Não, desta vez não é contra a Covid-19: quem anda aprontando no espaço é
a Rússia do czar Putin, mostra Luciano Coutinho em artigo publicado
pela Gazeta:
O Ministério da Defesa do Reino Unido emitiu um alerta. Os sistemas
britânicos detectaram que a Rússia realizou um teste proibido no espaço.
Disparou de um de seus satélites algo que foi interpretado como sendo
um objeto balístico. Isso mesmo. Um míssil espacial. Os Estados Unidos
dizem ter detectado a mesma violação. Em 2018 o Pentágono havia acusado
Moscou de fazer disparo semelhante. Ou seja, não é de hoje que Moscou
tem trabalhado em uma arma que pode neutralizar satélites dos inimigos.
Vale lembrar que os russos são signatários de um tratado firmado por
uma centena de países, entre os quais Reino Unido, Estados Unidos e
China. No documento eles se comprometem a explorar o espaço apenas para
fins pacíficos. Além disso, os signatários também assumiram o
compromisso de não colocar armas em órbita. Ao que tudo indica os russos
não deram a mínima.
O mundo está em guerra. Na verdade, nunca deixou de estar. Os
conflitos mudam de forma e de intensidade, mas sempre estiveram entre
nós. Eventos espaciais e as estripulias chinesas, por exemplo, nos levam
a pensar em uma tal Guerra Fria 2.0. Mas a Guerra Fria que teria
terminado com o fim da URSS apenas mudou de forma.
Acreditando ter vencido, o Ocidente apenas baixou a guarda dando
espaço para novas formas de luta. O TikTok está aí para nos ensinar que
um aplicativo inocente é um parasita presente em quase todos os lares
onde vivem adolescentes (ou adultos) que se recusam a amadurecer.
Na cabeça da maioria guerra é uma palavra com um significado
restrito. Remete a um conflito armado que tem geralmente dois lados com
seus aliados. Invariavelmente ela passa pela imagem bélica do uso de
tanques, caças e força bruta para subjugar o inimigo, conquistar
territórios ou protegê-los do oponente.
Mas há muito tempo guerra é muito mais do que isso. Recentemente
vazaram dois documentos produzidos no âmbito acadêmico militar
brasileiro que viraram centro de um debate míope sobre o que vem a ser
guerra. E, como é comum no Brasil, o assunto foi direcionado para o
escaninho da paranoia.
A Síria de Bashar al Assad foi a mais recente encarnação da guerra no
sentido mais popular do conceito. Mesmo assim o conflito civil que
provocou a maior onda de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial já
não representava o senso comum. O tabuleiro tinha as mais variadas
peças, que iam de interesses de potências mundiais passando por
profecias escatológicas islâmicas refletindo em uma reengenharia do
terrorismo.
Já do lado de cá do globo a Venezuela de Nicolás Maduro é o perfeito
exemplo da nova geração de guerras. Sob a luz do sol parece se tratar de
um país falido sob o comando de um ditador que criminalizou o Estado,
mimetizando-o com o crime transnacional e o terrorismo. Muita gente
tende a não aceitar, mas também é uma peça dentro do cenário de guerra
em que estamos metidos – e sequer temos a plena consciência de sua
amplitude e de quem joga o jogo por trás do ditador bigodudo.
No noticiário brasileiro, por exemplo, soa ridículo pensar que o
Brasil está em meio a uma guerra. Mas volto reforçar a desinformação
sobre o conceito. Mais do que um meio o Brasil é ponto central dentro de
novo modelo de guerra que reúne todas as formas de luta: a troca de
farpas pelo twitter entre as embaixadas da China e dos Estados Unidos em
Brasília é o sintoma mais suave do embate que é travado no submundo do
lobby políticos de Brasília e no crescente mercado de consultorias
disfarçadas de opiniões isentas. Afinal, guerra é guerra.
Aqui do lado, na Argentina, o então embaixador chinês em Buenos
Aires, que agora está em missão no Brasil, montou uma armadilha que fez
com que nossos vizinhos perdessem a soberania sob parte de seu
território. Yang Wanming coordenou a construção de maior base de
recepção de sinais de satélite fora da China. Com a promessa de uso
civil, a instalação é administrada por militares chineses e o acesso de
argentinos, acredite, é proibido. Há também quem considere que as
instalações chinesas na Patagônia têm a mais pura função militar e estão
estrategicamente instaladas para um tipo de guerra tecnológica, que
inclui a interceptação de comunicações como a interferência nos
satélites dos inimigos.
No pacífico, os pesqueiros chineses invadem diuturnamente a zona
econômica exclusiva do Equador. Nem o Arquipélago de Galápagos tem sido
poupado. Os equatorianos tentam espernear, mas os chineses não dão a
mínima. O país está mergulhado em dívidas com os chineses que, por
contrato, podem literalmente reivindicar qualquer bem do estado
equatoriano como pagamento. O petróleo já é usado como moeda para quitar
dívidas, mas já existe uma discussão sobre a cessão de parte do
território para exploração chinesa.
Acredite: satélites armados são mais um ingrediente no mundo de
conflitos constantes e híbridos no qual vivemos. E, por mais duro que
possa parecer, até na paz há guerra. Vence quem não esquece disso.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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