BLOG ORLANDO TAMBOSI
O construtor Rodolfo Hernández, a grande surpresa do primeiro turno, tem 47% das projeções para o segundo; o senador Petro, 50%. Vilma Gryzinski:
Os
colombianos querem mudanças e colocaram no segundo turno da eleição
presidencial, em menos de três semanas, dois candidatos diferentes.
Mas
nenhum pode ser mais original do que Rodolfo Hernández, milionário
empreiteiro que criou do nada uma sigla chamada, muito diretamente, de
Partido da Liga de Governantes Anticorrupção.
Hernández,
de 77 anos, autodenominado o velhinho do TikTok, atropelou o candidato
da direita tradicional e levou surpreendentes 28% dos votos. Para o
segundo turno, segundo uma pesquisa do último sábado, estava com 47,4%
das preferências, contra 50% para Gustavo Petro, ex-militante do M-19,
grupo de guerrilha que aderiu à política convencional.
“Engenheiro
melhor do que guerrilheiro”, disse um ex-ministro da Fazenda, Juan
Carlos Echeverry, resumindo o espírito dominante no espectro que vai do
centro à direita, onde reina o medo do que seria um governo Petro.
Não
é um medo injustificado: o senador e ex-prefeito de Bogotá promete
reatar relações com a Venezuela assim que tomar posse, acredita que o
aumento de impostos é o caminho para a justiça social, prega acabar com o
“proibicionismo” no combate às drogas (todo mundo sabe o que isso
significa), pretende mexer no sistema misto de aposentadoria e quer
fazer uma reforma agrária.
Também
propõe passar de “uma economia extrativista para uma produtiva” – é um
enigma imaginar como faria isso, com dirigismo e outras propostas
surradas da esquerda não revolucionária, louca por uma intervenção
estatal em todas as esferas, o caminho seguro para não melhorar nada.
“Enquanto
os políticos continuarem roubando, para que reforma tributária?”,
argumenta Hernández, com a franqueza que uma fortuna de mais de cem
milhões de dólares permite.
O
milionário, que já deu uma entrevista à CNN em espanhol usando um
brilhante pijama – “Estava no terceiro sono. Vou dormir às sete da
noite” -, focou toda a sua campanha na educação. Como filho de uma
família de agricultores pobres que subiu na vida por méritos próprios,
ele promete reforma no sistema de ingresso nas universidades e alívio
progressivo nos empréstimos para os estudantes que tenham melhores
notas.
Como
candidata a vice, escolheu, quando ninguém dava muita bola para sua
candidatura, a professora universitária e pesquisadora Marelen Castillo.
A química, bióloga e engenheira industrial se sai bem mesmo quando
comparada com a vice politicamente correta de Petro, Francia Márquez,
que é negra.
Hernández
entrou tardiamente na política – é claro que isso evoca infinitas
comparações com Donald Trump – como prefeito de Bucaramanga, onde
protagonizou um vídeo viral em que enfrenta o vereador Jhon Lopez, que o
acusava de corrupção. Depois de chamá-lo de mentiroso, sem vergonha e
filho da ****, acertou-lhe um tabefe na orelha.
A
“originalidade”, como diz, do candidato gerou outros momentos virais,
como quando perguntou o que era Vichada, um dos departamentos –
equivalentes aos estados brasileiros – colombianos. A um repórter que
quis saber se gostava de futebol feminino, respondeu: “Vejo pouco isso”.
Por
causa da virada que o levou ao segundo turno, numa prova que eleições
não são decididas antes da interação dos eleitores com as urnas, Rodolfo
Hernández é o candidato que mais chama atenção e pode desfrutar do
efeito ascensional.
O
comportamento folclórico que o ajudou no primeiro turno potencialmente
pode prejudicá-lo no segundo. Uma coisa é ter um candidato “contra tudo e
contra todos”; outra, escolhê-lo presidente.
As
duas candidaturas simbolizam, em vários sentidos, a história recente
de violência da Colômbia. Gustavo Preto foi preso duas vezes e torturado
quando militava na guerrilha. Rodolfo Hernández teve a única filha, do
total de quatro, sequestrada em 2004 e assassinada pelo Exército de
Libertação Nacional, um dos vários grupos guerrilheiros do país – uma
das versões mais aceitas. O construtor procurou durante anos descobrir o
que havia acontecido com a filha, carregando “a maior dor de todos”.
Logo
depois do primeiro turno, um juiz espanhol acatou uma denúncia contra
Gustavo Petro por ter integrado o grupo armado “narcoparamilitar M-19”
responsável pelo sequestro, em 1981, do jornalista Fernando González
Pacheco, que tinha nacionalidade espanhola. Entre os anos setenta e
oitenta, o grupo praticou “de maneira sistemática e indiscriminada o
sequestro de pessoas, bem como a tortura e o assassinato”.
É uma ficha e tanto.
O
Pacto Histórico, a frente de esquerda de Petro, propôs alianças com
Hernández no início da campanha e o senador reconheceu que o empresário
estava dominando a narrativa anti-sistema. “Estamos deixando que uma
equipe de comunicação mais eficaz que a nossa tire nossas bandeiras”,
reclamou, referindo-se ao discurso contra a corrupção do adversário que
enfrentará em 13 de junho, empurrando, tipicamente, a culpa para os
estrategistas de campanha.
A
de Petro é dirigida por dois argentinos e pelo brasileiro-equatoriano
Amauri Chamorro, que dava como certo que seu candidato levaria a eleição
no primeiro turno com 50% dos votos.
Os
colombianos decidiram nas urnas que haverá segundo turno e a vitória de
Gustavo Petro, no momento, não parece tão absolutamente garantida. O
velhinho do TikTok está disposto a brigar.
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