sábado, 1 de abril de 2017
Sem PT como alvo, protestos da direita se diluem
Manifestantes percorreram as ruas no último domingo (26) para demonstrar seu apoio à Operação Lava Jato e pedir o fim da corrupção. Em São Paulo, o ato fracassado foi convocado pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e pelo Vem Pra Rua para dizer que a luta contra a impunidade não havia terminado. Analistas explicam que a baixa adesão tem a ver com o ódio que era mantido e concentrado exclusivamente no Partido dos Trabalhadores, que tem os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva como suas principais figuras.
“A direita se dividiu. Até o impeachment da Dilma, existiam pautas unificadas. A partir do momento que ela sai, há uma ruptura na direita. O último movimento organizado pelo MBL demonstra que há uma fragmentação, ilegitimidade, e perda de capacidade de convocação da direita. Muitos se desencantaram, porque perceberam que não houve a mudança que eles esperavam”, disse Breno Bringel, sociólogo e professor do Iesp (Instituto de Estudos Sociais e Políticos) da Uerj.
Na mesma Avenida Paulista, um ano atrás, a grande marcha exigia o impeachment de Dilma Rousseff, vestindo as mesmas camisetas verdes e amarelas do último domingo. Os protestos percorreram Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Brasília e mais de uma dúzia de outras grandes cidades brasileiras.
Manifestantes pró-impeachment acusam o PT de institucionalizar a corrupção em Brasília, o que não é evidenciado pelos fatos: toda a classe política brasileira está envolvida em escândalos da Lava Jato, como membros proeminentes do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) do atual presidente da República Michel Temer, e chefes da oposição ao PT, como o Partido Social Democracia Brasileiro (PSDB), que carrega nomes como o de Aécio Neves, ex-candidato presidencial, ou Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, bem como de partidos que compõem hoje a base do governo.
“A direita perdeu completamente suas bandeiras, que era responsabilizar o PT pela corrupção, e está claro que esse processo é muito mais sistêmico”, completou o cientista político Carlos Eduardo Martins, da UFRJ.
Menos de um ano após a saída da Dilma, o clima de ressaca vigora em meio aos escândalos de corrupção e crise econômica. Um levantamento do Ibope, encomendado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e divulgado na última sexta-feira (31), aponta que 55% dos entrevistados consideram o governo de Michel Temer ruim ou péssimo. Já a aprovação do peemedebista está na casa dos 10%. A sondagem aponta, ainda, que 79% dos entrevistados não confiam no presidente.
Além disso, as taxas de desemprego não param de subir, a economia encolhe, o governo toma uma série de medidas impopulares com reformas estruturais (previdência, trabalhista e ajuste fiscal que congela os gastos públicos por 20 anos) e os homens de confiança do presidente estão mergulhados na Lava Jato - prato cheio para uma avalanche de protestos e insatisfação. Para alguns dos entrevistados, Temer é, de um lado, blindado e, por outro, beneficiário final da desmobilização da sociedade insatisfeita com seu governo.
“Nós estamos vivendo uma crise de mediação política no Brasil hoje. O PT tinha uma enorme dificuldade de escutar as ruas e o governo Temer não quer escutar as ruas, só diz que escuta quando é convergente aos seus interesses políticos”, disse Breno Bringel.
“Há um desgaste depois de anos de mobilização. Os problemas continuam, porém se perdeu o fôlego. Esse governo, que está cumprindo uma agenda conservadora sem legitimidade do voto, não está preocupado em conquistar um apoio popular, até porque o Temer não pode se candidatar em 2018”, explica o cientista político e professor da UERJ Ignácio Cano.
“O que está evidente é um esvaziamento das manifestações da direita golpista e uma reorganização dos movimentos populares”, acrescentou Carlos Eduardo Martins.
O ressurgimento dos movimentos sociais
Em entrevista publicada pelo Valor Econômico no último dia 17 com Dilma Rousseff, a ex-presidente fala sobre os entraves para construção da hegemonia de seu partido, e acrescenta uma fala no campo econômico fazendo referência aos protestos de 2013: "No início do meu governo, em 2011, fizemos um ajuste e, até 2014, resistimos à crise. A guerra cambial com os Estados Unidos valorizou nossa moeda de uma maneira muito perigosa para a indústria. Reduzimos a taxa de juros, pra segurar a economia. Foi aí que veio 2013".
O jornal observa que a ex-presidente até hoje não consegue dar uma explicação para aquelas manifestações, somando o fato de que quando ocorreu seu impeachment, esse mesmo grupo não mais voltou às ruas: "Ainda vamos precisar de uma distância histórica para entender. Tem uma parte simples, mas não responde tudo. É mais fácil distribuir renda do que ampliar serviços. A renda tem um tempo político mais rápido que o acesso a serviços. E como, de fato, o fim da miséria é só o começo, as pessoas sempre querem mais", disse a ex-presidente ao Valor.
“2013 foi excepcional, um ciclo de protestos de alta intensidade, tanto de grupos organizados quanto parte das pessoas que individualmente estavam indignadas. Hoje temos um cenário de polarização política mais forte, e as ruas são canais de expressão de grupos mais organizados”, disse Breno, sociólogo da Uerj, para quem o ano de protestos contribuiu para uma politização da sociedade, ainda que, ele admite, seja difícil mantê-la. “E, além do que, os movimentos sociais não se resumem aos protestos, temos que diferenciar aquelas formas de organização política da sociedade que não necessariamente sairá às ruas”, acrescenta.
O cientista reforça que estamos vivendo uma mudança de ciclo político que, segundo ele, era hegemonizado pelo Partido dos Trabalhadores, forças sindicais e políticas que nasceram na redemocratização, mas que passaram a ser contestados por atores que foram emergindo à sua esquerda.
“Movimentos que nasceram na democracia e não se identificam com o PT foram se unindo por outras vias, de forma um pouco mais descentrada. Essa nova esquerda ainda não emergiu totalmente como sujeito político claro, e teve menos visibilidade pública, mas está aí, e com o tempo fará parte desse tecido político mais crítico do Brasil”, disse.
Ignácio Cano faz coro a Breno e explica: “A esquerda está em crise no mundo inteiro hoje, e o projeto do PT foi se desgastando progressivamente”.
“Está havendo um recrudescimento de manifestações com outros perfis. E essas manifestações demonstraram certo corpo no dia 15 de março (contra a reforma da Previdência), com quase 1 milhão de pessoas nas ruas do Brasil inteiro”, disse Carlos, finalizando: “Apesar de haver dificuldade, os movimentos não estão mortos, eles estão se rearticulando e tendem a crescer”.
Raimundo Bonfim, coordenador geral da Central de Movimentos Populares, e da coordenação nacional da Frente Brasil Popular, firmada por sindicatos e militantes que atuam nos mais diferentes espaços organizativos da política, conta que o ato que aconteceu nesta sexta-feira (31) contra as reformas do governo Temer é uma chamada para a greve geral do dia 28 de abril, que tem o mesmo objetivo da última manifestação que encheu as principais ruas das capitais brasileiras no dia 15 de março.
“O nosso argumento era de que assim que a Dilma caísse, em um segundo momento, viria um ataque aos direitos sociais, e é o que está se confirmando na prática com os projetos apresentados por Temer. O resultado disso é um crescente de mobilizações do lado de cá”, finalizou.
*do programa de estágio
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