Por Vivien Mello Suruagy*
A
expansão da conectividade digital no Brasil é prejudicada pela falta de
uma contribuição justa nos custos por parte das big techs, seja pelo
uso massivo das redes de telecomunicações ou por conta da assimetria
tributária e regulatória em relação a empresas de telefonia ou emissoras
de TV e rádio. As big techs, gigantes multinacionais como Meta, Google,
Apple, Netflix, Amazon, Microsoft e X (antigo Twitter), pagam bem menos
impostos do que as teles e quase não são reguladas, embora que, com
apenas um post em suas plataformas digitais, possam alcançar quantidade
incomparável de brasileiros, até mais do que os meios jornalísticos
tradicionais ou um pronunciamento em rede na TV. É o que também ocorre
em quase todo o planeta.
As big
techs são grandes produtoras de conteúdo digital, porém não contribuem
para garantir o uso intensivo das redes. Afinal, são responsáveis por
mais de 80% do total do tráfego de dados. Falta uma regulamentação por
parte da Anatel sobre as obrigações dos grandes usuários de
telecomunicações, como as big techs. Por isso, as empresas do setor
acabam bancando todo o investimento necessário.
O aumento do uso
das redes tem gerado majoração dos custos, que não são totalmente
cobertos pelo valor cobrado dos usuários. As teles têm que investir em
infraestrutura e qualidade. Isso gera um desequilíbrio financeiro e uma
concorrência desleal com as big techs e afeta os investimentos que
seriam destinados ao aumento da conectividade, sobretudo em regiões e
setores menos assistidos hoje.
Esses
investimentos poderiam ser usados, pela iniciativa privada, por
exemplo, para expandir a internet em escolas e hospitais ou no meio
rural e na periferia das grandes cidades brasileiras. Portanto, é
preciso estabelecer uma remuneração justa, rediscutir a neutralidade da
rede e reduzir a carga regulatória de nosso setor. Se as big techs
fornecem serviços de telecom, qual o motivo do privilégio de
praticamente não serem reguladas?
Outro grande problema é a assimetria tributária entre as big techs, que em grande parte não pagam tributos em nosso País, e o setor de telecomunicações – sujeito à alta carga de impostos, uma das maiores do mundo. São bilhões gerados por consumo no Brasil (em valores que desconhecemos) e que deixam de ser tributados. E numa situação em que o governo federal constantemente luta por novas receitas.
Encontramos
grandes assimetrias também entre as mídias digitais e as mídias
tradicionais. São receitas publicitárias, produção de conteúdo e
direitos autorais com pouca regulação que privilegiam estas grandes
corporações em detrimento das mídias tradicionais.
A
regulação setorial é desbalanceada. Enquanto as rádios e TVs cumprem
uma série de exigências – inclusive de responsabilidade editorial - e
são obrigadas a manter sede no Brasil, as mídias digitais não estão
sujeitas às mesmas obrigações.
Por isso é necessário que a Anatel seja a agência que regule o funcionamento e a operação dos grandes grupos corporativos focados em tecnologia e nas mídias digitais que atuam no Brasil. As discussões devem envolver o governo e o congresso, além da própria Anatel. Devemos avançar no sentido de buscar um ambiente de negócios mais equilibrado, incentivar a competitividade e gerar recursos adicionais para o País.
Muitos
países, principalmente da União Europeia (UE), já acordaram para o
problema e aprovaram uma série de medidas para disciplinar a atuação
dessas plataformas e limitar seu poder. Entrou em vigor, em 7 de março, a
Lei de Mercados Digitais (DMA), uma regulamentação da UE que trata da
atividade de gigantes da tecnologia e da concorrência entre elas. Com
sua vigência, poderão ser fiscalizados pelo menos 22 serviços.
A
expectativa é a de que, com a norma, os consumidores tenham mais
serviços à disposição, por um preço justo. Se as companhias descumprirem
as regras, poderão ser multadas em até 10% do seu faturamento anual. A
penalidade pode chegar a 20% em caso de reincidência.
As big
techs têm uma concentração de poder muito grande para, além de pagar
poucos impostos, atuar sem fiscalização do poder público, o que pode
gerar abusos, inclusive financeiros.
*Presidente
da Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de
Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra).
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