Augusto Aras, chefe da Procuradoria-Geral da República (PGR), está em
guerra com a força-tarefa de Curitiba e seus desdobramentos em outras
capitais depois de tentar, por meio de sua equipe mais próxima, obter
documentos sigilosos. Diego Schelp, via Gazeta do Povo:
"Apoiar a Lava Jato é fundamental no combate à corrupção no Brasil. O
fim da impunidade é uma das frentes que estanca o problema, outra é
atacar a corrupção na sua raiz, pondo fim nas indicações políticas do
governo em troca de apoio", prometeu Jair Bolsonaro antes do primeiro
turno das eleições que o levaram ao cargo de presidente da República.
Mas eis que os fatos se encaminham para a direção oposta: o fim da Lava
Jato. Será este um dos maiores legados do governo Bolsonaro? O que os
brasileiros que ajudaram a eleger o capitão acham disso?
Vejamos quem são os atores políticos que hoje concentram sua
artilharia na Lava Jato. Augusto Aras, chefe da Procuradoria-Geral da
República (PGR), está em guerra com a força-tarefa de Curitiba e seus
desdobramentos em outras capitais depois de tentar, por meio de sua
equipe mais próxima, obter a cópia de documentos sigilosos das
investigações no Paraná, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Os
procuradores se opuseram, alegando que o acesso a tais informações devem
ser individualizados e concedidos apenas mediante autorização judicial.
Aras também vem trabalhando para desmontar a estrutura investigativa
dos times da Lava Jato.
O episódio do acesso aos dados levou ao pedido de demissão de três
procuradores da Lava Jato na PGR e a uma sequência de bate-boca público
entre integrantes da força-tarefa e a equipe de Aras.
O próprio conceito de forças-tarefas para investigar casos de
corrupção está em xeque, com a alegação de que mobilizam procuradores
demais, trabalhando em condições privilegiadas. Um dos recentes críticos
desse modelo foi o vice-procurador-geral Humberto Jacques de Medeiros,
auxiliar direto de Aras.
O plano de Aras é acabar com as forças-tarefas e centralizar as
investigações com a criação da Unac (Unidade Nacional de Combate à
Corrupção e ao Crime Organizado), vinculada diretamente a ele. O
argumento é o de que forças-tarefas como a Lava Jato desfrutam de
autonomia demais e permitem comportamentos abusivos entre os
procuradores que delas participam.
De fato, o sucesso subiu à cabeça de muitos procuradores. No entanto,
foi esse modelo que permitiu investigar, expor e punir o maior esquema
de corrupção da história do país. Nunca tantos figurões foram condenados
e presos por crimes do colarinho branco. Um órgão centralizado na PGR,
com seu histórico de engavetamento — e, atualmente, com um
procurador-geral que faz campanha por uma vaga no STF —, teria obtido
esse resultado?
Claramente, não. De resto, para os abusos dos integrantes do Ministério Público Federal existe a corregedoria da instituição.
Uma coisa é certa: as aves de rapina do dinheiro público apenas
aguardam o enfraquecimento da capacidade de investigação do MPF para
colocar novamente suas garras de fora.
Não se pode dizer que Bolsonaro não tem responsabilidade nisso. Ao
distribuir cargos a indicados do centrão, o grupo de partidos
fisiológicos do Congresso, ele aliou-se e tornou-se dependente do apoio
de parlamentares encrencados no petrolão e no mensalão. O fim da Lava
Jato é um sonho para eles.
Além disso, foi Bolsonaro quem nomeou Augusto Aras fora da lista
tríplice do MPF e vem seduzindo o procurador-geral com uma possível vaga
de ministro no Supremo Tribunal Federal. Por ora, Aras tenta encontrar
erros e por freio na força-tarefa. E, em agosto, decidirá pela
prorrogação ou pelo fim da Lava Jato em Curitiba.
Em algum momento a força-tarefa terá mesmo que se encerrar, mas que
isso seja uma decisão técnica, baseada nas perspectivas de investigação.
Não em interesses políticos, como vem sendo o caso.
Os desdobramentos da Lava Jato em outros estados indicam que ainda há
o que investigar e denunciar, como prova a recente acusação contra o
senador José Serra (PSDB-SP) por lavagem de dinheiro, pelo MPF de São
Paulo.
Os procuradores da Lava Jato em Curitiba veem na tentativa de
ingerência da PGR uma estratégia para enfraquecer o ex-juiz federal e
ex-ministro da Justiça Sergio Moro e seus planos eleitorais. O
coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, foi na mesma linha em uma
entrevista recente. Segundo essa versão, a PGR estaria fazendo o jogo
político de Bolsonaro, que considera Moro o seu judas e quer
enfraquecê-lo para não ter de enfrentá-lo nas urnas em 2022.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, entrou na briga e
disse que as reclamações de Dallagnol comprovam que a Lava Jato é um
"movimento político". Maia defendeu o direito da PGR de colher
informações sigilosas das forças-tarefas.
Entende-se: o próprio Maia foi investigado na Lava Jato e há um
inquérito contra ele dormindo nas gavetas da PGR. Em maio, o ministro do
STF Edson Fachin cobrou o procurador-geral a decidir se denuncia ou não
Maia e seu pai, César Maia, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e
falsidade ideológica eleitoral. Segundo a Polícia Federal, ambos
receberam dinheiro indevido da Odebrecht.
Nos últimos dias, revelou-se também que a PGR vem procurando provar
que os procuradores da Lava Jato omitiram, em documentos, os nomes
completos de Maia e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, para
conseguir investigar os dois, que possuem foro privilegiado,
indevidamente.
Ou seja, o fim da Lava Jato é uma daquelas causas capazes de unir
petistas, bolsonaristas, os novos aliados de Bolsonaro no centrão e
Rodrigo Maia.
A militância bolsonarista pode até, com alguma ginástica
argumentativa, eximir o presidente de culpa pelo fim da Lava Jato. Mas
dizer que ele cumpriu a promessa de campanha de apoiá-la e de cortar a
corrupção pela raiz com o fim das indicações políticas... só rindo.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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