Estudos
sobre suicídio no Brasil revelam um cenário preocupante, com um aumento
significativo das taxas entre crianças e adolescentes. E o Setembro
Amarelo é uma oportunidade para se discutir o tema e buscar soluções
para combater a tendência de crescimento, que é constante e exige uma
abordagem intersetorial, envolvendo políticas de saúde pública,
assistência social, educação, segurança e justiça.
Segundo o estudo divulgado em 2024 “Adolescência e suicídio: um problema de saúde pública”
da Fundação Oswaldo Cruz, entre 2000 e 2022, a proporção de óbitos por
suicídios no Brasil entre adolescentes (10 a 19 anos) passou de 2,73%
para 7,28%. Já entre os adultos jovens (20 a 29 anos), foi de 3,11% para
6,58%. Os pesquisadores analisaram dados de mortalidade do Sistema de
Informações sobre Mortalidade do Brasil (SIM/SUS) e basearam-se nas
projeções populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). “O suicídio é um fato social resultante de condições
de isolamento individual, coação para desempenho, cultura da violência,
assédio moral e sexual, agravadas pela pobreza e pela barreira de
acesso ao cuidado de saúde mental”, diz o relatório.
O Índice KidsRights traz
dados da Organização Mundial de Saúde e aponta que mais de 14% das
crianças e adolescentes de 10 a 19 anos em todo o mundo enfrentam
problemas de saúde mental, com uma taxa média global de suicídios de 6
por 100.000 entre adolescentes de 15 a 19 anos. O levantamento conclui
também que há subnotificação desses casos e que os números devem ser
ainda maiores. O suicídio já é, de acordo com o Índice KidsRight, a
terceira principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos. A
análise da entidade alerta para uma crise de saúde mental e/ou de
bem-estar entre as crianças que “atingiu um ponto crítico, exacerbado
pela expansão descontrolada de plataformas de mídia social que priorizam
o engajamento em detrimento da segurança infantil”, expõe.
Adultização, redes sociais e saúde mental
Para
a Dra. Vanessa Schaker, psiquiatra geral e da infância e adolescência
do Hospital São Lucas (HSL) da PUCRS, localizado em Porto Alegre (RS), a
adultização contribui diretamente para o aumento de problemas de saúde
mental, incluindo o risco de suicídio. “Quando impedimos uma criança ou
adolescente de viver sua fase e o empurramos para o universo adulto, ele
é exposto a uma sobrecarga emocional para a qual não tem preparo. Essa
pressão pode ser o gatilho para quadros de depressão, transtornos de
ansiedade e distúrbios de sono e alimentação”.
A
psiquiatra explica que o risco se intensifica com a exposição precoce
às redes sociais. Nesses ambientes, a criança e o adolescente lidam não
só com a pressão de 'serem adultos', mas também com a cobrança estética,
a sexualização do corpo, a comparação social constante e o cyberbullying.
“Um jovem, em vez de criar laços reais, está preocupado em ter o corpo
'perfeito' da internet ou em atingir um padrão de vida que não existe.
Essa busca incessante gera sentimentos de inadequação, desesperança e
uma solidão profunda. Em casos graves, essa desesperança pode levar à
ideação suicida, onde a morte parece a única forma de escapar de uma dor
que se torna insuportável”, afirma.
Opções de apoio e prevenção
Um
conjunto de estratégias para que a sociedade entenda o prejuízo da
adultização exige esforço coletivo, envolvendo família, escola,
sociedade e políticas públicas. Para Schaker o papel mais essencial é o
da família, que deve proteger as fases do crescimento, sendo a forma
mais segura de prevenção. “Isso significa garantir que as crianças
possam brincar livremente e ter interações sociais com outras crianças
da mesma idade. É crucial não sobrecarregar suas agendas com
compromissos. Os pais também têm a obrigação de cuidar da exposição dos
filhos nas redes sociais, evitando publicar conteúdos que possam
prejudicá-los ou constrangê-los no futuro”, afirma.
Schaker
completa com recomendações para a fase da adolescência, que precisam de
autonomia progressiva, mas acompanhada de suporte. “A família deve
estabelecer limites claros, conversar sobre emoções, inseguranças e
desafios da vida online, além de orientar o uso das redes sociais e
aplicativos. O diálogo aberto e sem julgamentos é uma das formas mais
eficazes de reduzir riscos, já que essa faixa etária é especialmente
vulnerável a pressões sociais e à comparação com padrões irreais”,
afirma.
“No
contexto do papel da escola, destaca-se a relevância das ações
preditivas e preventivas relacionadas ao ‘setembro amarelo’, campanha
dedicada à prevenção do suicídio e à promoção da saúde mental. Essa
abordagem vai muito além de atividades pontuais, exigindo um olhar
integral sobre as necessidades emocionais dos estudantes e a criação de
estratégias permanentes que favoreçam o bem-estar. Para isso, é
fundamental tratar de questões que envolvem a saúde mental de forma
ampla, considerando não apenas os fatores individuais, mas também as
interações que cada pessoa estabelece com seu ambiente social, cultural e
familiar. Ao implementar práticas que estimulem a escuta ativa, o
acolhimento e a construção de vínculos, a instituição fortalece sua
função protetiva e contribui para a formação de cidadãos mais
conscientes e emocionalmente saudáveis”, afirma Clemilson Graciano da
Silva, Especialista de Proteção Integral do Marista Brasil.
Silva
defende que a escola tem um papel complementar à família e que além do
aprendizado formal, deve ser um ambiente que oferece atividades lúdicas e
estimulantes, focando também na educação socioemocional. “A escola é um
espaço fundamental para estimular a interação interpessoal e a
construção de uma base social sólida”, afirma.
Estratégias
de educação digital e o desenvolvimento de ferramentas de monitoramento
e denúncia também ajudam a mitigar os riscos da crescente exposição a
conteúdo online – como cyberbullying, material violento e sites pró-suicídio. O
Centro Marista de Defesa da Infância desenvolveu uma série de materiais
educativos gratuitos com dicas de proteção no espaço virtual em
linguagem acessível para meninas e meninos entre 4 e 12 anos de idade. Os vídeos estão disponíveis para
toda sociedade. O Marista Brasil conta com uma Política de Proteção
Integral e Canais de Diálogo para garantir os direitos das crianças e
adolescentes.
Para
Silva, combater as raízes sociais do problema, é preciso integrar
políticas de saúde pública com ações nas áreas de assistência social,
educação, segurança e justiça. “Com educação, leis claras, cuidado
parental e fiscalização vamos avançando para garantir que a infância e a
adolescência sejam valorizadas e respeitadas”, finaliza.
Sobre os Maristas no Brasil
Os
Maristas no Brasil integram uma rede global presente em mais de 80
países em todos os continentes. Presentes há 128 anos no país, hoje
atuam em mais de 94 cidades, em 25 estados brasileiros e no Distrito
Federal. São 97 unidades de educação básica, 34 unidades sociais,
instituições de ensino superior: Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul - PUCRS, Pontifícia Universidade Católica do Paraná -
PUCPR e Católica de Santa Catarina, o Hospital Cajuru e Marcelino
Champagnat, no Paraná, e Hospital São Lucas, em Porto Alegre, além de
editoras, como a FTD Educação. Suas 5 frentes principais - Educação
Básica, Ensino Superior, Editoras, Saúde e Centros de Defesas - ofertam
educação de qualidade e promovem direitos humanos, engajamento solidário
e preservação do patrimônio histórico, espiritual e socioambiental
brasileiros
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