Dias Toffoli e Alexandre de Moraes conseguiram cometer um atentado de
primeira grandeza contra as instituições. Coluna de J. R. Guzzo,
publicada na edição impressa da revista Exame:
É fato sabido que o Supremo Tribunal Federal, pelo comportamento
pessoal de parte dos seus membros, se transformou há tempos no principal
causador da instabilidade jurídica no Brasil. É uma aberração. O STF é
justamente o órgão que deveria garantir o principal atributo da
aplicação da justiça numa sociedade civilizada ─ a previsibilidade das
decisões judiciais, elemento indispensável para dar aos cidadãos a
segurança de saber que os magistrados vão proceder sempre da mesma forma
na aplicação das leis. Sem isso não há justiça de verdade; há apenas os
caprichos, as neuroses e os interesses materiais de quem está com o
martelinho de juiz na mão. Não é apenas a estabilidade jurídica que está
indo para o saco. A conduta degenerada de diversos membros do STF acaba
sendo, também, uma ameaça constante à própria estabilidade política do
país, com a produção irresponsável, incompreensível ou inútil de crises
com os poderes Executivo e Legislativo, conflitos com porções diversas
da sociedade e agressões à lógica comum. Tudo isso, nos últimos dias,
ficou ainda pior. Dois ministros, o presidente Antônio Toffoli e
Alexandre Moraes, mergulharam num surto de decisões extravagantes,
totalitárias e denunciadas como puramente ilegais por muitos dos
juristas mais respeitados do país. Resultado: tornaram-se uma ameaça
direta às instituições brasileiras. São eles, mais que quaisquer outros
indivíduos, quem mais se esforçam hoje para destruir um dos três pilares
da democracia que existe por aqui ─ o Poder Judiciário.
Toffoli e Moraes são duas nulidades; não irão a lugar nenhum com seus
acessos de furor ditatorial e não vão, no fim, conseguir o que querem.
Na verdade, já não conseguiram. Sua história, como todo o Brasil ficou
sabendo, é rasa, escura e miserável. A revista digital Crusoé, parte da
organização jornalística O Antagonista, publicou um trecho da delação do
empreiteiro Marcelo Odebrecht, réu confesso de corrupção maciça no
governo Lula, condenado e cumprindo hoje pena de prisão domiciliar.
Nessas declarações, que integram um documento oficial da Justiça como
parte inseparável do seu longo processo de delação, Odebrecht se refere a
Toffoli ─ descrito por ele como “o amigo do amigo do meu pai”, ou seja,
como amigo de Lula ─ numa sombria conversa envolvendo construção de
usinas e a Advocacia-Geral da União, à época dirigida pelo atual
presidente do STF. Pronto. Toffoli entrou imediatamente em modo de Rei
da Babilônia e mandou o colega Moraes se lançar à expedição de uma
bateria de ordens dementes ─ suspensão da publicação da revista, multas
diárias de 100.000 reais, censura, ameaça a outros meios digitais e por
aí afora.
O resultado foi um desastre integral. O STF conseguiu, ao mesmo
tempo, violar a liberdade de imprensa, aplicar punições sem a conclusão
de processo legal e sem a produção de uma única prova, ignorar a decisão
da Procuradoria-Geral da República de arquivar o caso (cabe à PGR,
legalmente, investigar os supostos delitos cometidos pela revista),
exercer abuso de poder e incorrer na suspeita de praticar outros crimes ─
um horror, quando essa série de ações é cometida não por criminosos do
PCC, mas por ministros do Supremo Tribunal Federal deste país. Pior que
tudo, a dupla conseguiu exatamente o oposto do que pretendia com a sua
blitz proibitória e punitiva: a reportagem da Crusoé, que ambos quiseram
deletar do mundo real, foi reproduzida de forma massiva e incontrolável
por centenas de órgãos de comunicação, de todos os tamanhos e
plataformas, espalhados pelo Brasil e mesmo no exterior. Toffoli, que já
carrega na testa a marca de repetente (por duas vezes), no concurso
para juiz de direito, passou a carregar agora, também, o lamentável
apelido de “amigo do pai do meu pai”. Não vai se livrar disso.
Os dois serão detidos dentro do próprio STF, que não os deixará obter
o que queriam. Sua tela está mostrando: “You lost“. Mas conseguiram,
sim, cometer um atentado de primeira grandeza contra as instituições.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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