Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais de quarta-feira:
Bolsonaro erguer uma caixinha de hidroxicloroquina com os braços
estendidos acima da cabeça, como Bellini, que celebrizou o gesto ao
festejar nossa primeira Copa do Mundo, é ridículo. Insistir em louvar a
hidroxicloroquina para as emas é ainda mais ridículo. Devolver ao
Governo Federal a hidroxicloroquina que receberam de presente, como
fizeram alguns Estados, é tão ridículo quanto. E nocivo: a
hidroxicloroquina é remédio padrão para malária, para lúpus, usada
nestes casos há mais de 70 anos. Deixar os pacientes à míngua, ou
pagando o triplo, é inaceitável, além de ridículo. Pode-se ir mais
longe: se o médico prescreve hidroxicloroquina e o paciente concorda,
por que impedi-los de combater a Covid de seu jeito?
Há uma explicação lógica para a devolução da hidroxicloroquina à
União. Os três milhões de doses que o Brasil ganhou de Trump e da
Novartis vieram em cartelas de cem comprimidos, que deveriam ser
fracionadas em cartelas de menos de cinco comprimidos. É tarefa para um
exército de farmacêuticos, e cara. Como não havia verba para o
fracionamento, devolveu-se o remédio.
É uma explicação simples, lógica e imbecil. Se o remédio veio de
graça, que se enviem as cartelas às farmácias populares para
distribuição gratuita. E sejam entregues aos médicos que as solicitarem.
O que não se admite é deixar sem remédio que dele necessita – para
malária, lúpus ou coronavírus.
Chega de política partidária em Saúde. Deixem o médico trabalhar.
Risco visível
Esta coluna não discute Direito. Nem teria sentido: alguém que não
sabe nem o endereço das faculdades não vai debater com mestres
pós-graduados no Exterior, para os quais até a toga tem de vir embebida
do saber de alfaiates vizinhos a escolas internacionais. Mas creio que
está sendo violado um dos artigos basilares da Constituição americana, a
Primeira Emenda, que inspirou todas as constituições democráticas: a
proibição da censura.
Opinião sem censura
Cada pessoa é livre para dizer o que pensa, mas pode ser processada
por quem se sentir atingido. Entendo a posição do Supremo, achincalhado
por ministros na presença silente de Bolsonaro, ameaçado de fechamento
por um dos filhos do presidente, com fundamentalistas chamando um
ministro para a briga, perturbando a paz de seus vizinhos e ameaçando
persegui-lo onde quer que esteja.
Mas, se entender é fácil, justificar não é possível: que houve
manifestações mal-educadas, grosseiras, injuriosas, isso houve, mas que
os responsáveis sejam processados na forma da lei e não proibidos de
falar.
Rolha nos outros
Calar Twitter, Facebook e outras redes é censura prévia, sim. Até
mais, porque se censura a pessoa, e não o que ela iria dizer, se
pudesse. Não diga que no caso a censura prévia é aceitável. Censura
nunca é aceitável. Já fui proibido, no tempo da ditadura, de escrever o
nome “Leonardo”. Era o nome do censor e ele temia ser ironizado sem
perceber. Por isso, o grande artista era apenas “Da Vinci”.
E não pense que os atingidos até que merecem. Pois censura começa com os outros, sempre. E a rolha termina em todos nós.
Bom exemplo
Donald Trump Jr., filho mais velho do ídolo de Bolsonaro, foi punido
pelo Twitter com doze horas de bloqueio. O zero à esquerda de Trump
pegou suspensão por ter defendido a hidroxicloroquina numa série de
tuítes em que atacou adversários democratas e o Dr. Anthony Fauci, aliás
assessor do pai, por rejeitarem o remédio. Incrível: pela Constituição,
o Congresso não pode criar restrições à liberdade de expressão. Mas o
Twitter pode?
Como nos ensinou aquele ministro, se abrir uma brecha, por ela passa toda a boiada.
Nasce torto...
Esta coluna tem ótimas fontes na Bahia. Mas nem tinham de ser tão
boas. Por mais escandalosa que seja a gastança, lá também estão
providenciando. Agora é uma licitação do Tribunal de Justiça baiano, a
quase R$ 1 milhão por mês, para contratar serviço de 116 motoristas para
desembargadores, servidores e serviços gerais. São 61 motoristas para
61 desembargadores. Há mais 43 para coordenação de transportes, três
para Varas da Criança e Juventude, dois para o Fórum, dois para o Fórum
da Família, cinco para o Almoxarifado. Dizem que com isso se reduz o
custo do transporte.
...morre torto
Este colunista tem outra sugestão para reduzir o custo do transporte.
Só ficariam um ou dois carros na reserva, os demais seriam vendidos. Um
app atenderia a Suas Excelências com carros de luxo e motoristas
apreciados pela clientela, a preços normais. Como de hábito, manutenção e
combustível ficariam a cargo do aplicativo. Quem quisesse um carro
melhorzinho, sempre com o mesmo motorista, poderia comprar, com seu
próprio dinheiro, talvez um Bentley (andei uma vez, gostei muito) e
contratar, de seu bolso, aquele motorista em quem confia. Sabe que
funciona? Nos Estados Unidos é assim.
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