Por Ivam Peleias e Levi Santos
De
funcionamento facultativo na maioria das companhias, mas permanente nas
empresas estatais, os conselhos fiscais têm em comum a presença
obrigatória nas sociedades por ações e, em alguns casos, uma atuação
tímida diante das possibilidades que a Lei 6.404/76 (Lei das S/A) lhes
permite.
No entanto, em momentos de crise e destruição de valor das companhias, seus membros são chamados à responsabilidade e ficam sujeitos à responsabilização civil e criminal, como tem ocorrido no caso Americanas.
Por
isso, o correto entendimento de suas funções, atribuições, poderes e
responsabilidades é fundamental para que aqueles que atuam como fiscais
nas sociedades por ações possam contribuir na geração de valor para os
acionistas, bem como na perenização e institucionalização das companhias
brasileiras.
O
conselho fiscal é órgão da companhia especificamente destinado à
fiscalização da administração, cujas competências e previsão legal
constam no artigo 163 da Lei das S/A. Vale ressaltar que o conselho
fiscal atua de forma independente e não integra os órgãos da
administração das companhias, mas é órgão da estrutura de governança que
se reporta diretamente aos acionistas e se dedica exclusivamente à
fiscalização e ao controle dos atos dos administradores.
As
suas competências estão expostas exemplificativamente no art. 163 da
Lei das S/A. Os estatutos das companhias podem acrescentar competências
desde que estas não invadam a competência de outros órgãos sociais.
Dentre
as competências legalmente estabelecidas destacam-se: (i) a
fiscalização do cumprimento dos deveres legais e estatutários dos
administradores; (ii) emissão de opinião acerca do relatório anual da
administração e propostas da administração, (iii) exame das
demonstrações financeiras anuais e balancetes, (iv) denúncia de fraudes e
crimes e (v) convocação de assembleia geral diante de motivos graves ou
urgentes caso a administração não o faça no prazo de um mês.
A
leitura atenta do parágrafo anterior revela que as competências do
conselho fiscal não estão restritas à revisão e opinião sobre as
demonstrações financeiras das companhias. O órgão tem competência para
supervisionar a administração da companhia como um todo e se reportar
diretamente aos acionistas por meio de pareceres ou até mesmo pela
convocação da assembleia geral.
É
importante frisar que a fiscalização (art. 161, I), a denúncia (art.
161, IV) e a solicitação de esclarecimentos e informações aos órgãos de
administração (art. 161, § 2º) podem ser realizadas por qualquer um de
seus membros. Assim, os membros do conselho fiscal podem atuar de
maneira colegiada e individual, de forma a garantir a efetividade de
seus deveres.
Também é importante notar que, conforme prevê o artigo 165 da Lei das S/A, os membros do conselho fiscal conselho fiscal têm os mesmos deveres dos administradores e respondem pelos danos resultantes de omissão no cumprimento de seus deveres e de atos praticados com culpa ou dolo, ou com violação da lei ou do estatuto.
Apesar
da extensa competência que é legalmente dada aos conselhos fiscais, sua
atuação em muitas companhias ainda é formal e pouco ativa.
As
razões para isso são muitas. Cita-se, por exemplo, (i) calendário
restrito com pouquíssimas reuniões durante os exercícios sociais (em
geral, trimestrais), (ii) ausência de pauta de fiscalização prévia e bem
definida, (iii) pouco ou nenhum acesso à informação que permite apenas
um olhar para o passado (visão de “retrovisor”), sem capacidade de
avaliar o presente e indagar sobre o futuro, (iv) falta de interesse de
membros e (v) e até mesmo o oportunismo de acionistas de véspera que
tentam se eleger apenas para ter remuneração fixa.
Com
isso, em muitos casos, os conselhos fiscais tornam-se puramente
burocráticos, cujas funções se restringem a emitir opiniões vagas e
formais estritamente quando exigido por lei, deixando de lado seu
objetivo de fiscalizar e controlar ativamente, evitando-se fraudes ou
más práticas que possam afetar o valor das companhias ou até mesmo a sua
existência.
Diante desses
cenários e de casos que afetam todo o mercado brasileiro, nos parece
essencial resgatar a importância dos conselhos fiscais e de sua atuação
diligente e saudável.
Para tanto, é
importante que os fiscais tenham: (i) livre acesso à informação, de
forma a serem capazes ter visão total sobre a administração da
companhia, (ii) calendário de reuniões compatível com a complexidade da
companhia, com pelo menos uma reunião mensal, (iii) interlocução com a
administração, inclusive mediante reunião com administradores chave,
(iv) capacidade e recursos para avaliação dos aspectos patrimoniais,
financeiros, operacionais, regulatórios e estratégicos da companhias e
(v) consciência das suas competências e responsabilidades.
Por fim, também é essencial o compromisso também dos acionistas e administradores, tanto na eleição de membros qualificados para atuarem como fiscais, quanto na facilitação no acesso as informações.
Ao
contrário do que se pode pensar, a atuação diligente do conselho fiscal
nas companhias, especialmente nas abertas, contribui para a manutenção
da transparência, da gestão eficaz das companhias e na criação de valor
para acionistas, stakeholders, e a sociedade, maior interessada na
perenidade sustentável das companhias.
Os autores:
Ivam Ricardo Peleias -
Professor dos Mestrados em Administração e Ciências Contábeis da
Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP). Contador,
conselheiro fiscal, assessor de Conselhos Fiscais de cooperativas de
trabalho médico. Sócio da Irpe – Perícia e Consultoria Contábil.
Levi Custódio Santos -Advogado de mercado de capitais e governança corporativa. Formado em Direito pela Universidade de São Paulo. Possui certificação em governança corporativa, compliance e risco.
Texto publicado originalmente na Revista Finanças FECAP: clique aqui.
Sobre a FECAP
A Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) é referência nacional em Educação na área de negócios desde 1902. A Instituição proporciona formação de alta qualidade no Ensino Médio (técnico, pleno e bilíngue), Graduação, Pós-graduação, MBA, Mestrado, Extensão e cursos corporativos e livres. Diversos indicadores de desempenho comprovam a qualidade do ensino da FECAP: nota 5 (máxima) no ENADE (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) e no Guia da Faculdade Estadão Quero Educação 2021, e o reconhecimento como melhor centro universitário do Estado de São Paulo segundo o Índice Geral de Cursos (IGC), do Ministério da Educação. Em âmbito nacional, considerando todos os tipos de Instituição de Ensino Superior do País, a FECAP está entre as 5,7% IES cadastradas no MEC com nota máxima.
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