho do Antigo Regime francês.
Mas
enfim. O pior velho é o velho que não quer soar como velho. Querer soar
jovem com o uso de roupas, gírias, peruca etc. já é um pouco ridículo,
mas com ideias é uma aberração da natureza. E só digo isso porque
ultimamente ando vendo muitos velhos de terno e gravata falando coisas
ridiculamente woke.
Meu
Deus do Céu, isso é pra jovem acreditar na sua fase imbecil de jovem.
Eu talvez fosse woke se tivesse dezessete anos. Talvez achasse mesmo que
um cara de peruca é uma mulher. Talvez eu mesmo quisesse cortar o meu
pênis com uma tesoura de cortar cartolina. Sei lá eu, loucuras de
juventude. Mas ver integrantes do governo, ministros, gente de cabelos
brancos, colocando pronomes nas bios, falando essas coisas woke a sério —
isso me faz perder todo o respeito que ainda tenho por gente que
trabalha de terno e gravata.
É
um respeito completamente sem sentido? Sim, é, a essa altura. Mas desde
pequeno via meu pai saindo para trabalhar de terno e gravata e isso
para mim virou um tremendo sinal de seriedade e adultice. De modo que
por favor, velhos woke do governo, não destruam minha última ilusão da
infância.
*
Ajuda, às vezes, imaginar o seu dia como um esporte sendo comentado ao vivo por comentadores que o tratam como uma lenda.
“Ele acordou… E já começou bem! O que acha, Lucas?”
“Pois
é, começou espetacularmente, Carlos. É a velha técnica do tocar o chão
primeiro com o pé esquerdo. Ele é um pioneiro dessa técnica, como os
espectadores que sempre nos acompanham aqui no programa sabem. Ele está
tão confiante que quer mostrar ao adversário que não precisa de boa
sorte.”
“Fantástico. O que ele está fazendo agora, Lucas?”
“Parece que está tirando mais um cochilo sentado na cama, Carlos. Demonstrando que está tranquilo.”
“A calma dos campeões.”
“Precisamente,
Carlos. Ele sabe que vai ter tempo depois pra fazer o que quer fazer,
não está impaciente. É um mestre do timing. Muitos grandes acordadores
estão copiando ele nisso.”
E assim por diante em cada etapa do dia:
“Que jato de urina extraordinário, Lucas. Vamos passar o replay”, etc. etc.
Postado há Yesterday por Orlando Tambosi
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