O que o manifesto faz, e não sem destemor, é apontar o assédio a que nosso sistema de votação vem sendo submetido, bem como o clamor crescente pela quartelada. Guilherme Macalossi para a Gazeta do Povo:
Já passou de um milhão o número de pessoas que subscreveram a “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito”.
Há gente de esquerda ali? Sim. E, provavelmente, aos montes. Mas também
há, igualmente aos montes, aqueles que têm visão de mundo
diametralmente oposta. Reduzir tudo a uma “micareta petista”, como fez
Jair Bolsonaro, em sua reação ao ato de leitura do documento, é apenas
desonestidade intelectual de quem pretende se vender como vítima de uma
grande conspiração política que vai do TSE ao MST, passando até pelos
banqueiros insatisfeitos com o PIX. É risível.
Que
se faça a análise sintática, gramatical e etimológica de cada frase, de
cada expressão, de cada palavra ali contida. Não há nada que remeta a
algo contra ou a favor de candidaturas ou partidos políticos, tampouco
de espectros ideológicos e correntes de pensamento. Só a defesa
intransigente de um valor que deveria ser comum a todos: o da
democracia.
O
que o manifesto faz, e não sem destemor, é apontar o assédio a que
nosso sistema de votação vem sendo submetido, bem como o clamor
crescente pela quartelada: “Ataques infundados e desacompanhados de
provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático
de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São
intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e
a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional”.
Sob
a justificativa de “mais transparência”, o que temos é uma ardilosa
estratégia de descredibilização do sistema de votação e, com ele, o
enfraquecimento da democracia em si. Afinal, se o meio pela qual ela é
exercida é fraudulento, se suas instituições não são confiáveis, então
ela mesmo é falsa. E se é falsa, então está a serviço de interesses que
não o da população.
Na
narrativa picareta em curso, o objetivo de um incontável número de
pessoas e instituições públicas e privadas seria a volta de Lula ao
poder.
Nunca
antes uma ode à democracia gerou tanta controvérsia, tanto ruído, tanto
alvoroço e tanta contrariedade entre sedizentes democratas. Se são,
qual o incômodo? Têm medo do que, afinal? A carapuça parece pesar. Não
por acaso, os indignados com o teor da carta são exatamente os mesmos
que vocalizam o negacionismo eleitoral e os argumentos falaciosos que
ela corretamente denunciou. Se sentem agredidos porque foram expostos em
praça pública. Ou, mais precisamente, expostos nas arcadas do prédio da
Faculdade de Direito da USP.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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