BLOG ORLANDO TAMBOSI
O conselheiro internacional de Lula tem levado o presidente a um pântano moral no qual o petista pode ser afogar. Fabiano Lana para o Estadão:
Como
argumentos humanitários parecem não importar nesse caso específico, se
há um ponto do atual governo que afasta os moderados, prejudica os
índices de popularidade, e causa até mesmo certa repugnância é a posição
do presidente Lula e de seu principal conselheiro internacional, Celso Amorim, com relação à invasão da Ucrânia pela Rússia.
Por motivos que vão desde interesses comerciais a um antiamericanismo
sectário, as posições do governo indicam que o compromisso com a
democracia do petismo era apenas uma conveniência para vencer as
eleições. Mas podem pagar caro por isso.
A questão é mais ampla. Em momentos decisivos, o coração dos petistas bate mais forte para qualquer ditadura que se oponha aos Estados Unidos
e, atualmente, mesmo à Europa. E pelo jeito pode ser uma teocracia
misógina como o Irã (leiam “Faca”, de Salman Rushdie), um governo que
tornou sua população miserável, como a Venezuela (leiam Mãe Pátria, de Paula Ramón), uma ditadura mofada e em forte crise como Cuba
(o país passa por mais uma onda de desabastecimento), que, se gritam
“fora USA”, contam com a simpatia aberta ou velada de nossos atuais
governantes. A verdade, além disso, é que se for para fulanizar, as
posições de Amorim estão as que causam mais estragos em um governo num
período do país em que qualquer minoria faz a diferença para virar a
balança eleitoral.
Não
existem relações internacionais sem hipocrisia. Muitas vezes apenas
governos vis possuem ou querem comprar a preços competitivos produtos de
maneira a salvar uma economia como a brasileira – logo, negociar
comercialmente será sempre preciso. Porém, o que há no caso da dupla
Lula-Amorim é pior. Entre países que, apesar dos pesares e incoerências,
são democráticos, buscam seguir certos princípios do iluminismo,
respeitam as minorias e a livre expressão e, do outro lado, países
dominados por grupos repressivos, que transgridem a soberania
internacional, e subjugam seus povos, preferem a segunda opção. Em
outras palavras, por influência de Amorim resolvemos, como país, optar
pelo “eixo do mal”.
Curioso
que essa posição não traz grandes variações no tabuleiro mundial. Pela
distância geográfica, pela falta de poderio bélico, entre outras razões,
o governo Lula é visto como café com leite das relações internacionais.
É interessante tê-lo no mesmo lado, mas não causará significativa
diferença prática. Mesmo assim, em seu terceiro mandato, Lula preferiu
priorizar sua ação internacional – após tantas derrotas no Congresso
aparentemente terá de mudar o foco, a conferir. Entretanto, será que
Lula e Amorim ainda sonham estar na frente das negociações que selarão
tanto a paz na Rússia como em Gaza e ganhar o Nobel da Paz? Eles
acreditam na própria megalomania delirante? Na realidade, mesmo
internacionalmente, têm colhido é antipatia dos líderes ocidentais. O
presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenski, é apenas o mais vocal deles. Nem na América latina conseguem se sobressair, tome-se os pitos que levaram de Gabriel Boric, do Chile, e Lacalle Pou, do Uruguai, sem falar do hostil argentino Javier Milei.
A
invasão russa no território ucraniano é a primeira violação territorial
neste nível na Europa desde que a Alemanha Nazista invadiu a Polônia em
1939, deflagrando a segunda guerra mundial. Existe claramente um lado
agressor. Mas, para Amorim, são apenas visões divergentes em jogo. O
conselheiro dá a entender que a Rússia teria certa razão por se sentir
ameaçada pela OTAN. É um contorcionismo mental que esconde ranços e
ideologias. Mas a realidade pode ser exatamente o contrário: se não
fosse a OTAN, uma série de repúblicas que já fizeram parte da União
Soviética e conseguiram se libertar, como a Estônia, a Letônia e a
Lituânia, já teriam sido invadidas sem qualquer piedade. Inclusive,
nesses três países bálticos, há museus da ocupação que não distinguem as
invasões nazista e comunista no século passado, são vistas como algo
igualmente ignóbeis, – incluindo aí o período em que houve uma ocupação
conjunta de alemães e soviéticos durante o período em que vigorou o
acordo de não agressão entre Stalin e Hitler – o Pacto
Molotov–Ribbentrop. Na época, a bandeira vermelha da invasão continha os
símbolos do nazismo e da foice e o martelo no mesmo pano.
O
papel do Brasil nessas crises ainda acaba por revelar uma outra grande
incoerência: a contundência com que Lula condena as mortes de crianças
inocentes na faixa de Gaza transforma-se em brandura se o salteador for
russo. É tigrão para Israel e tchutchuca para Putin, se quisermos
utilizar a expressão zombeteira da moda.
Amorim,
que tenta se passar por um grande negociador, na verdade tem levado o
seu chefe a um pântano do qual ele não conseguirá sair. É algo que
poderá fazer grande diferença entre a pequena minoria decisiva que em
2026 vai votar no PT, nulo, ou na outra opção, ao analisar fatores como
esses. Como falar na questão moral não sensibiliza o presidente e seu
escudeiro, vale um argumento cínico: em um país tão dividido e por
margem tão estreita, uma política internacional conduzida por Amorim
pode ser uma das razões para uma derrota eleitoral. O mais sábio, para o
presidente, seria cortar as asas de seu desastrado conselheiro.
Postado há 20 hours ago por Orlando Tambosi
Nenhum comentário:
Postar um comentário