Existe uma palavra em português para aquele terrível termo anglo-saxão,
“adulting” (algo como “adultar”)? Espero que não. Do professor Frank
Furedi para a revista Oeste:
Eu estava falando em uma conferência em Nova York durante o verão de
2016 quando descobri o termo “adultar”. Tomava um drinque em um bar
quando vi um jovem na casa dos 30 usando uma camiseta que dizia “Chega
de adultar por hoje”. Na mesma semana, vi um jovem vestindo uma camiseta
que dizia “Adultar — Não quero mais fazer isso”. Depois, entrevistei
uma mulher cuja camisa transmitia uma mensagem simples: “Adultar é
cruel!”.
Caso você não esteja familiarizado com o termo, adultar é definido
como “a prática de se comportar do modo característico de um adulto
responsável, especialmente na realização de tarefas mundanas, mas
necessárias”. A palavra é usada para transmitir uma conotação negativa
em relação às responsabilidades associadas à vida adulta. E sugere que,
dada a oportunidade, qualquer mulher ou homem sensato na casa dos 30
preferiria não adultar, e evitar o papel de um adulto.
No mundo anglo-americano, a vida adulta é constantemente retratada
como desagradável, e as responsabilidades atribuídas a ela, como um
fardo impossível. Os jovens são rotineiramente alertados sobre as
dificuldades de fazer a transição para a vida adulta. Isso não acontece
mais de maneira natural. É por isso que aulas de “adultamento” foram
criadas para ensinar às pessoas as habilidades necessárias para se
tornar adultos.
Livros com títulos como Mastering Adulthood — Go Beyond Adulting to
Become an Emotional Grown-Up (“Aprenda a adultar — vá além do
adultamento e se torne uma pessoa emocionalmente madura”, em tradução
livre) têm como objetivo ensinar aos leitores as habilidades e
competências que vão ajudá-los a se tornar indivíduos maduros.
A tendência de retratar a vida adulta como uma conquista
excepcionalmente difícil que precisa ser ensinada coexiste com uma
sensação palpável de desencanto com o status de adulto. Em tudo além do
nome a vida adulta se tornou desestabilizada, a ponto de ter se tornado
alvo de escárnio e, para muitos, uma identidade indesejada. Não
surpreende que adultar seja uma atividade que muitos indivíduos
biologicamente maduros só estejam preparados para desempenhar em regime
de tempo parcial.
O corolário da idealização do adultamento em regime parcial é o
desmantelamento da autoridade adulta. O impacto corrosivo da perda da
autoridade adulta no desenvolvimento dos jovens foi uma grande
preocupação para a filósofa política Hannah Arendt. Escrevendo nos anos
1950, Arendt chamou atenção para o “colapso gradual da única forma de
autoridade” que existiu em “todas as sociedades conhecidas
historicamente: a autoridade dos pais sobre os filhos, dos professores
sobre os alunos e, em geral, dos mais velhos sobre os mais novos”.
Setenta anos depois, a desautorização da vida adulta se tornou
amplamente celebrada na cultura popular ocidental. Em vez de se
preocupar com as consequências da erosão da autoridade adulta, esse
desenvolvimento é visto como positivo por partes da mídia, que acreditam
que pessoas crescidas têm muito pouco a ensinar às crianças.
A erosão do limite entre adultos e crianças
Cientistas sociais norte-americanos inventaram o termo “vida adulta
emergente”, que supostamente dura entre os 18 e os 29 anos, para
capturar o que insistem ser uma fase pré-adulta na vida das pessoas. Os
comentários com frequência a descrevem como uma consequência inevitável
de um mundo de incertezas em rápido crescimento. No entanto, ela é mais
bem compreendida como uma consequência do desmantelamento gradual dos
limites psicológicos e morais que ajudaram a solidificar a distinção
convencional entre crianças e adultos. Em uma contribuição perspicaz
para essa discussão, o criminologista Keith Hayward argumenta que, “em
vez de algo tão significativo quanto um novo estágio na vida, o que de
fato está acontecendo é a erosão dos estágios já estabelecidos”. Para
capturar a dinâmica desse desenvolvimento, Hayward inovou o conceito de
dissolução dos estágios da vida. A manifestação mais significativa da
dissolução desses estágios é o que Hayward descreve como um processo
bidimensional de “adultificação” e “infantilização”.
