Escritor
paulistano autor do “Eu Só Existo às Terças-Feiras”, finalista da
premiação, dá vida a sua introspecção e, aos 29 anos, já apresenta uma
obra extensa e plural que inclui ficção, poesia e ensaios.
“Caio
em mim. Dessa vez, já é a segunda aula depois do intervalo. Cada dia,
menos tempo. Só me permito sentir tristeza por isso durante um único
minuto. Mas, pior do que isso, tenho uma intuição, um péssimo
pressentimento de que algo aconteceu. E as imagens que vou aos poucos
lembrando em sutis filetes do sonho com Quinta não servem para me
animar”
Trecho do livro (pág. 136)
Rodrigo Goldacker (@rodrigoldacker) escreve intensamente desde os doze anos. Em seu perfil no Medium
são mais de mil e quinhentos seguidores e uma centena de textos que
foram publicados desde 2016. Rodrigo é um dos cinco finalistas da
primeira edição do Prêmio Amazon de Literatura Jovem com a ficção “Eu Só Existo às Terças-Feiras”,
selecionado entre quase 700 livros. O vencedor do prêmio será anunciado
no dia 27 de maio. A obra, por ser finalista, está sendo adaptada para
audiobook.
“Eu Só Existo às Terças-feiras”
foi finalizado em outubro de 2017 e havia sido previamente inscrito no
Prêmio Kindle em 2022. Influenciado pelo processo de individuação,
conceito recorrente na obra do psiquiatra Carl Jung, o livro surgiu como
uma expansão de uma autobiografia escrita por Rodrigo em 2015.
“Praticamente impublicável” com conteúdo denso e mais de 150 mil
palavras, o autor transformou seus relatos em uma nova história a partir
de metáforas, algumas mais diretas, outras sutis, sobre um período
essencialmente marcado por processos de perda e adaptação mental.
O
romance psicológico desenvolve uma premissa curiosa e criativa enquanto
tece sua trama de suspense com constantes reviravoltas. Viktor é um
adolescente que cursa o colegial e há alguns anos lida com uma cisão de
personalidade. Em seu corpo habitam sete indivíduos distintos. Um para
cada dia da semana e é com a nomenclatura de cada período que os
fragmentos são batizados.
Quem
conta essa história é a personalidade que, como o título declara, só
existe às terças-feiras. Os leitores irão testemunhar as paranoias de um
narrador confuso, que precisa preencher as lacunas do que ocorre entre
cada “apagão” de uma semana – enquanto desvenda como agem e quais são as
intenções dos outros indivíduos que compõem Viktor. Em ritmo divertido,
uma conspiração (pessoal e) familiar se manifesta colocando em risco a
existência do protagonista, Terça.
Rodrigo
é filho de mãe bipolar e desde cedo precisou lidar com conflitos
familiares e algumas responsabilidades afetivas impostas pelas
circunstâncias. Assim, o interesse do autor pela psicologia para além da
curiosidade dá sinais perceptíveis em sua escrita. Ele carrega nas
costas uma bagagem não compatível com sua pouca idade. Os temas versados
em “Eu Só Existo às Terças-Feiras” incluem a condição humana, crises existenciais, famílias disfuncionais e a finitude da vida.
Escritor versátil e de obras plurais
Redator
que “vive das palavras”, Rodrigo é graduado em Publicidade e Propaganda
pela Faculdade Cásper Líbero. Seu currículo acadêmico apresenta ainda
uma especialização em UX Writing, pelo Instituto de Desenho Instrucional
e mestrado em Comunicação, também pela Cásper. É natural de São Paulo,
capital, e desde a infância já carregava certa convicção do que gostaria
de ser e do que fazer. “Sempre quis ser escritor e comecei a fazer isso
de um jeito bem obsessivo. Passei minha adolescência, juventude e vida
adulta todas escrevendo”, conta.
Suas
principais referências são cimentadas na filosofia do século XX.
