BLOG ORLANDO TAMBOSI
Pode ser mais liberal, em economia, do que um ex-presidente de banco central de governo não populista? É essa uma das credenciais de Santi Peña. Vilma Gryzinski:
Mesmo que não queira, o presidente eleito do Paraguai, Santiago Peña,
tem uma missão não declarada: sair-se melhor do que o mar de dirigentes
de esquerda que o cercam, inclusive nos grandes vizinhos, Brasil e
Argentina.
Não
é exatamente difícil ter um desempenho menos catastrófico do que
Alberto Fernández, a triste figura em que se transformou o presidente
argentino, em visita de emergência a Brasília nessa quinta-feira, com
chapéu na mão e o habitual ar chorão. Sobre o brasileiro, a média de um
erro grave por dia ainda vai passar pelo teste da realidade.
Outros
exemplos contrastantes: o chileno Gabriel Boric, com popularidade
baixando a níveis desastrosos, e Gustavo Petro, que deu uma espécie de
golpe na Colômbia, tirando todos os integrantes centristas do governo
para tentar a fórmula esquerda pura e dura. O que poderia dar errado com
essa ideia, não é? A Venezuela está ali do lado para comprovar.
Peña,
um economista de 44 anos (e, quase inacreditavelmente, um filho de 26,
gerado ainda na adolescência), alto, moreno, olhos verdes, está à
direita de Gêngis Khan pelos padrões latino-americanos do momento.
Integrou a direção do Banco Central do Paraguai durante dez anos, na
área de pesquisa econômica. Fez pós-graduação em Columbia e trabalhou
para o FMI em Washington, prestando assessoria para países africanos.
Voltou para ser presidente do Banco Central e depois ministro da
Economia, aos 35 anos, de Horacio Cartes, o ex-presidente que tem uns
probleminhas tipo ficha suja nos Estados Unidos.
Ou
seja: sabe tudo de economia e dos problemas de países pobres,
endividados e com déficits inviáveis, da praga da corrupção que assola o
Paraguai, da maldição do narcotráfico magnificada pela ação de bandos
criminosos brasileiros, dos infelizes “chespis”, como os paraguaios
chamam os drogados.
Não
tem nenhuma desculpa para errar, mesmo que se inclua promessas
inviáveis como a criação de 500 mil empregos, vastos programas de
reabilitação dos drogados e “acelerar o processo de modernização do
governo paraguaio”.
O
Paraguai deixou de ser um entreposto de contrabando, inclusive com a
importante contribuição dos brasiguaios, que transformaram a produção
agrícola do país. Numa entrevista ao Infobae, Peña citou outros pontos
positivos: “Ao longo dos últimos anos, consolidamos um marco
macroeconômico muito estável. Isso aconteceu graças à consolidação de
grandes instituições no âmbito econômico, o Banco Central e o Ministério
da Fazenda”.
Candidato
bem sucedido que defende banco central é um fenômeno paraguaio,
amparado pelo apoio do eterno Partido Colorado (ala cartista).
Além
do liberalismo econômico, Peña preenche todos os outros quesitos de
direita, inclusive nas questões identitárias. Também acha que Venezuela e
Nicarágua devem ser reconhecidas, mas “sem deturpar a visão do Paraguai
na defesa da democracia e dos direitos humanos”. Acredita “firmemente
na nossa relação construída por princípios e valores com Taiwan” — uma
exceção tão grande numa era de hegemonia crescente da China comunista
que não parece ter muito futuro. E quer colocar mesmo em Jerusalém a
embaixada paraguaia em Israel.
Como
todos os habitantes de seu país, ele carrega a memória da Guerra do
Paraguai, “uma das mais duras da humanidade”, como disse ao Infobae.
“Fomos
à guerra contra todos nossos vizinhos, nos invadiram, tiraram 60% do
nosso território e assassinaram 90% da população masculina”.
Faltou
dizer: a guerra ocorrida há 156 anos foi fruto da loucura do caudilho
Solano López, que deveria servir de alerta eterno não só para os
paraguaios, mas para todas as vítimas em potencial do caudilhismo
latino-americano.
Um
pequeno exemplo do que fazem os líderes populistas aconteceu ontem, com
manifestações violentas acusando fraude eleitoral feitas por
partidários de Payo Cubas, o candidato que pregava a morte de
brasiguaios e ficou em terceiro lugar. Numa eleição de um só turno, Peña
teve 42,7% dos votos, uma vitória incontestável sobre Efraín Alegre
(27,5%), para quem as esquerdas latino-americanas estavam torcendo.
Um
país de povo tão gentil e com tanto potencial ainda a ser explorado
merece ser visto sem os estereótipos de praxe — e ter um governo que
melhore a vida da população, não piore. Santi Peña vai ter sua chance de
renovar o Paraguai, incentivar o seu progresso e deixá-lo melhor do que
o recebe de Marito Abdo, que é de uma ala contrária dos colorados.
E,
querendo ou não, provar que a direita latino-americana tem algo a mais a
oferecer do que a esquerda populista. Não é pouca coisa.
Postado há 3 days ago por Orlando Tambosi

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