Com a erosão do limite entre adultos e crianças, os adultos muitas
vezes são infantilizados; e as crianças, por sua vez, tratadas como
pequenos adultos. A principal característica cultural desse processo
bidirecional é a atribuição de equivalência moral entre crianças e
adultos, e o cultivo da imaturidade entre pessoas crescidas.
A falência do status autoritário da vida adulta é comunicada de
maneira notável por meio da narrativa cada vez mais influente que
insiste que “as gerações mais velhas são culpadas por tudo” o que deu
errado. Em vez de servirem como exemplo, os adultos costumam ser punidos
por dar mau exemplo para as crianças. O outro lado da depreciação da
vida adulta, por parte da sociedade ocidental, está na adulação da
suposta sabedoria das crianças. Tornou-se comum convidar crianças para
condenar o status moral da geração mais velha.
Organizações internacionais com frequência se escondem atrás de
crianças para promover sua ideologia. A culpabilização dos adultos e a
adulação das crianças caminham lado a lado. Tornou-se moda entre os
políticos elogiar a liderança e o discernimento das crianças. O tema da
irresponsabilidade dos adultos dominou a palestra da celebridade
infantil ecológica Greta Thunberg na Conferência das Nações Unidas sobre
Mudança Climática em dezembro de 2018. “Como nossos líderes estão se
comportando como crianças, teremos de assumir a responsabilidade que
eles deveriam ter assumido anos atrás”, disse ela. “Precisamos entender o
que a geração mais velha nos relegou. Teremos de arrumar a bagunça que
eles fizeram”. Essas declarações de superioridade moral da criança e a
condenação da vida adulta registram claramente o espírito confuso do
mundo ocidental. É por isso que aqueles que não gostam de adultar são
loucos por Greta Thunberg.
Um dos subprodutos da desautorização do adulto tem sido a perda de
clareza sobre quais valores transmitir às crianças. É comum ouvir
educadores reconhecer abertamente que, uma vez que perderam a confiança
nos valores em que foram socializados, não têm certeza de que ideais
deveriam transmitir para as crianças. A ausência de consenso sobre a
narrativa da vida adulta aumenta a dificuldade dos jovens de adotar
atitudes “maduras” em relação à vida.
Em vez de oferecer às crianças orientação moral e uma liderança
confiável, o mundo adulto coloca o fardo de encontrar respostas para os
problemas que a sociedade enfrenta nas crianças. No desespero, alguns
adultos chegam a ponto de insistir que as crianças têm as respostas. É
por isso que o chefe do Departamento de Política da Universidade de
Cambridge, na Inglaterra, conclamaria crianças de até 6 anos a votar. O
professor David Runciman lançou essa proposta com base na ideia de que
as pessoas jovens estavam “em enorme desvantagem numérica” em relação
aos idosos, e isso criava uma crise democrática que precisava ser
corrigida.
Quando crianças de 6 anos de idade recebem a responsabilidade de
determinar o futuro da sociedade por um dos principais professores da
Universidade de Cambridge, você sabe que a sociedade ocidental está em
apuros.
Frank Furedi é professor emérito de
Sociologia na Universidade de Kent, na Inglaterra. Colunista da Spiked,
é autor de livros considerados clássicos sobre temas como medo,
paranoia e guerra cultural, como How Fear Works (2018) e First World War
— Still No End in Sight (2016). Seu último livro, Why Borders Matter:
Why Humanity Must Relearn the Art of Drawing Boundaries, foi lançado em
julho pela Routledge.

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