Os
brasileiros passam 9h13 por dia online. O número coloca o país como o
segundo do mundo em que as pessoas ficam mais tempo conectadas à
internet, atrás apenas da África do Sul (9h24). E quando o assunto é o
uso de redes sociais, o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking, com os
usuários conectados em seus perfis cerca de 3h37 todos os dias. Os
dados são do Relatório Digital 2024billion:
5 social media users, feito pela We Are Social e Meltwater, e destacam
uma rotina hiperconectada que especialistas recomendam cuidado para
evitar a dependência das redes sociais.
O ano de 2024 viu o termo "brain rot"
ser eleito a palavra do ano pelo Dicionário Oxford. O termo, definido
como a deterioração do estado mental ou intelectual de uma pessoa,
especialmente como resultado do consumo excessivo de material online
banal, ganhou destaque nas discussões sobre o impacto do conteúdo de
baixa qualidade, principalmente nas redes sociais. O aumento de 230% no
uso da expressão entre 2023 e 2024 reflete a crescente preocupação com
os efeitos negativos da superexposição digital.
Segundo
Vagner Vinicius de Araújo, psicólogo da rede de clínicas AmorSaúde, a
dependência das redes sociais é uma condição complexa que pode
prejudicar a saúde mental de diversas maneiras. Essa dependência é
caracterizada por sinais como preocupação excessiva com as redes, uso
compulsivo, negligência de atividades importantes, mudanças de humor,
problemas de sono, diminuição da autoestima e sintomas físicos.
"A
busca incessante por validação online, a comparação constante com
outros usuários e a falta de reconhecimento podem gerar sentimentos de
inadequação e ansiedade, fatores que, inclusive, estão associados à
depressão", explica o psicólogo. Segundo Araújo, a dependência das redes
também ativa o sistema de dopamina no cérebro, reforçando
comportamentos compulsivos e criando um ciclo viciante. “O imediatismo,
característico das redes sociais, sobrecarrega o cérebro com estímulos
constantes e superficiais, dificultando a concentração e a reflexão
profunda”, afirma o profissional.
O
relatório “Panorama da Saúde Mental”, do Instituto Cactus e da
AtlasIntel, indicou que 36,9% dos brasileiros que passaram 3 horas ou
mais por dia nas redes sociais, 43,5% são diagnosticados com ansiedade. O
psicólogo destaca que, a longo prazo, “não controlar o uso das redes
sociais pode resultar em ansiedade, depressão, baixa autoestima,
distúrbios do sono, isolamento social, dificuldades de concentração,
problemas de relacionamento e até efeitos físicos como doenças
cardíacas, obesidade e problemas de visão”.
Senso de imediatismo estimulado pelas redes sociais pode atrapalhar as relações interpessoais
O
imediatismo, impulsionado pela necessidade de respostas rápidas e
gratificação instantânea, pode causar sobrecarga cognitiva e prejudicar a
atenção, pois altera padrões de comportamento e foco. “Cada curtida,
comentário ou mensagem libera dopamina, criando um ciclo de busca
constante por recompensas rápidas. Essa dinâmica também reduz a
capacidade de adiar a gratificação e planejar a longo prazo”, explica
Araújo.
● Superficialidade nas Interações
A
gratificação imediata nas redes sociais favorece a superficialidade nas
relações interpessoais. Segundo o psicólogo, “as interações rápidas e
curtas, como curtidas e comentários breves, substituem conversas mais
profundas e significativas, essenciais para a construção de vínculos
genuínos. Essa superficialidade pode enfraquecer os laços sociais e
afetivos”.
● Expectativas irreais e comparação social
A
comparação constante com outras pessoas nas redes sociais pode gerar
insatisfação e prejudicar a autoestima. “Nas redes sociais, as pessoas
frequentemente compartilham os melhores momentos de suas vidas, o que
pode gerar expectativas irreais sobre o que constitui uma “vida
perfeita”, diz Araújo.
● Dificuldades na construção de confiança e intimidade
As
interações superficiais dificultam a construção de relações profundas.
“Relações interpessoais saudáveis e duradouras exigem tempo e dedicação,
algo que é desafiado pela cultura do imediatismo nas redes sociais,
onde as respostas rápidas e as conversas fragmentadas predominam”,
destaca o profissional.
● Dificuldades para enfrentar conflitos
O
psicólogo alerta que nas relações interpessoais o imediatismo também
pode se manifestar em uma impaciência para lidar com conflitos ou
discussões. “Ao invés de buscar uma resolução cuidadosa e ponderada,
muitos indivíduos preferem soluções rápidas ou evitam confrontar
questões importantes, o que pode enfraquecer a qualidade das relações ao
longo do tempo”.
Como mudar esse cenário na prática?
Para
reduzir a dependência das redes sociais e minimizar os efeitos do
imediatismo, Araújo reforça que ações no dia a dia, simples de colocar
em prática, podem gerar impactos positivos significativos:
1. Estabelecer limites de tempo
Defina
um tempo específico para o uso das redes sociais e utilize aplicativos
de monitoramento para bloquear o acesso após atingir esse limite.
2. Desativar notificações
Reduza a tentação de acessar as plataformas constantemente desativando notificações não essenciais.
3. Criar zonas sem tecnologia
Estabeleça horários ou locais livres de tecnologia, como durante as refeições ou ao se deitar.
4. Substituir o tempo nas redes por atividades offline
Encontre atividades alternativas que proporcionem prazer, como hobbies, leitura ou exercícios.
5. Usar redes sociais de forma consciente
Planeje o tempo nas redes com objetivos específicos para evitar o uso impulsivo.
6. Fazer detox digital regular
Faça pausas intencionais do uso de redes sociais para reavaliar seu relacionamento com a tecnologia.
7. Ajustar o feed de conteúdo
Siga perfis que agreguem valor e bloqueie ou silencie contas que induzam ao desperdício do seu tempo.
8. Buscar apoio de amigos e família
Compartilhe desafios e metas com amigos ou familiares para fortalecer o apoio mútuo.
9. Refletir sobre o impacto nas emoções
Mantenha um diário de como se sente após usar as redes para identificar padrões e motivar a redução do uso.
10. Buscar terapia ou apoio profissional
Considere apoio psicológico em casos mais graves para desenvolver estratégias personalizadas.
O
psicólogo explica que a diferença entre o uso saudável e a dependência
das redes sociais está na forma como o indivíduo se engaja nas
plataformas. “O uso saudável é caracterizado por controle, consciência e
objetivos claros, enquanto a dependência se manifesta pela perda de
controle, compulsão e impactos negativos no bem-estar”, afirma Araújo. O
profissional endossa que para criar limites sem culpa ou ansiedade, é
importante enquadrar os limites de forma positiva, substituir o uso das
redes por atividades gratificantes, estabelecer limites realistas e
flexíveis e praticar o desapego consciente.
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