Fechem o país”, eles declaram, porque têm Netflix e salário garantido.
Como fica o emprego do cidadão que tem de trabalhar todo dia? Artigo de
estreia de J. R. Guzzo na nova Revista Oeste:
O mercado de eventos praticamente parou. As companhias de aviação
jamais voaram com tão poucos passageiros. Hotéis estão com apenas uma
fração dos hóspedes que tinham. Empresas de ônibus veem o número de seus
passageiros cair dia após dia. Os gênios do aconselhamento pregam a
urgência de recorrer ao “teletrabalho” – infelizmente, não ensinam como
uma faxineira, que tem de sair de casa todos os dias, ou então não vai
ganhar um tostão furado, poderá trabalhar a distância.
Três grandes montadoras anunciam o fechamento de fábricas e férias
coletivas para 50.000 empregados; muitos dos seus fornecedores devem ir
logo atrás. Indústrias começam a parar por falta de peças. O comércio,
de todos os portes, está perdendo bilhões de reais em vendas – e nenhum
centavo disso será reposto depois. Vamos ver como os grandes marechais
de campo do combate radical ao coronavírus vão arrumar, “mais tarde”, os
empregos que as pessoas estão perdendo hoje.
Mas e daí? Qual é o problema? Toda a sabedoria acumulada no Brasil
sabe perfeitamente o que é preciso fazer. Fechem todas as fronteiras,
já, diz o presidente da Câmara – como se ele tivesse a menor ideia do
que está falando. Fechem os shoppings, manda o governador de São Paulo.
Fechem todas as lojas, resolve o prefeito – todas. Tranquem as pessoas
em casa. Prendam quem recusar ordens médicas de quarentena. Não usem o
transporte público.
Não comprem, não vendam, não aluguem. Deixem de ir à feira, porque
“está assim de vírus, ó”. E por aí vamos: quanto melhor de vida o
cidadão está, mais radical é a sua receita sobre o que deve ser feito – e
mais hostil ele fica com os outros seres humanos, por medo de “pegar” o
vírus. Quanto mais “civilizado”, em suma, mais selvageria ele propõe
para combater a epidemia.
O presidente da Câmara e outras nulidades absolutas em infectologia e
qualquer aspecto da medicina defendem a repressão sanitária porque
sabem que, ao fim de cada dia, vão estar com o bucho cheio, e podem se
entreter com a Netfix. Alguém, como sempre, vai prover o seu sustento. O
problema é de quem volta para casa, todo dia, angustiado por saber não
se vai “pegar” o vírus – mas se terá o seu trabalho amanhã.
Talvez seja uma surpresa para as nossas mesas-redondas de televisão,
mas há por aí, infelizmente, umas dezenas de milhões de brasileiros
comuns que precisam trabalhar todos os dias de sua vida – ou trabalham,
ou não ganham nada, e, se não ganham nada, não comem. O Brasil do
“equilíbrio” quer que todos eles vão para o diabo que os carregue.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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