BLOG ORLANDO TAMBOSI
O historiador britânico e autor de best-sellers globais diz que políticos usam a falta de conhecimento como ferramenta de manipulação. Entrevista à revista Veja:
Como definir ignorância, que é o tema central de seu novo livro? No
sentido tradicional, significa ausência de conhecimento. Hoje, essa
definição é um pouco controversa, pois já se fala na produção de
ignorância, o que é uma contradição em termos, já que teoricamente não
se pode produzir a ausência. Eu prefiro falar em produção de confusão,
como a indústria do tabaco fez há algumas décadas.
A ignorância, se usada como ferramenta política, pode ser um risco para a democracia? Falando
de forma simples, a ignorância é um trunfo para as ditaduras e um
perigo para as democracias. Se as pessoas não estão bem informadas, elas
não são capazes de tomar boas decisões nas urnas.
Hoje
se fala em “pós-verdade” para se referir à narrativa usada por
políticos. É possível traçar paralelos com estratégias semelhantes
adotadas no passado? Jornalistas gostam de exagerar as coisas e
dizer que algo “nunca aconteceu antes na história do mundo”. Sinto
dizer, mas mentir com objetivo político é uma estratégia muito velha.
O que há de novo, então? As
tecnologias de disseminação. É preciso admitir que as fake news viajam
de forma muito mais rápida, especialmente nas redes sociais. E acredito,
embora não tenha como mensurar, que hoje há muito mais mentiras no ar
do que antes.
De que forma as redes sociais facilitam a disseminação de notícias falsas? Antigamente,
quando alguém espalhava um rumor, você sabia exatamente quem estava
falando. Hoje, as informações simplesmente aparecem, e não sabemos de
onde elas vêm. Isso criou um problema que acredito que os educadores
terão de solucionar: como ensinar as crianças, desde pequenas, a duvidar
da procedência de qualquer informação sem um emissor claro.
Há outros exemplos na história de políticos promovendo uma “caça às bruxas” contra o conhecimento, como Trump, nos EUA, e Bolsonaro, no Brasil? Evitar
que o público saiba de algo é uma tática antiga. Mas não consigo pensar
em outros líderes de Estado demonstrando publicamente sua ignorância e
manifestando desprezo pelo conhecimento.
Como explicar o paradoxo entre produção recorde de conhecimento e rejeição à ciência? Não
é algo novo, mas a situação vem ficando pior. As pessoas sofrem de
ansiedade informacional há muito tempo, e há um limite sobre quanto
podemos absorver.
Publicado em VEJA de 10 de maio de 2023, edição nº 2840
Postado há Yesterday por Orlando Tambosi
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