BLOG ORLANDO TAMBOSI
Não
acreditem no que está escrito a seguir, embora entremeado de fatos
verdadeiros. As eleições de meio de mandato presidencial nos Estados
Unidos não foram tão ruins como previsto para o Partido Democrata, a
economia está melhorando, Donald Trump está refluindo e Joe Biden, com
80 anos e sinais de deterioração mental, perdeu a utilidade principal. O
povo quer renovação e “eles”, também chamados de estado profundo, o
mecanismo que controla as alavancas do poder, deixaram vazar os
documentos sigilosos guardados por Biden da época em que era
vice-presidente. Uma desculpa perfeita para que ele desista de anunciar a
candidatura à reeleição que estava prestes a lançar. Assim, um
candidato mais jovem será ungido como sucessor.
Parece
incrível, mas essa teoria circula entre americanos de tendência
conspiracionista, o que é um bocado de gente. Todos invocam a forma
enviesada como os documentos foram achados — advogados de Biden estavam
sem fazer nada e foram checar a instituição onde o presidente criou um
centro de estudos com seu nome, na Universidade da Pensilvânia.
“Badabing, badabum”, diria Tony Soprano. Documentos que deveriam ter
sido entregues às devidas autoridades começaram a brotar até na garagem
da casa onde o presidente guarda sua Corvette de colecionador. O caso
pode parecer banal, mas cresceu porque os democratas precisam pelo menos
fingir que seguem o mesmo e rigorosíssimo padrão aplicado quando Trump
foi pego em situação similar. Alguns deles chegaram a dizer que o odiado
ex-presidente estava vendendo segredos nucleares e deveria ser preso e
executado por traição.
Acreditar
que Biden está sendo rifado pelo estado profundo atende a requisitos
básicos das teorias conspiratórias. A ideia de que o presidente esgotou
sua utilidade para o “sistema” confere a seus defensores benefícios
emocionais. Aumenta o senso de pertencimento ao grupo que compartilha o
mesmo sentimento e fornece a poderosa conclusão cognitiva, o fecho
final, a explicação para um conjunto de acontecimentos que nossos
cérebros foram programados para tentar decifrar, como mecanismo de
sobrevivência. Somos, resumidamente, viciados em respostas e o mundo
fica mais caótico ainda na ausência de explicações conclusivas.
Como
aceitar que uma única bala provocou sete dos oito ferimentos sofridos
por John Kennedy e pelo governador John Connally e apareceu numa maca do
hospital onde foram atendidos no fatídico 22 de novembro de 1963? Que o
Fiat Uno responsável por um raspão no carro onde estava Diana nunca foi
encontrado depois da tragédia? Ou que um recepcionista registrou por
engano o ingresso de Adélio Bispo de Oliveira na Câmara dos Deputados no
6 de setembro de 2018 em que ele desfechava a facada?
“Todo
mundo adora uma conspiração”, disse Dan Brown, que ficou rico criando
fatos absurdos, mas irresistíveis, em O Código Da Vinci, antes da era
das redes sociais. A chave única, a explicação que abrange tudo, grassa,
em maiúsculas, em todas as gamas do espectro político: maçons,
rosa-cruzes, jesuítas, Sábios do Sião, Rockefellers, Rothschilds,
neomarxistas, neoliberais, CIA, Illuminati, Davos. Eles. É chegar,
servir-se e não ter mais o trabalho de enfrentar perguntas sem respostas
fáceis.
Publicado em VEJA de 25 de janeiro de 2023, edição nº 2825
Postado há 59 minutes ago por Orlando Tambosi
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