Na última semana, as redes sociais foram inundadas com mais uma fake news, dessa vez referente à Proposta de Emenda Constitucional nº 3 de 2022, apresentada pelo deputado federal Arnaldo Jordy (Cidadania/PA) e aprovada na Câmara dos Deputados no dia 22 de fevereiro de 2022,
com 389 votos favoráveis e apenas 91 contrários, que hoje encontra-se
no Senado Federal, tendo como relator o senador Flávio Bolsonaro.
De acordo com a fake news plantada por portais de extrema-esquerda como Carta Capital e Rede Brasil Atual,
a PEC trataria da privatização das praias e teria como objetivo impedir
o acesso da população às praias, que passariam a serem de propriedade
da iniciativa privada. A fake news rapidamente viralizou no Twitter e foi difundida até em alguns veículos da grande mídia, como é possível ver nesta matéria irresponsável do jornalista Guilherme Amado para o jornal Metrópoles. O ápice dessa polêmica resultou em uma discussão entre o jogador de futebol Neymar Jr e a atriz Luana Piovani, na qual a artista acusava Neymar de apoiar a privatização das praias.
Mas do que se trata exatamente a PEC? Ela permite a privatização das praias? Obviamente não.
A PEC nº 3/2022 revoga o inciso VII do art. 20 da
Constituição Federal de 1988, que declara que os chamados “terrenos de
marinha” são bens da União. Antes de mais nada, é preciso esclarecer o
que é um “terreno de marinha”. Ao contrário do que muitos pensam, um
terreno de marinha não é um terreno que pertence à Marinha Brasileira,
mas sim um terreno cuja área encontra-se situada dentro de uma faixa de
33 metros nas praias e nas margens de rios e lagoas.
A
intenção da proposta é repassar esses terrenos para os estados e
municípios e abrir a possibilidade de que aqueles que abrigam moradores
sejam comprados pelos detentores da posse. As áreas afetadas pelo
serviço público federal continuariam pertencendo à União, enquanto as
áreas afetadas pelo serviço público estadual e municipal seriam
repassadas ao domínio dos estados e municípios. Já os particulares que
ocupam o terreno poderão obter a propriedade mediante compra.
Consequentemente, haveria também uma extinção do laudêmio.
Como
podemos ver, não há em nenhum dos 5 artigos do projeto nenhuma menção a
privatização de praias, tratando-se de um típico caso de disseminação
de desinformação motivada por razões políticas. O objetivo principal do
projeto é garantir o direito de propriedade dos moradores e pôr fim a um
instituto que gera tanta insegurança jurídica como o “terreno de
marinha”.
É
necessário levar em consideração que atualmente é praticamente
impossível regularizar um imóvel caso o mesmo esteja localizado em
terreno de marinha. A Constituição Federal de 1988, por meio do seu artigo 183, §3º,
é clara ao declarar que não é possível adquirir imóveis públicos por
meio de usucapião. Então, por mais que um cidadão possua sua casa, arque
com os seus impostos e more lá por muitos anos, ele jamais se tornará
proprietário, sendo possível até mesmo a desocupação desses terrenos,
fazendo com que pessoas necessitadas percam as suas casas. Caso a PEC
3/2022 seja aprovada, a situação muda de figura, permitindo que famílias
humildes que ocupam residência em terreno de marinha possam finalmente
se tornar proprietárias dos seus imóveis.
Segundo a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), há hoje no Brasil cerca de 500 mil imóveis classificados
como terrenos de marinha, o que torna ainda mais urgente a aprovação do
projeto. Trata-se de uma emenda importante para garantir o direito à
propriedade e à moradia, sendo uma medida efetiva para garantir que
milhares de pessoas possam finalmente se tornar proprietárias das suas
próprias casas.
Uma
das críticas apresentadas é a de que a PEC, apesar de não privatizar as
praias, permitiria que particulares pudessem fechar as áreas de acesso
às praias, impedindo que a população carente as utilizasse. Essa é a alegação do
ministro das Relações Institucionais Alexandre Padilha, que declarou:
“O governo é contrário a esse programa de privatização das praias
brasileiras que vai cercear o acesso da população brasileira às praias e
criar verdadeiros espaços privados, fechados”.
Entretanto,
essa alegação não poderia ser mais inverídica. A PEC não apenas não
prevê qualquer possibilidade de fechamento de praias como tal atitude
seria por si só ilegal, visto que violaria a Lei Federal nº 7.661 de 1988,
que, em seu artigo 10, é clara ao declarar que: “As praias são bens
públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco
acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os
trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em
áreas protegidas por legislação específica.”
Sendo
assim, além de a PEC não prever esta possibilidade, qualquer particular
que tentasse limitar o acesso da população às praias estará incorrendo
em ilegalidade, podendo ser denunciado e consequentemente condenado por
tal ato, visto que praias são bens públicos de uso comum, sendo
garantido o livre acesso a elas.
O que essa onda de fake news demonstra
é que a real motivação por trás dessas críticas é meramente política.
Quando o projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados em 2022, não houve
qualquer polêmica ou repercussão, tendo conquistado apoio até mesmo de partidos de esquerda como o PDT e o PCdoB, recebendo voto favorável até mesmo da deputada Jandira Feghalli (que hoje se declara contra a PEC)
e de 2 deputados do PT. Entretanto, a partir do momento em que o
senador Flávio Bolsonaro se tornou relator do projeto, a PEC começou a
ser alvo de ataques e da onda de desinformações.
É
necessário que o bem do Brasil esteja acima de qualquer preciosismo
político. É um ato de extrema irresponsabilidade por parte de
jornalistas, políticos e influenciadores motivarem uma onda de fake news contra
um projeto de extrema importância na luta pelo acesso à moradia. É até
curioso que movimentos que alegam defender a luta dos desabrigados como
o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) se oponham a um projeto inédito e tão importante em prol do direito à moradia, ainda mais utilizando-se de fake news e demonstrando que nunca houve um interesse real na defesa dos menos favorecidos.
Para
finalizar, deixo uma dica fundamental: nunca embase sua opinião naquilo
que é proferido pelas turbas radicais da internet. Opte por ler aquilo
que está sendo criticado antes de tirar qualquer conclusão. No mais,
para todos aqueles que de fato se preocupam com a luta por uma moradia
digna e para que indivíduos finalmente tenham o seu direito de
propriedade reconhecido, a aprovação da PEC 3/2022 faz-se necessária.
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