“Albert Camus, Carl Jung e Judith Butler são três bases importantes para
mim em pensamento e que acabam aparecendo muito em tudo que escrevo,
principalmente nos ensaios, mas isso também ‘vaza’ para as poesias e
romances”, aponta. Ele ainda cita o porta-voz da geração beat, Jack
Kerouac, como uma referência para sua formação, e escritores como
Hermann Hesse, Roberto Bolaño, Haruki Murakami, Clarice Lispector,
Fernando Pessoa e Franz Kafka.
Sua literatura, apesar de não ser necessariamente autobiográfica, carrega marcas de sua história, como “Verde Verdade”
(301 pág., 2023), obra que Rodrigo qualifica como uma desconstrução e
atualização dos romances de estrada, inspirado na literatura beatnik.
Escrito quando tinha 18 anos, o livro é uma homenagem àquele que seria
seu leitor ideal, o avô, já falecido. Sua história, que fala do encontro
entre dois andarilhos que se conectam, tem raízes profundas no
relacionamento do escritor com o familiar na infância.
O
autor ainda prepara novos lançamentos, como é o caso de um livro de
poesia que compreende poemas escritos entre os anos de 2022 e 2023 (e
acrescenta outros, nomeados como “excessos” por terem sido compostos
anteriormente) previsto para ser lançado pelo NADA∴Studio Criativo;
“Ensaio das Expectativas Míticas” e um romance experimental chamado “O
Prisioneiro e os Outros”.
Adentrando o mercado digital e artístico
Como
redator inserido no mercado digital, Rodrigo também escreve sobre o
modo como a comunicação e a tecnologia são capazes de afetar o tecido
social através da política e religião. Em “NFT’s, influencers e a música [...] do artista [...]”,
por exemplo, o escritor reflete sobre comunicação, tecnologia e cultura
através de um caso de propriedade intelectual que compreende alguns dos
métodos do mundo conectado. O texto técnico, que começa lidando com
criatividade, impedições e mercado artístico, deságua em como pontos e
palavras, teoricamente habituais, exigem do indivíduo alguma fluência e
atenção para oportunidades levantadas no mundo conectado. Foi seu
primeiro livro físico publicado, em 2022, através da editora Casatrês.
O ensaio, originalmente no Medium,
trata sobre personalidades artísticas e todo tipo de capital simbólico
social e cibernético atrelado a obras e criadores. O “pitch” para
começar a escrever veio de um artista que assinava sua música ambiente
com uma sequência de caracteres impronunciáveis e sequer “digitáveis”.
Rodrigo
questiona: “Por que escolher fazer algo assim? Por que complicar ‘de
propósito’ para restringir o acesso?” As perguntas persistem até
oportunas reflexões sobre o atual mercado de influência e o modo como a
informação e aptidão digital, que parecem tão óbvias, ainda são capitais
restritos, mas não precisamente relacionados ao dinheiro.
Uma escrita que busca honestidade emocional
Mesmo
escrevendo em diferentes formatos, Rodrigo entende que sua mensagem
procede um inconsciente coletivo e atemporal. Familiar a qualquer
leitor. “Eu quero falar sobre sentimentos e experiências, mesmo quando
forem ruins, do jeito mais honesto e vulnerável possível. Honestidade
emocional é algo que eu acho importante e que eu tento trazer pra minha
escrita, não só na poesia e na ficção, mas até nos ensaios”. Abordar
existencialismo e demais questões filosóficas, por dedução, pode parecer
fatigante, porém, a narrativa característica do autor, que busca pontos
semelhantes à vida comum, é capaz de tornar a experiência fluida e
prazerosa.
Para
“Eu Só Existo...” existem possibilidades abertas em grandes casas
editoriais acerca do futuro da obra. O escritor, porém, está focado em
continuar produzindo. “Quero continuar escrevendo poesias, contos,
ensaios, textos mais técnicos e histórias de ficção. Em algum momento
penso também na escrita de coisas mais autobiográficas, mas ainda me
questiono sobre como fazer isso dadas as questões sensíveis que
envolveria”
afirma. Rodrigo também está se aventurando pela literatura de gênero.
Desde 2018 vem trabalhando em um livro de terror, que está com o
primeiro ato pronto, mas como se trata de um projeto mais ambicioso, não
existe perspectiva para a sua data de lançamento.
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