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Além de sinalizar fraqueza, o caráter sinuoso do discurso de Lula sobre a guerra de Putin, a paz, a soberania nacional e a autodeterminação dos povos robustece as dúvidas já existentes sobre a confiabilidade de seu governo. José Augusto Guilhon Albuquerque para o Estadão:
Gostaria
de lembrar um alerta que publiquei em meu blog em maio de 2019, em
torno dos primeiros 100 dias de Jair Bolsonaro no poder. Naquele blog,
tratei dos riscos de uma política externa isolacionista. Minhas
previsões se confirmaram ao longo dos quatro anos seguintes, mostrando
que as orientações de política externa nos primeiros meses de governo
podem contaminar todo o mandato.
Quero
alertar, agora, sobre a política deliberadamente isolacionista do atual
governo, e avaliar suas consequências. O isolamento diplomático é uma
situação em que um país se encontra destituído dos recursos de poder que
poderia mobilizar, entre países amigos, para enfrentar desafios
externos. Com isso, torna-se vulnerável às ameaças oriundas do sistema
de poder que predomina na região em que esse país e seus pares vivem e
sobrevivem como nações independentes.
Um
país considerado pouco ou nada “sério”, isto é, inconfiável, fica
isolado. Acaba sendo tratado como um pária e dificilmente poderá contar
com o respeito e a boa vontade da comunidade internacional, mesmo que
possua – o que não é o nosso caso – amplos recursos econômicos e
militares. Quando se consolida essa percepção de que um país é
inconfiável, a ela se agrega uma imagem de país fraco.
E
um país fraco atrai a cobiça, a “proteção” e até intervenção de países
que queiram tirar vantagem de sua fraqueza. É essa a trajetória que o
governo lulopetista está adotando quando tenta eleger os EUA – em
substituição ao bolsonarismo – como alvo de sua inseparável polarização.
O
sucesso da polarização com os EUA dependeria do declínio americano e de
seu isolamento, que seria bem recebido pelo antiamericanismo jacente em
nossa elite. E supõe, também, a veracidade do discurso petista sobre um
conluio americano com a direita brasileira e o nosso Judiciário, com o
objetivo de condenar e prender Lula, destruir nossas maiores empresas e
impor as derrotas mal digeridas do PT em 2016 e em 2018.
Esse
discurso lulopetista mostra como uma parte da esquerda petista é
prisioneira do dilema nietzschiano da relação entre o senhor e o servo:
definir-se por oposição à malignidade dos poderosos é uma confissão de
servidão ideológica.
Não
obstante, o antiamericanismo de nossa elite não é compartilhado pelo
brasileiro mediano, seja em termos de origem social, de nível de renda
ou de nível educacional. A importância da emigração desses brasileiros
para aquele país demonstra certo compartilhamento do sonho americano.
Ora,
escolher os EUA como inimigo vital e aliar-se à China, no atual
contexto mundial de competição geopolítica, significa contrariar não
apenas os interesses americanos, mas também os da União Europeia, do
Japão e da Coreia do Sul – para dar uma ideia do que essa polarização
significa em riscos para o comércio bilateral. Sem falar da repercussão
no Vietnã, na Índia e em outros países do entorno da China, que sofrem o
insistente assédio militar chinês.
As
consequências dessa conduta presidencial não se fizeram esperar: a
reação depreciativa do governo Biden foi imediata, logo seguida de um
pito, curto e grosso, dado pelo porta-voz da União Europeia e de uma
clara ameaça do G7 de impor “custos severos” a quem ajudar a Rússia em
sua guerra contra a Ucrânia.
O
rápido recuo do presidente brasileiro é um sinal de fraqueza e, para as
potências ocidentais, uma comprovação de que falar grosso, mas também
mostrar o porrete, pode ser a maneira eficaz de lidar com o governo
brasileiro, uma vez que as tentativas de Biden, do alemão Olaf Scholz ou
do japonês Fumio Kishida de falar manso em apoio a Lula não foram
retribuídas.
Além
de sinalizar fraqueza, o caráter sinuoso do discurso de Lula sobre a
guerra de Putin, a paz, a soberania nacional e a autodeterminação dos
povos robustece as dúvidas já existentes sobre a confiabilidade de seu
governo.
A
aprovação, em 18 de abril, no Parlamento Europeu – por ampla maioria de
552 a favor, 44 contra e 43 abstenções – de uma legislação que impõe
severas restrições à importação de produtos que possam direta ou
indiretamente causar desmatamento é um alerta. A lista vai do gado ao
papel impresso, aos direitos humanos em geral e aos direitos dos povos
autóctones como critérios suplementares. Itens como borracha, papel
impresso e derivados de azeite de dendê foram incluídos de última hora. E
mais: países e partes de países sofrerão uma avaliação de risco que
poderá agravar ou amenizar as restrições.
Assim,
o resultado dessa votação, a natureza e o conteúdo da lista e,
sobretudo, as inserções de última hora trazem a marca de Made in Brazil e
da responsabilidade de Lula por ignorar as consequências de seus atos.
Nossa
sabedoria popular nos ensina a não cutucar a onça com vara curta.
Infelizmente, as mais recentes incursões presidenciais no domínio da
diplomacia sugerem que o que sobrou da sua sabedoria política o está
levando a procurar, obstinadamente, aonde quer que vá, uma onça para
caçar de mãos vazias.
Postado há 4 days ago por Orlando Tambosi
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