O governo federal anunciou, em 13 de agosto, o Plano Brasil Soberano,
um pacote de medidas voltado a mitigar os efeitos das sobretaxas de até
50% aplicadas pelos Estados Unidos contra produtos brasileiros. A
estratégia foi apresentada como um esforço emergencial para proteger
exportadores e preservar empregos, em meio à crise diplomática e
comercial que já ameaça setores-chave do agronegócio e da indústria de
transformação.
Na prática, o plano reúne uma combinação de crédito subsidiado, incentivos tributários, compras públicas e diplomacia comercial.
O discurso oficial fala em soberania econômica, diversificação de
mercados e defesa do setor produtivo nacional. O desafio, porém, é
transformar esse discurso em resultados concretos.
O que prevê o plano
Entre as medidas anunciadas estão:
- Crédito com taxas reduzidas via fundos garantidores (FGE, FGI e FGO), com prioridade a pequenas e médias empresas, totalizando R$ 30 bilhões.
- Expansão do Reintegra,
ampliando a devolução de créditos tributários às exportadoras, até 6%
para micro e pequenas empresas e 3,1% para médias e grandes.
- Prorrogação do drawback por mais 12 meses, aliviando importadores que utilizam insumos estrangeiros na produção voltada à exportação.
- Diferimento de tributos federais por até dois meses, dando fôlego imediato ao caixa de empresas mais impactadas.
- Compras públicas emergenciais de alimentos de produtores afetados, sem licitação, como forma de absorver excedentes.
- Reforço de seguros de crédito à exportação e maior aporte em fundos garantidores, ampliando a cobertura de riscos internacionais.
- Diplomacia ativa, com promessa de acelerar negociações comerciais com União Europeia, EFTA, Canadá, Emirados, Índia e Vietnã.
Avanços e limites
Do
ponto de vista técnico, o plano traz avanços relevantes. A ampliação do
Reintegra e o fortalecimento de garantias financeiras são medidas
capazes de dar alívio a setores exportadores em curto prazo. A
diversificação de mercados é uma agenda necessária e há muito tempo
adiada pelo Brasil.
No entanto, a execução levanta dúvidas sérias.
O anúncio de R$ 30 bilhões sem detalhamento da fonte orçamentária gera
insegurança sobre a viabilidade do pacote. Não é a primeira vez que o
governo promete cifras bilionárias sem indicar claramente de onde virão
os recursos. Isso compromete a credibilidade da política.
Outro problema é estrutural: burocracia.
Programas como Reintegra e drawback exigem alto grau de conhecimento
técnico e estrutura administrativa. Pequenas e médias empresas, que o
governo coloca no centro do discurso, são justamente as que mais
enfrentam barreiras para acessar esses mecanismos. Sem simplificação
real, a promessa de inclusão se torna retórica.
Além disso, a exigência de manutenção de empregos
como contrapartida para o crédito é socialmente defensável, mas
economicamente arriscada. Em setores que já operam com margens
comprimidas, a obrigação pode transformar o benefício em armadilha,
inviabilizando empresas em vez de salvá-las.
O peso da geopolítica
O
Brasil Soberano também deve ser analisado sob a ótica geopolítica. A
crise com os Estados Unidos expôs uma dependência histórica: grande
parte das exportações brasileiras continua direcionada ao mercado
norte-americano. O governo fala em diversificação de parceiros, mas a
experiência mostra que essa agenda raramente sai do discurso.
Negociações
comerciais são lentas, complexas e sujeitas a resistências internas e
externas. União Europeia, por exemplo, exige contrapartidas ambientais
que o Brasil ainda não conseguiu atender plenamente. Com Canadá e
Emirados Árabes, os acordos ainda estão em fase inicial. Índia e Vietnã
representam oportunidades, mas com prazos de maturação longos. No curto
prazo, a dependência dos EUA continua sendo uma realidade inescapável.
A leitura crítica
O Brasil Soberano
combina medidas emergenciais e estratégicas. Mas o risco é que acabe
ficando no meio do caminho: amplo demais para ser apenas emergencial e
limitado demais para se consolidar como estratégia de longo prazo.
Do
ponto de vista político, o governo acerta ao oferecer uma resposta
rápida a um problema que afeta diretamente setores produtivos e
empregos. Do ponto de vista econômico, porém, falta clareza sobre
execução e sobra dependência de fatores externos.
Como tributarista e professor de negócios internacionais, vejo nesse pacote um instrumento paliativo,
importante para sinalizar reação, mas insuficiente para resolver a
vulnerabilidade estrutural do Brasil. A soberania de que o país precisa
não se constrói com anúncios de bilhões, mas com competitividade, inovação e segurança jurídica.
No
fim, a pergunta que se impõe é simples: o Brasil Soberano será um
divisor de águas na política econômica brasileira ou apenas mais um
episódio da longa tradição de pacotes anunciados com estardalhaço e resultados tímidos?
Sobre o autor:
André
Charone é contador, professor universitário, Mestre em Negócios
Internacionais pela Must University (Flórida-EUA), possui MBA em Gestão
Financeira, Controladoria e Auditoria pela FGV (São Paulo – Brasil) e
certificação internacional pela Universidade de Harvard
(Massachusetts-EUA) e Disney Institute (Flórida-EUA).
É
sócio do escritório Belconta – Belém Contabilidade e do Portal Neo
Ensino, autor de livros e centenas de artigos na área contábil,
empresarial e educacional.
André
é autor do livro 'A Verdade Sobre o Dinheiro: Lições de Finanças para o
Seu Dia a Dia', um guia prático e acessível para quem deseja alcançar a
estabilidade financeira sem fórmulas mágicas ou promessas de
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Imagem André: Divulgação / Consultório da fama
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