A internet é o princípio, o meio e o fim dos assassinos em massa. Coluna de Vilma Gryzinski, publicada na edição impressa de Veja:
Dogolachan, 4chan, 8chan. Não faz ideia do que é? Dylan Klebold e
Eric Harris, Adam Lanza, Dylann Roof, Robert Bowers. Anders Breivik,
Brenton Tarrant. Ainda está difícil? Vamos ficar mais próximos.
Wellington, Guilherme, Luiz Henrique. Sim, são todos autores de
massacres infames. Em escolas na maioria, mas também em uma igreja
metodista de fiéis negros, uma sinagoga, um acampamento do partido de
centro-esquerda da Noruega e, no caso mais recente, em duas mesquitas na
Nova Zelândia. Todos frequentadores dos “buracos negros” da internet
mencionados logo no começo, autodoutrinados em teorias conspiratórias.
Certos de que se tornaram heróis malditos, celebridades do mundo das
sombras da internet, seja na morte, na maioria dos casos, seja na vida
numa cela. Numa competição do mal, saúdam os antecessores e tentam
superá-los. Por enquanto, o australiano Brenton Tarrant está no topo:
transmitiu ao vivo pelo Facebook os dezessete horripilantes minutos em
que massacrou frequentadores das mesquitas — “invasores”, por serem
muçulmanos.
Tarrant matou cinquenta pessoas e riu da nossa cara. Na live do
terror e no manifesto que deixou para a infâmia, plantou pistas falsas e
trolagens, destinadas justamente a causar confusão e desinformação. Um
exemplo: disse que Candace Owens foi a pessoa que mais o conduziu ao
caminho da radicalização, “embora os atos extremos que ela defende sejam
excessivos até para o meu gosto”. É uma espécie de piada cheia de
ironia. Candace, também cria da era digital, é jovem, bonita, negra e
agressivamente conservadora. O falso elogio a ela, da mesma forma que o
dirigido a Donald Trump, faz parte do declarado propósito de Tarrant de
apressar uma guerra civil nos EUA.
Como seu maior inspirador, Anders Breivik (77 mortos na Noruega, um
recorde difícil de quebrar), Tarrant tem um conceito narcisista da
própria importância. Naturalmente, acha que vai mudar o mundo. Embora
ambos tenham agido de forma isolada, o uso intensivo das redes sociais, o
culto à ultraviolência e as “justificativas” para matar civis inocentes
são impressionantemente idênticos aos dos propagandistas do Estado
Islâmico. Como os ultrafundamentalistas muçulmanos, Tarrant procurou no
passado a explicação para barbaridades no presente. Suas armas foram
pintadas com o nome de comandantes da Batalha de Lepanto, como
Marcantonio Colonna e Sebastiano Venier, do governador de Veneza na
época da histórica vitória na cidade sitiada e de heróis sérvios da
resistência à expansão muçulmana. Usar fatos que aconteceram há 400 ou
500 anos como paradigma do presente equivale a invocar as batalhas do
profeta Maomé como exemplo de comportamento para os muçulmanos nos dias
atuais.
O fator cópia e o elemento contagioso desses massacres fazem com que
aumentem os apelos para que o nome dos desgraçados não seja reproduzido
pela imprensa, os “chans” em que se infectam mutuamente sejam policiados
e as plataformas abertas que usam para se promover apertem a censura.
Todas, infelizmente, soluções falsas para um problema verdadeiro.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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