MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Muitos caminhos, um objetivo: a prisão em segunda instância.


Independentemente do caminho escolhido, as dificuldades e as manobras para retardar a tramitação dos projetos não podem frear os esforços para que o Brasil deixe de ser um país onde as regras processuais ajudam a fazer o crime compensar. Editorial da Gazeta

No voto decisivo do julgamento sobre as prisões após condenação em segunda instância, no início de novembro, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, deixou aberta a possibilidade de o Congresso Nacional alterar a lei para que ela pudesse permitir o cumprimento da pena a partir da condenação por órgão colegiado, como os Tribunais de Justiça estaduais e os Tribunais Regionais Federais. Os parlamentares comprometidos com o combate à corrupção e à impunidade perceberam a possibilidade e, imediatamente, resgataram projetos de lei ou de emenda à Constituição já apresentados, além de levar novos projetos tanto à Câmara quanto ao Senado. Alguns deles começam a avançar, e atacam várias frentes. A estratégia é acertada, embora ainda seja cedo para saber como esse movimento terminará.
São vários os textos constitucionais e infraconstitucionais que tratam da possibilidade de prisão, da presunção de inocência e da duração do processo, a começar pelo artigo 5.º, inciso LVII, da Carta Magna: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. As primeiras tentativas de colocar na Constituição a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância miravam neste inciso, mas aqui também residem grandes dificuldades. É evidente que não se pretende abolir a presunção de inocência, nem o devido processo legal, e o início do cumprimento da pena após o julgamento por colegiado não agride nenhum desses princípios, mas alguns ministros do STF já deixaram claro que não admitirão alterações no artigo 5.º por se tratar de cláusula pétrea. É a posição, por exemplo, de Marco Aurélio Mello, embora também haja vozes discordantes, como a do próprio Toffoli.

Outros projetos de lei buscam alterar o artigo 283 do Código de Processo Penal, justamente o texto que esteve no centro das ações julgadas pelo Supremo no início do mês. Ele diz que “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”. As duas casas do Congresso têm projetos de lei para incluir neste artigo a prisão após condenação em segunda instância, e é no Senado que a ideia está mais avançada, com a possibilidade de votação tanto na Comissão de Constituição e Justiça quanto no plenário já na semana que vem.
O projeto mais adiantado, no entanto, está na Câmara, e tem sua dose de controvérsia por pretender mudar a Constituição sem tocar no artigo 5.º. É o caso da PEC 199/2019, já aprovada na CCJ da Câmara e que agora vai a comissão especial. Ela altera os artigos 102 e 105 da Carta Magna, que tratam das atribuições do STF e do STJ, respectivamente. Elas transformam os recursos das ações penais em “ações revisionais”, independentes das ações penais propriamente ditas. Estas terminariam já na segunda instância, ou seja, o trânsito em julgado ocorreria ao fim das análises dos recursos (como os embargos de declaração ou infringentes) nos TRFs e TJs. Entre os argumentos apresentados está o de que a análise da culpa – ou seja, se o réu cometeu ou não o crime de que é acusado – termina na segunda instância. Os tribunais superiores apenas verificam questões processuais: eles não podem declarar que alguém é inocente; no máximo, podem anular um julgamento em caso de irregularidade durante o processo (por exemplo, se tiver havido cerceamento de defesa). A ideia não é nova: foi proposta pela primeira vez pelo então ministro do STF Cezar Peluso, e já foi objeto de uma PEC, protocolada em 2011 e arquivada em 2018, quando já tinha sido totalmente desfigurada.
Também no Senado há tentativas de mudar a Constituição sem alterar o artigo 5.º. É o caso da PEC 5/2019, de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR); ela inclui no artigo 93 da Carta Magna, que integra o capítulo sobre o Poder Judiciário, um novo inciso, segundo o qual “a decisão condenatória proferida por órgãos colegiados deve ser executada imediatamente, independentemente do cabimento de eventuais recursos”. É um texto direto, que não altera o conceito de trânsito em julgado e também não corre o risco de ser visto como alteração de cláusula pétrea. A PEC 5/2019, no entanto, está fora de pauta após um acordo feito entre os senadores para dar prioridade à mudança no Código de Processo Penal, mas seu autor não descarta retomá-la caso as outras alternativas falhem.

Nada impede que o Congresso trabalhe em todas as frentes possíveis para garantir no Brasil aquilo que já é prática corrente em quase todo o mundo civilizado. É até importante que os parlamentares procurem soluções diversas para que não ocorram situações em que haja conflito entre textos legais. De nada adianta, por exemplo, mudar a Constituição e manter a redação atual do artigo 283 do CPP – e vice-versa. Neste sentido, e apesar das declarações de Marco Aurélio e outros ministros, o Congresso não deveria desistir de incluir no artigo 5.º da Constituição a prisão após condenação em segunda instância, pois, como afirmamos, a mudança não pretende abolir nenhuma das garantias constitucionais dos réus.
Qualquer modificação haverá de ser questionada, seja por quem, de boa fé, defende o garantismo penal, seja por aqueles que apenas desejam ver a impunidade dos ricos e poderosos, que podem levar seus processos adiante com recursos sem fim, até, quem sabe, atingir a prescrição, como já ocorreu com deputados e senadores. Daí a importância, como afirmou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de buscar uma solução que traga o máximo possível de segurança jurídica para que resista às contestações. Essa solução deverá passar pela aprovação de mais de um projeto – de preferência, a mudança no CPP combinada com uma alteração constitucional. O caminho escolhido pela Câmara ao querer mudar os artigos 102 e 105 da Constituição, embora tenha sua lógica, também tem um risco: o de ser lido como mero truque para driblar a cláusula pétrea. A mudança direta no artigo 5.º, embora a nosso ver possível, também não ocorreria de forma tranquila, pois há resistência mesmo dentro do parlamento. Neste cenário, a PEC 5/2019 pode despontar como uma possibilidade a ser levada em conta. Independentemente do caminho escolhido, as dificuldades e as manobras para retardar a tramitação dos projetos não podem frear os esforços para que o Brasil deixe de ser um país onde as regras processuais ajudam a fazer o crime compensar.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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