Deu em O Globo
As duas primeiras prévias do Partido Republicano — nos estados de Iowa e New Hampshire — confirmaram o favoritismo de Donald Trump. Descartados efeitos de eventos imprevisíveis, como condenações judiciais nos processos em que é réu, o mais provável é que seu nome esteja nas cédulas em novembro.
Pelas pesquisas, ele hoje derrotaria o presidente Joe Biden, virtual candidato democrata, na maioria dos estados necessários para vencer a eleição. É verdade que tudo pode acontecer até lá, mas o risco de uma eventual vitória de Trump precisa ser levado a sério desde já.
MUITA PREOCUPAÇÃO – Líderes políticos e empresariais de todo o mundo começam a traçar cenários sobre sua volta à Casa Branca. Não causa surpresa que as conclusões sejam preocupantes. As avaliações, afinal, não são feitas com base em suposições.
Nos quatro anos em que ocupou a Presidência, entre 2017 e 2020, Trump criou um clima de caos e incerteza em torno de sua personalidade errática e mercurial. Desagradou mais a aliados que a inimigos históricos dos Estados Unidos. Foi explícito ao pôr em questão a Otan, aliança militar com os europeus. Aproximou-se de Vladimir Putin, Kim Jong-un e outros autocratas. Num eventual segundo mandato, a única certeza é a incerteza.
Mesmo assim, algumas de suas inclinações sugerem os rumos prováveis. É o caso da retirada de apoio à Ucrânia e da reaproximação da Rússia de Putin. Ou do recrudescimento do protecionismo. Um dos planos expostos na pré-campanha é impor uma tarifa de importação de 10% a todos os países, com consequências negativas nos planos interno e externo. O risco é uma nova guerra comercial de dimensão global.
AGENDA AMBIENTAL – Para o planeta, o perigo mais insidioso seria o recuo na agenda ambiental. Em 2017, Trump anunciou a retirada dos Estados Unidos do Acordo de Paris, reação da humanidade contra as mudanças climáticas. Segundo Trump, o acordo é injusto com trabalhadores e empresas americanas.
“Fui eleito para representar os cidadãos de Pittsburgh, não de Paris”, disse na época. Ao assumir, Biden restaurou a adesão dos Estados Unidos, segundo maior emissor de gases de efeito estufa. Uma nova ruptura sob Trump ameaçaria as metas e poria em xeque o futuro do planeta.
Há, por fim, o risco que Trump representa à própria democracia americana, demonstrado pela invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021.
INTERESSES PESSOAIS – Na campanha, ele deu a entender que pretende enviar tropas a cidades governadas por democratas, invocando uma lei que amplia os poderes do Executivo. Só não fez isso no primeiro mandato porque foi convencido do contrário por militares e assessores. Tentaria de novo?
De acordo com dois ex-secretários do governo Trump — Bill Barr, de Justiça, e Mark Esper, de Defesa —, ele sempre põe seus interesses à frente do nacional. Sobre o 6 de Janeiro, o ex-vice Mike Pence declarou ter sido instado a escolher entre Trump e a Constituição. Para John Kelly, seu ex-chefe de gabinete, Trump “é a pessoa mais imperfeita que conheci”. Quem acompanha a equipe atual de Trump não vê gente com estatura moral para frear seus impulsos.
Muitas promessas de campanha de 2016 não viraram realidade por falta de experiência e organização. Um novo governo Trump promete ser mais eficaz. Seria desejável que a sociedade americana aproveitasse o tempo que resta até novembro para oferecer alternativas melhores ao eleitor. Do contrário, o risco para o mundo será imenso.
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