MEDIÇÃO DE TERRA

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segunda-feira, 1 de abril de 2019

Salário alto fora da CLT afeta arrecadação


Nos últimos anos, contribuintes com renda mais alta têm sido responsáveis por uma migração do emprego formal

Tribuna da Bahia, Salvador
01/04/2019 08:53 | Atualizado há 11 horas e 4 minutos
   
Foto: Reprodução

As mudanças nas relações de trabalho, com o aumento do número de contratados como pessoa jurídica - prática chamada de pejotização -, viraram uma ameaça ao sistema de arrecadação da Previdência e podem comprometer os benefícios futuros da reforma em curso. Nos últimos anos, contribuintes com renda mais alta têm sido responsáveis por uma migração do emprego formal, com carteira assinada, para o regime de pessoa jurídica ou autônomo, onde se reduz - ou elimina - o recolhimento ao INSS.
Entre 1996 e 2017, o número de contribuintes com renda acima de sete salários mínimos caiu 25%, segundo estudo elaborado pelos economistas José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), e Juliana Damasceno de Sousa, pesquisadora do FGV Ibre. No período, aqueles com renda mais baixa, de até sete salários, cresceram 158%.
"Esse movimento quebrou um dos princípios básicos do regime brasileiro - o do subsídio cruzado -, no qual empregadores que pagam salários maiores financiam aqueles com menores benefícios", afirmam os autores do estudo. Na prática, isso significa arrecadação menor. Entre 2014 e 2018, a arrecadação líquida (corrigida pela inflação) caiu 8,39% diante de uma população que envelhece rapidamente.
Para Afonso, a transformação estrutural no mercado de trabalho tem sido ignorada no Brasil e nem sequer começou a ser discutida "A reforma em curso é vital para colocar a economia nos trilhos, mas ela é voltada para o passado, ainda pensando num mercado no qual todas as pessoas trabalham com carteira assinada, horário fixo, no mesmo local." Isso já mudou no Brasil e vai mudar ainda mais com a nova economia compartilhada, com a automação e a digitalização, diz o economista.
No trabalho, intitulado "Previdência sem providência", os dois economistas mostram que essas transformações nas relações de trabalho são uma preocupação mundial, mas que têm se acelerado no Brasil por questões tributárias.
O País, diz Afonso, tem o custo mais alto do mundo para a contratação de assalariados, o que incentivou empregadores a contratar os mesmos trabalhadores como pessoa jurídica, dando início a chamada pejotização. "Nenhum país do mundo tem tanta firma individual quanto o Brasil. Nenhum país tem 1,2 empregado para cada proprietário de empresa."
O reflexo disso tem sido verificado na participação dos contribuintes na arrecadação total. Desde a Constituição de 1988, que criou o pacto social, a participação dos que recebem até três salários mínimos quadruplicou até 2017, de 21% para 82,1%. Já entre os que têm renda superior a 10 salários, a participação despencou de 31,5% para 2,4%.
Tributação
O professor do Departamento de Economia da PUC/RIO José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos, entende que esse é um problema para a Previdência resolver no futuro. Segundo ele, mesmo com a retomada da economia, o avanço da arrecadação será menor que no passado. "O aumento do emprego será via pessoa jurídica, que tem custo menor que o emprego com carteira assinada."
Uma saída, afirma, estará nas formas de tributação. "Hoje, da mesma forma que a cunha fiscal sobre o salário é alta, sobre o Imposto de Renda é baixa." Nesse sentido, a criação de tributos sobre dividendos do sócio de uma empresa pode ser uma boa alternativa, completa o professor da Coppead/UFRJ Carlos Heitor Campani.
Segundo ele, nos últimos anos, houve estímulo à pejotização, com uma carga tributária menor e a simplificação dos trâmites de abertura de empresas - vide o caso do micro empreendedor individual (MEI). "A minha faxineira, por exemplo, é PJ. É bom pra mim e bom para ela", afirma o professor.
De fora
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnac) Contínua, compilados por Afonso e Juliana, mais da metade dos trabalhadores brasileiros estão fora do sistema pleno de proteção social. Os empregados com carteira assinada respondem por apenas 38,9% da força ocupada e os servidores públicos, 8,5% Restam 52,6% de ocupados (sem considerar os desempregados) sem vínculo e sem proteção para o futuro.
"Se o Brasil já tem mais trabalhadores independentes do que com carteira, isto é, se os desprotegidos já superam aqueles cobertos pela previdência, o mundo do trabalho na era digital tornará ainda mais complexo repensar o padrão de financiamento e de organização da seguridade social", diz Afonso.
A opinião é compartilhada pelo economista do Insper Sergio Firpo Para ele, as mudanças no mercado de trabalho vieram para ficar. "Caberá ao governo criar regras e incentivos para trazer o trabalhador para dentro do sistema previdenciário." Firpo afirma que boa parte do movimento de pejotização tem ocorrido com profissionais com maior qualificação, que abrem mão de contribuir para o INSS para ter uma renda maior. Nesse caso, eles fazem a própria poupança - ou não.
Para Ana Amélia Camarano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), negócios crescentes, como Uber e Airbnb, são exemplo da queda do número de contribuintes. "Eles são empregados de alguém, mas não têm proteção, não têm INSS, não tem FGTS. Esse tipo de emprego modifica a forma de arrecadação da Previdência." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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