A
história do multiartista brasileiro queer, andrógino, negro e de
Candomblé que há décadas encanta Paris com sua arte, encerrou o
festival, ontem, 2 de junho
Robertinho,
um multiartista brasileiro queer, andrógino, negro e de Candomblé há
mais de três décadas encanta Paris com sua arte. Nascido em Santo Amaro
da Purificação (BA), Roberto Chaves é o protagonista do filme “Madeleine
à Paris”, de Liliane Mutti. É sob o olhar sensível da cineasta - que há
seis anos acompanha seus passos -, que o protagonista entra em cena
para contar sua história de resistência para o mundo todo. O filme terá
sua pré-estreia internacional no 26º Festival do Cinema Brasileiro,
ontem, 2 de junho, encerrando o evento que aconteceu no Cinema Utopia
Bordeaux.
“Madeleine
à Paris” é um filme que mostra as dificuldades e conquistas de um
imigrante latino na Europa, o sonho de um artista, os limites e as
superações da vida. As raízes transculturais tecem a trama que conta a
caminhada de Robertinho, entre luzes, cores e plumas. A história desse
personagem da vida real é mais do que um show, é um ato de resistência.
“Ver
minha própria vida nesse filme foi emocionante, uma redescoberta, onde
revivi momentos do passado que me trouxeram até aqui. É muito
gratificante ver os desafios e prazeres de tudo que passei, uma
experiência mágica poder contar isso em um filme”, destacou
Robertinho.
O
artista, que foi convidado para ir à Paris pela primeira vez quando
ainda era office boy no gabinete do então vereador de Salvador, GIlberto
Gil, é o idealizador da mais importante tradição afro-brasileira na
Europa, a “Lavagem de Madeleine”, que, há mais de duas décadas é símbolo
da cultura brasileira no país. O cortejo da “Lavagem de Madeleine”
acontece há 22 anos em Paris, inspirado na Lavagem do Senhor do Bonfim e
abre o calendário do verão europeu. A festividade começa na Praça da
República de Paris e vai até a Igreja da Madeleine, onde lava-se as
escadarias da igreja.
A
celebração reúne a cada ano cerca de 60 mil pessoas, seguindo o
trio-elétrico puxado por Carlinhos Brown e Roberto Chaves. Franceses,
brasileiras e brasileiros, pessoas de diferentes nacionalidades,
misturam-se nas ruas da capital francesa dançando ao ritmo dos
atabaques. A lavagem integra ainda, a Rota dos Escravizados da UNESCO.
No
filme, assistimos Robertinho como um orixá do cortejo da Lavagem e à
noite, a outra faceta, com sua fantasia e performance de arlequim, no
Cabaré Paradis Latin, onde começou a trabalhar há 33 anos. Em um
sincretismo rítmico, particular e singular, Robertinho circula entre o
tradicional catolicismo francês e sua origem de Axé, do recôncavo
baiano, de quem cresceu sob a guarda e benção de Dona Canô, mãe de
Caetano Veloso e Maria Bethânia. Entre uma edição da Lavagem e outra,
ele viaja ao Brasil em busca de suas raízes familiares e espirituais.
Suas vivências entre os dois países, entre o masculino e o feminino, o
sagrado e o profano, fazem do filme um profundo mergulho em busca da sua
identidade.
“Madeleine
à Paris é um road movie afro-queer entre Paris e Santo Amaro da
Purificação, na Bahia”, conta Liliane Mutti, que coloca as duas cidades
em diálogo no seu filme. “Essas duas cidades aparentemente tão opostas,
são co-protagonistas do longa. Viajar por Paris no olhar desse imigrante
ou pelo interior da Bahia na sua volta às raízes, nos dá a dimensão de
como o mundo é diverso e de que a arte carrega a potência de romper
fronteiras e inventar novos mundos possíveis”, destaca Liliane, que
também aposta que esse é um filme pós-colonial: “a festa também é lugar
de luta”.
O filme está previsto para chegar às telas dos cinemas brasileiros ainda em 2024,
com distribuição da Bretz Filmes (BR). A obra é uma realização da
produtora baiana Toca Filmes, com produção associada na França de
François Combin (Urubu Filmes). Dirigido por Liliane Mutti (“Miúcha, a
voz da Bossa Nova”; “Salut, mes ami.e.s !”; “Elle, Marielle Franco”), o
filme tem direção de fotografia de Daniel Zarvos, que também assina a
produção executiva, com narração do ator francês Christopher Ecobichon.
Foto: Daniel Zarvos
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