A popularidade de López Obrador continua acima dos 60% e ele já começa a conduzir a sucessora que irá substituí-lo. Vilma Gryzinski:
Inveja.
Qualquer governante latino-americano, à direita, à esquerda ou no
conforto dos regimes ditatoriais, só pode ter esse sentimento em relação
a Andrés Manuel López Obrador.
O
presidente mexicano não diminuiu a criminalidade – unanimemente
considerada o maior problema do país -, não turbinou a economia, não
teve uma pandemia razoável e, muito menos, promoveu a Quarta
Transformação, a designação grandiloquente para o regime de mudanças que
prometeu a partir de sua chegada ao poder, em 2018.
Uma
demonstração do seu prestígio popular foi dada com uma pesquisa
divulgada ontem: qualquer nome escolhido pelo partido do presidente, o
Movimento Regeneração Nacional, ou Morena, vai ganhar a eleição
presidencial de 2024 (não existe reeleição no México).
A
mais cotada é a prefeita da Cidade do México, Claudia Sheinbaum. Ela
defende “a continuidade e todo nosso apoio ao presidente da República”.
Claudia estudou física e engenharia, seguindo a tradição da família de
judeus procedentes da Europa dedicados à ciência.
López
Obrador fala manso e tem uma personalidade afável, ao contrário do
modelo tradicional do populista de esquerda latino-americano. Mas também
compra briga: chamou de “racista e classista” uma atriz que criticou a
miríade de benefícios sociais para os menos favorecidos – por motivos
óbvios, a coluna mestra da popularidade de AMLO, como é chamado.
O
México tem um PIB menor do que o do Brasil – na faixa de 1 trilhão de
dólares -, mas uma renda per capita maior, de 9,4 mil dólares, quase
dois mil a mais do que nós. Um vizinho rico e poderoso como os Estados
Unidos, com quem tem o NAFTA, ajuda a puxar o país para cima, ao
contrário da visão deturpada da esquerda sobre o assunto.
Até
o consumo de drogas no território americano ajuda a irrigar a economia
do vizinho, embora sustente um sistema bárbaro em que narcotraficantes
guerreiam entre si, com uma brutalidade sem paralelos, e espalhe o poder
corruptor sobre as estruturas do estado das imensas quantidades de
dinheiro que o tráfico mobiliza.
Mais
de 35% dos mexicanos apontam como o maior problema do país reduzir a
insegurança. Melhorar a economia fica em segundo lugar, com 28%.
Curiosamente, 51% dos mexicanos acham que AMLO não está se saindo bem no
quesito segurança. Ao mesmo tempo, 63% aprovam seu governo. A melhor
avaliação do presidente, com 69% de aprovação está relacionada ao
programa de vacinação contra a Covid.
López
Obrador resistiu bastante a medidas como a paralisação das atividades
não essenciais e o uso de máscara. Mesmo quando implantadas, não foram
acompanhadas de medidas coercitivas. O país teve 330 mil mortes por
Covid para uma população de 126 milhões de habitantes.
O
presidente mexicano basicamente não mexeu em nada na economia, o que
pode ser visto como uma vantagem: populistas de esquerda quando entram
no campo da reforma econômica geralmente produzem desastres.
Achou
conveniente somar seu nome aos dos colegas da Bolívia e da Colômbia
para declarar “nosso mais absoluto repúdio à injustificável perseguição
judicial” contra Cristina Kirchner.
Poucos
casos de corrupção são tão completamente fechados como o que agora pede
12 anos de prisão para a vice-presidente argentina.
A
popularidade de Cristina, embora limitada às fileiras do peronismo,
também é um fenômeno: 41% dos eleitores da sua frente votariam nela para
ser candidata a presidente no ano que vem. O desastrado Alberto
Fernández tem 10,53% das preferências.
O
exercício do poder obviamente desgasta, em especial um político poste
como Fernández. Mas, no Chile, Gabriel Boric aparece já com o filme
queimado com menos de seis meses de presidência. Se a nova constituição
chilena não for aprovada, vai sobrar desprestígio para o jovem
presidente. Incidentes como o do fim de semana, quando um grupo de
travestis fez uma “performance”, num comício pela aprovação, em que a
bandeira chilena foi, por assim dizer, tirada das nádegas expostas de
uma das dançarinas não ajudam em nada.
No
Peru, Pedro Castillo não faz praticamente nada como presidente. Sua
aprovação está em 20%. No vizinho Equador, o presidente, Guillermo
Lasso, é de direita, mas a situação é praticamente igual à do professor
primário peruano.
O
uruguaio Luis Lacalle Pou, da direita civilizadíssima, ainda não entrou
no vermelho, mas caiu do ápice de 66% para 50% de aprovação.
López
Obrador já afirmou no México quando era um eterno candidato, que a
gasolina custaria 10 pesos (“Custa mais de 22 pesos o litro”, criticou o
político direitista Ricardo Anaya), que “para o bem de todos, os pobres
primeiros” (a situação de pobreza aumentou para mais quatro milhões de
pessoas), a economia encolheu e a dívida pública aumentou. Quinze
jornalistas já foram assassinados no país este ano.
O
presidente mandou pessoalmente o Exército soltar Ovídio Guzmán, filho
do notório El Chapo, porque seus comparsas estavam tocando o terror na
cidade de Culiacán.
“Se
não suspendêssemos a operação, mais de 200 pessoas perderiam a vida”,
alegou. Capangas de Guzmán estavam cercando casas de militares e
ameaçando tocar fogo.
Pode
um presidente mandar soltar um criminoso? Muitos mexicanos acham que
sim – ou talvez seu presidente tenha uma margem de tolerância fora do
padrão, o que definitivamente deixa muita gente com uma inveja danada.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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