O afilhado de Lula tenta perpetuar a impunidade do padrinho. Augusto Nunes:
Às nove e meia da noite de 28 de agosto de 2007, o ministro Ricardo
Lewandowski chegou ao restaurante em Brasília ansioso por comentar com
alguém de confiança a sessão do Supremo Tribunal Federal que tratara da
denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza.
Por ampla maioria, a Corte endossara o parecer do relator Joaquim
Barbosa e decidira processar os 40 acusados de envolvimento no escândalo
do Mensalão. Impaciente, deixou a acompanhante na mesa, foi para o
jardim na parte externa, sacou o celular do bolso do terno e, sem
perceber que havia uma repórter da Folha por perto, ligou para um certo
Marcelo.
Como não parou de caminhar enquanto falava, a jornalista não ouviu
tudo o que disse na conversa de 10 minutos. Mas qualquer das frases que
anotou valia manchete. "A tendência era amaciar para o Dirceu", revelou
de saída o ministro, que atribuiu o recuo dos colegas a pressões geradas
pelo noticiário jornalístico. "A imprensa acuou o Supremo", queixou-se.
"Todo mundo votou com a faca no pescoço".
Todo mundo menos ele: o risco de afrontar a opinião pública não o
impediu de amaciar para José Dirceu, acusado de comandar a organização
criminosa. Só Lewandowski — contrariando o parecer de Joaquim Barbosa, a
denúncia do procurador-geral e a catarata de evidências — discordou do
enquadramento do ex-chefe da Casa Civil por formação de quadrilha. "Não
ficou suficientemente comprovada a acusação", alegou. Invocou o mesmo
pretexto na tentativa de resgatar também José Genoíno. Ninguém divergiu
tantas vezes do voto de Joaquim Barbosa: 12. Foi até pouco, gabou-se na
conversa com Marcelo: "Tenha certeza disso. Eu estava tinindo nos
cascos".
Ele está tinindo nos cascos desde 16 de março de 2006, quando chegou
ao STF 26 dias antes da denúncia do procurador-geral. Primeiro ministro
nomeado por Lula depois da descoberta do Mensalão, Lewandowski ainda não
aprendera a ajeitar a toga nos ombros sem a ajuda do "capinha" quando
passou a agir como se fosse doutor no assunto. Ele se tornara candidato a
uma vaga no STF graças a Marisa Letícia, que transmitiu ao marido os
elogios que a mãe de Lewandowski vivia fazendo ao filho quando eram
vizinhas em São Bernardo. Mas garantiu o emprego novo depois de dizer o
que faria no julgamento do Mensalão em encontros reservados com
emissários do Planalto.
Ele sempre soube que Lula não queria indicar um grande jurista.
Queria um parceiro de confiança, que o ajudasse a manter em liberdade
bandidos de estimação. Foi o que tentou fazer em 2012, quando o STF
enfim julgou os mensaleiros. Foi o que fez em 2016, na sessão do Senado
que encerrou o mandato de Dilma Rousseff: então presidente do Supremo,
Lewandowski inventou em parceria com o senador Renan Calheiros o
impeachment fatiado, que manteve os direitos políticos de Dilma. Agora é
hora de amaciar para Lula.
Em dupla com Gilmar Mendes, Lewandowski se prepara para anular a
condenação imposta ao ex-presidente por Sergio Moro. Com a conivência da
maior parte da imprensa, o que resta de respeito pelo Supremo pode ser
destruído por ministros que mantêm desde sempre uma faca encostada no
pescoço da Operação Lava Jato.
BLG ORLANDO TAMBOSI
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