Coluna de Carlos Brickmann, a ser publicada na quarta-feira, 31 de agosto:
Perguntem
a qualquer dos participantes do debate quem foi o vencedor. Cada um
garantirá, com firmeza, que foi ele. Ninguém admitirá que não foi tão
bem assim, ninguém fará autocrítica. E não adianta pesquisar: sempre a
pesquisa indicará que o eleitor de cada candidato o considera vitorioso.
Mas,
se não há maneira objetiva de indicar quem ganhou, há indícios mais que
suficientes para saber quem perdeu. A reação das equipes de campanha é
imediata e as providências são tomadas com a urgência possível. Vejamos,
por exemplo, a reação das equipes de Lula e Bolsonaro. Ambas resolveram
restringir ao máximo a participação nos próximos debates. Lula pretende
ir somente a mais um, o da Rede Globo.
Dizem
que o tema da corrupção será levantado em todos eles e o pessoal da
campanha prefere que o candidato aborde o assunto só em redes sociais e
entrevistas – menos audiência, menos repercussão. Não é bem assim: Lula,
num dia ruim, estava longe de sua fama de debatedor. A equipe de
Bolsonaro se preocupa com seus arroubos, Ele usa o tempo de que dispõe
para atacar “a mídia” e repórteres como Vera Magalhães - ótima
jornalista, mas que não provoca emoções no eleitor que o levem a
preferir o presidente. O fato é que Bolsonaro parecia irritado quando o
confrontavam, mexia-se sem parar, envolveu-se na política interna de
outros países – outro tema que não emociona muita gente.
Bolsonaro só irá ao debate da Globo por medo do significado da cadeira vazia.
A grande evidência
E
há ainda um indício fatal de que a candidatura de Bolsonaro está longe
do sucesso: o marqueteiro da campanha, Duda Lima, próximo ao presidente
do partido de Bolsonaro, Valdemar Costa Neto, não foi ao debate.
Apareceu outro, ligado à ala ideológica do bolsonarismo, que abomina o
Centrão, mas não pode fazer nada porque sem o Centrão o governo não
anda: é Sérgio Lima. Não se discute aqui a qualidade do trabalho de
ambos, mas o fato de o Centrão não ter enviado seu homem de marketing
para o debate indica o suficiente: Bolsonaro e o Centrão estão
afastados, ou se afastando. Como o Centrão não larga o poder, talvez
esteja trocando o poder atual pelo próximo.
Os favoritos
Em
resumo, os dois favoritos foram mal. Quem apareceu bem foram Ciro,
Simone e Soraya. Ciro fala bem, é experiente em debates, não foi
surpresa: onde ele costuma dizer coisas difíceis de explicar é em
entrevistas. Soraya mostrou ousadia e coragem e disse a Bolsonaro aquilo
que Lula não disse. E Simone, que já vinha aparecendo bem, confirmou
sua boa imagem, batendo em Bolsonaro e dizendo que não tem medo de suas
ameaças.
As
duas, Soraya e Simone, tiveram ainda a chance extra (que aproveitaram)
de defender as mulheres, citando os inúmeros casos em que Bolsonaro
atacou repórteres por serem mulheres e defendeu teses como as de que
mulheres devem mesmo ganhar menos quando desempenham o mesmo cargo que
colegas homens.
Juca já previa...
Num
bom artigo, o colunista Juca Kfouri disse, no UOL, que Lula perdeu a
chance de ouro de atacar Bolsonaro por corrupção. Quando Bolsonaro, na
primeira pergunta a Lula, perguntou sobre casos de corrupção, Lula deu
uma resposta burocrática – o que é imperdoável, já que até as
garrafinhas de água mineral do estúdio já sabiam que esse tema seria
abordado.
Juca
escreveu que Lula deveria ter respondido algo como “Bolsonaro, e você
vem falar nisso? Você com as rachadinhas, as rachadinhas dos filhos, o
Queiroz, todos os casos da vacina?” – e daí por diante. Pois o Juca
escreveu num dia; e no dia seguinte estourou o caso da compra de imóveis
pela família Bolsonaro. De 1990 até hoje, como comprova reportagem no
UOL de Thiago Herdy e Juliana dal Piva, jornalistas muito bons, foram
comprados 107 imóveis. Sim, 107 imóveis em 32 anos. Ou R$ 19,5 milhões
em valor histórico. Corrigidos pelo IPCA, R$ 25,6 milhões. Os salários
no Legislativo devem ser ótimos!
...mas havia mais!
Desses
107, houve 51 com pagamento em dinheiro vivo. Isso não é ilegal:
dinheiro vivo é moeda de curso corrente no país e de uso forçado. Mas é
estranho. Uma comparação: digamos que alguém ande na rua com um facão
nas mãos. Não, não é ilegal. Digamos que o facão esteja pingando sangue.
Não, não é ilegal: o portador do facão pode ter ido matar alguns
frangos para ajudar no churrasco do vizinho. Digamos que a tal pessoa
tenha uma tatuagem no braço com uma caveira e dois ossos cruzados. Não,
não é ilegal. Tatuagem, seja do que for, está dentro da lei.
Mas o caro leitor preferiria ou não atravessar a rua e ficar longe do facão?
Que maldade!
Bolsonaro
não quis falar sobre o tema imobiliário aos repórteres Thiago Herdy e
Juliana dal Piva. O colunista Chico Alves, também do UOL, estranha essa
posição do presidente da República, justo ele, que sempre citou o
versículo bíblico “conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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