A cartelização entre os governos beneficia os países ricos e pune os pobres e emergentes. Artigo de Hélio Beltrão para o Instituto Mises:
Para auxiliar sua narrativa, sagazes debatedores de políticas
públicas lançam mão de vocábulos com significado adulterado. Faz parte
da retórica: o mais importante é vender sua ideia por meio da palavra
mais aceitável perante o público.
Uma das tendências mais marcantes em termos de acordos entre países
neste novo milênio é a harmonização de regulamentações e de impostos.
Os burocratas argumentam que, se todos os governos adotarem impostos e
regulamentações iguais, poderão ser estabelecidas condições equitativas
de comércio entre países, o chamado level playing field (igualdade de
condições e de concorrência).
Os governantes esperam, com isso, evitar uma "corrida ao fundo do
poço", que se refere ao "pesadelo" de impostos continuamente reduzidos
por meio de uma "guerra fiscal" visando a atração de investimentos.
Mas, obviamente, não é bem assim. Onde se lê "harmonização de
impostos", seria possível ler "cartelização entre governos". E onde se
lê "guerra fiscal", o correto seria "competição entre governos".
OCDE, junto com Piketty, quer menos concorrência
A iniciativa mais recente é da OCDE, o grupo de países mais desenvolvidos, que pretende impor uma alíquota mínima de Imposto de Renda sobre empresas no mundo todo.
Sem surpresa, essa proposta tem os intelectuais socialistas como aliados de primeira hora.
A ICRICT— entidade que faz lobby por aumento de impostos no mundo e que congrega economistas como Thomas Piketty, Joseph Stiglitz
e outros — defende a imposição mundial de uma alíquota efetiva mínima
de 25% sobre o lucro de empresas que atuem em mais de um país.
Agora, eis o curioso: é consenso entre economistas que a competição
entre empresas é saudável, por induzir a diminuição de preços e melhoria
de produtos. Porém, estranhamente, não há similar consenso de que a
competição entre governos seja saudável, embora indubitavelmente tenda a
induzir eficiência, melhoria dos serviços públicos e maior disciplina
na execução do orçamento público.
É como se, para esses economistas dissentes, a ciência econômica
funcionasse acima do Equador com certas leis e abaixo, com outras.
A monopolização por lei é o principal impedimento à competição. Em vez de citar os tradicionais exemplos clássicos, como Correios e serviços de saneamento e de infra-estrutura,
apenas note o exemplo do que ocorre quando o governo é o provedor
legalmente monopolista de um serviço como os jogos de azar no Brasil.
Ao passo que cassinos no exterior pagam aos apostadores entre 95% e 99,5% do que se aposta, a Mega-Sena distribui apenas 32%.
A banca estatal monopolista fica com inacreditáveis 68% do total
arrecadado, que representa taxa de administração 15 a 130 vezes maior
que a dos cassinos!
O Mercado Livre mostra por que precisamos de livre concorrência também entre estados
Sem nenhuma competição com outros governos, o setor público se ergue
ao posto do leviatã inerentemente inclinado a extrair recursos dos
contribuintes, como argumentam Brennan e Buchanan (1980).
A competição de impostos entre estados e municípios da Federação permite efeitos similares à competição internacional. A disputa em curso para sediar o centro de distribuição da multinacional argentina de comércio eletrônico Mercado Livre ilustra o tema.
Ao se materializar o risco de perder o investimento para a mais
desburocratizada Santa Catarina, o governo do Rio Grande do Sul resolveu
se movimentar para atualizar regras burocráticas arcaicas de seu ICMS (mas, mesmo assim, perdeu a batalha).
Fosse proibida uma rivalidade entre estados, o Mercado Livre seria
obrigado a se submeter às regras arbitrárias ou, alternativamente,
preterir o Brasil em favor de outro país.
A cartelização ou harmonização entre os governos beneficia os países
ricos e pune os pobres e emergentes. Uma das formas mais justas para
compensar desvantagens regionais de natureza geográfica ou histórica é
justamente permitir que as tais jurisdições possam competir oferecendo
custos e impostos menores.
As jurisdições mais ricas geralmente possuem melhor infraestrutura e
mão-de-obra mais qualificada que as pequenas. Se os estados mais pobres
do nordeste forem obrigados a ter impostos e regulações idênticos aos
estados do sudeste e do sul, perderão qualquer vantagem comparativa. E
se tiverem de implantar impostos e regulações idênticos aos da Alemanha,
por exemplo, nenhuma empresa terá qualquer interesse em se instalar por
lá.
As elites globalistas imporem esta harmonização seria tremendamente injusto.
Mas justiça não é o que elas querem.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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