O segredo do idiota da evolução espiritual é fazer o outro parecer estressado, escreve Luiz Felipe Pondé em sua coluna na FSP:
Podemos ver como as pessoas agem na vida vendo como elas passeiam nas
ruas. Imagine a seguinte cena: um grupo de amigas anda na rua com seus
cães, e uma outra mulher, andando de bike
sobre a calçada, vem em direção a elas; os cães se assustam e começam a
latir. Em vez de a mulher de bike sair da calçada, já que ela está
sobre rodas, e na calçada, ela para e faz o grupo de mulheres, com seus
cães em polvorosa, descerem da calçada, do contrário, eles não sairiam
do impasse.
Claro que se segue um pequeno bate-boca entre as mulheres. Uma delas,
mais falante, indaga à ciclista chique a razão de ela não sair da
calçada, principalmente uma vez que o grupo tinha de “manobrar” seus
cães irritados com a bicicleta. A ciclista chique responde com um
sorriso no rosto: “é só um pouquinho, lindinha”.
Essa reação da ciclista chique me chamou a atenção. Imagino que as
mulheres irritadas devem ter pensado: “Lindinha é a sua mãe!”. O segredo
do idiota da evolução espiritual é fazer o outro parecer um estressado.
O sorriso e o ar blasé da ciclista chique pareciam denunciar seu
suave desprezo pela irritação das outras mulheres, como se estas fossem
estressadas e ela não.
Ali estava aquele grupo de mulheres estressadas diante de um ser evoluído.
Evoluído porque, diante do estresse das outras, ela demonstrava uma
certa superioridade psicológica presente na resposta blasé dada.
O interessante é que ela, e não as outras, estava em grave erro de
convívio. Deveria ter dado passagem ao grupo e não fazer com que as
mulheres tivessem de “manobrar” seus cães e irem para a rua enquanto a
beldade ficava ali parada de modo superior.
Essa é uma atitude típica desse novo tipo de arrogância passivo-agressiva, muito em voga nos últimos tempos.
A evoluída irrita outra pessoa com sua atitude folgada, e quem se
irrita acaba parecendo uma estressada desequilibrada e infeliz.
O jogo visa fazer sua atitude mal-educada parecer o gesto de alguém
mais feliz, mais equilibrada e, portanto, capaz de responder à fala
irritada da outra pessoa com um sorriso blasé. É óbvio que essa atitude
apenas irritou mais ainda o grupo e, ao final das contas, a mal-educada
posou de equilibrada e as outras de mulheres loucas.
O mundo está cheio de gente folgada e chata que posa de legal, fazendo os outros parecerem estressados.
Outro exemplo típico desse convívio com evoluídos de butique é gente
que anda na rua com seus cães soltos, criando estresse nos cães que
andam na coleira. Esses idiotas da liberdade assumem que seus cães devem
andar livres de amarras nas ruas. E se, por acaso, ele morder ou
ameaçar um outro cão, ou seu dono, o outro é que será o estressado não
evoluído da relação.
Será que algum novo tipo de idiota da evolução espiritual já
determinou que usar a palavra “dono” para animais é politicamente
incorreto? Provavelmente sim: nasce um idiota correto a cada minuto no
mundo.
Quase esqueci. Nas ruas, quando você vai passear com seus cães, há
ainda o topo da evolução espiritual: pessoas que não catam o cocô dos
seus cães porque consideram esse cocô um presente do cosmos para o dono
da casa na frente da qual seu cão defeca.
Experimente cobrar dessa pessoa simpática o saquinho de plástico e
ela olhará para você com o desprezo característico das pessoas evoluídas
espiritualmente: “Não uso saco plástico porque polui o meio ambiente,
fezes são orgânicas”. Se for cocô de vira-lata, mais evoluído você será
então!
O que eu estou chamando aqui de evoluído? De cara, confesso: não confio em ninguém que se acha evoluído, principalmente espiritualmente, como é o caso.
Esse tipo de gente, normalmente, esconde seu mau-caratismo atrás de
atos de desprezo para com os outros. Pensam: “respeitar os outros é para
os fracos”. Gente que usa expressões como “uma outra qualidade de
consciência” não deve ser objeto de confiança. Logo farão alguma
canalhice com você, ainda que regada a um sorriso blasé e frases como
“você anda muito estressada, minha linda!”. O idiota evoluído é o
consumidor do século 21. Ele é mais egoísta, mais leve e mais rico.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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